Opinião

A inevitável descida do IRC

Compreendo as soluções apontadas, por algumas pessoas respeitáveis e muito relevantes para a atividade económica, e que vão no sentido de uma diferenciação dos apoios do Estado - e não numa descida do IRC transversal. Tudo poderia ser assim se as empresas não estivessem já derreadas, se ainda tivessem alguma capacidade para reagir. Mas não têm

Os empresários portugueses estão exaustos. E medidas iguais às que foram aprovadas na última década, e por três governos, perante a atual crise inflacionista que vivemos, o impacto da guerra e as transições climática e digital, não resolverão essa exaustão. É preciso ir mesmo ao que sempre foi a reivindicação das suas associações e baixar, de forma assinalável, o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.

De 2016 a 2020 fui ouvindo que o problema dos empresários, na perspetiva do investimento, não estava na carga fiscal. Sempre me pareceu uma justificação que não agregava à realidade e sempre olhei uma qualquer desconsideração dessa carga fiscal, por parte de algum investimento estrangeiro, pelo facto desse investimento já vir garantido por isenções tributárias e outros benefícios que são habituais.

O meu regresso à atividade privada confirmou isso mesmo. Os empresários, as empresas, fizeram frente à intervenção da Troika tentando garantir as suas encomendas e manter os postos de trabalho. Em muitos setores, como as obras públicas e construção, tal não foi possível, mas em muitas áreas foi mantida a capacidade de fogo que se veio a confirmar entre 2016 e 2020.

A pandemia implicou, de novo, nas dinâmicas, nas estratégias na capacidade financeira das empresas. O Estado contemplou soluções para os trabalhadores e linhas de crédito para as empresas, mas as cadeias de valor foram profundamente afetadas e o regresso à normalidade não se verificou até hoje.

A inflação era, já nos finais de 2021, uma luz encarnada que se aproximava a grande velocidade, muitos dos universos, como o automóvel, estavam a ser fortemente implicados pelos cortes de fornecimento de componentes.

Compreendo as soluções apontadas por algumas pessoas respeitáveis e muito relevantes para a atividade económica e que vão no sentido de uma diferenciação dos apoios do Estado e não numa descida do IRC transversal. Tudo poderia ser assim se as empresas não estivessem já derreadas, se ainda tivessem alguma capacidade para reagir. Mas não têm.

As empresas portuguesas, e muito do investimento estrangeiro que não é canalizado pela agência estatal, olham para economia portuguesa e identificam as suas fragilidades. São cinco as que me têm indicado.

A primeira é a ausência de competitividade fiscal com Espanha. No país vizinho há uma menor presença dos impostos nacionais e há, ainda, bonificações regionais. E neste terreiro atlântico, como segundo elemento, a ausência de regiões administrativas com poder de decisão política é um grave problema. Constata-se, por exemplo, na Região Centro, que a definição das plantas de hidrogénio não têm responsável, que os investimentos em indústria de ponta agregados à formação profissional de nível superior não tem qualquer interlocutor.

Em terceiro campo, é sempre indicada o longo e custoso trilho para o licenciamento. Em mais de metade dos países europeus, o licenciamento é centralizado e as autorizações são pré-concedidas a investimento superior a cinco milhões de euros. Em Portugal…

Nos quatro e quinto pontos, neste avaliar das fragilidades, estão a fraca capacidade de resposta por parte da Justiça para os processos de insolvência, para as contendas regulatórias e para a gestão conflitual, e os atrasos significativos do pagamento dos fornecimentos, por parte do Estado, que implicam determinantemente na atividade privada e que assumem um custo significativo nas tesourarias.

Se neste momento interessa confirmar a descida transversal do IRC como forma de mudar o chip e não assentarmos só as políticas e os discursos nos salários e nas pensões, importa que, a prazo, o Ministério da Economia encontre respostas para os cinco pontos que se elencaram e que há muitos anos se confirmam em todos os estudos.

Este governo de maioria absoluta tem um Primeiro Ministro que sabe que já passamos o tempo da Geringonça e que o desenvolvimento só se pode fazer com mais empresas e mais empregos qualificados. Que o Governo se aplique neste novo tempo, que o PS regresse ao espaço moderado que é o seu.

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