Opinião

Costices e costaclismos

Costices e costaclismos

Rui Rocha

Deputado e membro da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal

Tão importante como conhecer os conceitos de costice e de costaclismo é dominar a dinâmica que, também inapelavelmente, se estabelece entre ambos. Uma acumulação de costices desemboca, invariavelmente, num costaclismo. Da mesma maneira, a um costaclismo seguir-se-á uma nova fase de costices

A compreensão da governação de António Costa pode fazer-se recorrendo a dois conceitos fundamentais: a costice e o costaclismo. A costice é o modo de funcionamento do Governo em velocidade de cruzeiro. São costices, por exemplo, a promessa, o truque, a habilidadezinha, o ato de empurrar com a barriga, as comissões e task forces e a propaganda. O costaclismo é, por seu lado, o desenlace inelutável de uma sucessão de costices, traduzindo-se num desastre mais ou menos grave, incerto no que diz respeito ao momento exato em que irá acontecer, sendo, todavia, absolutamente certo que irá ocorrer.

Entretanto, tão importante como conhecer os conceitos de costice e de costaclismo é dominar a dinâmica que, também inapelavelmente, se estabelece entre ambos. Uma acumulação de costices desemboca, invariavelmente, num costaclismo. Da mesma maneira, a um costaclismo seguir-se-á uma nova fase de costices, que visam alijar responsabilidades e desviar as atenções do costaclismo recentemente ocorrido. Mais tarde ou mais cedo, estas novas costices darão origem a mais um costaclismo.

A coisa percebe-se melhor com alguns exemplos. Veja-se o caso da Educação. Uma acumulação de costices dá origem ao costaclismo da falta de professores. Naturalmente, aplicando o modelo descrito, segue-se mais um conjunto de costices. É o caso da intenção já declarada de retirar momentos de avaliação formal do sistema ou do plano de recuperação de aprendizagens oportunamente anunciado, mas concretizado apenas numa ínfima parte. Esta e outras costices levarão a um novo costaclismo que se tornará evidente quando forem conhecidos os resultados de provas internacionais, como o PISA, que aferem a proficiência em área fundamentais de conhecimento.

Da mesma maneira, um conjunto de várias costices na área da Saúde conduziu ao costaclismo do caos nas urgências. É, pois, no contexto desse costaclismo que devem ser entendidas as várias costices entretanto lançadas, não surpreendendo que um destes dias possa ser apresentada a maior reforma do SNS desde D. Dinis.

Por falar em D. Dinis, outro exemplo muito interessante é o dos incêndios. Depois do ano trágico de 2017, anunciou-se uma extraordinária “reforma da floresta”. Era, obviamente, uma costice. A conjugação da propaganda, da incompetência e da preguiça resultou num brutal atraso do processo de cadastração então prometido, na existência de uma entidade de capitais públicos chamada Florestgal que, dizia-se, ia mudar radicalmente a gestão da floresta e que, três anos depois, interveio apenas nuns miseráveis 70 hectares de terreno ou na evidência de que o Pinhal de Leiria está ao abandono depois de ter sido devastado pelas chamas.

O modelo é sempre o mesmo: Costices até ao ano trágico de 2017; costaclismo; mais costices para deviar as atenções e dar ideia de que se está a fazer alguma coisa; costaclismo em 2022 na Serra da Estrela. E, naturalmente, ao desastre na Serra da Estrela, seguem-se mais costices como o “algoritmo”, a criação de uma “Comissão das Lições Aprendidas” ou a promessa de que o Parque Natural vai ficar ainda melhor depois de ter sido destruído em boa parte pelos incêndios.

Não pretendo abusar da paciência dos leitores com mais evidências práticas de que este é o paradigma invariavelmente utilizado na governação de António Costa. Atrevo-me, contudo, a sugerir que apliquem o modelo das costices e dos costaclismos, por exemplo, à questão da Segurança Social. Tenho a certeza de que vão chegar a conclusões interessantes

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas