Costa e Montenegro reuniram-se em cimeira PS/PSD para decidir da localização do futuro aeroporto de Lisboa, talvez para assinalar o cinquentenário do início de tão profundo debate. A conclusão da cimeira é que vão ser feitos mais estudos. Entretanto, a Portela está como está, o aeroporto que está feito em Beja não é usado como podia e devia, a solução do Campo de Tiro de Alcochete que já podia e devia estar adiantada fica em pousio, e a VINCI que é a dona disto tudo desde que o Governo PSD/CDS lhe atribuiu a concessão dos principais aeroportos nacionais soma e segue.
Quando há algumas semanas aqui comentei a desautorização de António Costa a Pedro Nuno Santos a propósito do anúncio da localização do futuro aeroporto, com a justificação de que tal decisão não poderia prescindir da opinião do PSD, aventei duas hipóteses de raciocínio que eram basicamente as seguintes:
Se o PSD se escusasse a tomar posição dizendo que é ao Governo que compete tomar decisões, e ficasse à espera de uma decisão do Governo, fosse ela qual fosse, para a poder criticar mesmo que concordasse com ela, António Costa diria que o PSD não tem autoridade política para criticar qualquer decisão porque se recusou a assumir a sua. Se o PSD assumisse publicamente uma posição coincidente com os interesses da francesa VINCI, o Governo aceitá-la-ia em nome do consenso nacional.
O que a cimeira do aeroporto entre o PS e o PSD parece revelar é que a primeira hipótese não parece confirmar-se, ou seja, o PSD, até ver, aceita o papel de codecisor que António Costa lhe quis atribuir. Assim sendo, a segunda hipótese permanece inteiramente válida. O PSD passa a ter um direito de veto implícito, prestimosamente oferecido por António Costa, quanto à futura localização do aeroporto de Lisboa.
Dizer que são necessários mais estudos quando a questão já é estudada há mais de cinquenta anos começa a ser do domínio do anedotário. Já todos sabemos que há estudos para todos os gostos e que isso não vai mudar. Cada novo estudo vai contrariar os anteriores e vai ser contrariado pelos posteriores. O que saiu da cimeira PS/PSD foi um novo adiamento de uma decisão cuja urgência é de interesse nacional, mas que se vê enredada num lamentável processo de negociação interpartidária entre o PS e o PSD.
A folha de serviços do PSD em matéria de aeroportos não é abonatória da defesa do interesse nacional. Quando chegou ao Governo em 2011 abandonou a perspetiva da construção de um aeroporto internacional e em 2013 entregou os aeroportos nacionais à VINCI por cinquenta anos com consequências nefastas aos mais diversos níveis. Não só lesa financeiramente o Estado Português como tem vindo a prejudicar gravemente os utilizadores, os trabalhadores, a operacionalidade e a própria segurança dos aeroportos.
Todos sabemos que a solução desejada pela VINCI é a manutenção da Portela com um complemento no Montijo e a inviabilização de uma solução de futuro como seria a construção faseada de um novo aeroporto internacional nos terrenos do campo de tiro de Alcochete que permitisse o encerramento definitivo da Portela. Enquanto essa decisão não é tomada, perde o país e vai ganhando a VINCI.
Fazer depender uma decisão como a da construção do futuro aeroporto de Lisboa de uma negociação bipartidária não é metodologia que se apresente. Não sabemos como vai acabar o simulacro de negociação entre o PS e o PSD. Pode até acabar em desavenças e acusações mútuas e em mais uns anos perdidos sem qualquer conclusão sobre a localização do aeroporto. Mas conhecendo a folha de serviços do PSD, o que pode resultar da decisão do Governo PS de não decidir sem o PSD, é que a decisão seja da VINCI, sempre em nome do consenso nacional, pois em que outro nome poderia ser?
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