A semana europeia ficou marcada pelo #SOTEU, o famoso discurso sobre o Estado da União Europeia que foi proferido pela Presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, em Estrasburgo. Ao contrário do que tem sido a regra dos últimos anos, Bruxelas tem vindo a aprofundar o seu espírito político e a escutar cada vez mais rapidamente as aspirações ou o sentimento generalizado da população. Ou seja, nota-se que a Europa está mais ágil e que cada vez mais vai ao encontro da opinião pública europeia, o que nem sempre quer dizer que se tomam ou anunciam as medidas mais acertadas.
Se por um lado isso parece menos responsável, por outro significa que a UE, e em particular a sua líder política, têm consciência de que para garantir a sobrevivência do próprio projeto europeu este tem de ter a capacidade de se aproximar cada vez mais das Pessoas e do “sentimento europeu”.
Se por vezes, quando a Comissão se torna demasiada política e flexível acaba por criar algumas injustiças entre cumpridores e não cumpridores, ao prejudicar as regras que foram definidas cria alguma injustiça entre os Estados Membros de acordo com o período em que foram visados por essas regras.
O poder de decisão do Presidente da Comissão é limitado, tanto pelos pares como pelas decisões soberanas do Conselho e do Parlamento Europeu. Mais do que responsabilidade da Presidente Leyen, nota-se que as três instituições, e neste caso o Conselho, estão mais politizadas ou são mais “políticas”.
Tantas vezes ouvi dizer que ao projeto europeu lhe faltava “sentimento” ou alma e que era uma mera soma de vontades ou então um “big stick” que nos guiava segundo a vontade franco-alemã. Não deixa de ser curioso, ou talvez surpreendente que seja sob a batuta de uma presidente alemã, ex-braço direito de Merkel que a Europa assiste a esta brutal flexibilidade e a um reforçado sentimento europeu. Se a crise provocada pela Covid obrigou a agir rápido, a invasão da Ucrânia uniu, sem exceção, os europeus e os seus líderes.
A verdade é que nas últimas décadas a União Europeia reformou-se e adotou um conjunto de medidas, criou novos mecanismos e flexibilizou o seu processo de decisão de forma a estar menos dependente de bloqueios ou vetos nacionais ou nacionalistas. A Europa beneficia hoje da aprendizagem feita com as dificuldades que enfrentou. A este propósito não posso deixar de recordar que alguns anos antes da crise financeira o então Presidente Barroso apresentou uma reforma dos mecanismos financeiros que os Estados-Membros rejeitaram.
Dois ou três anos depois, já crise financeira mundial, a União teve mesmo de fazer essas reformas em plena crise. Como Durão Barroso referiu, e por força desse adiamento, a “UE viu-se obrigada a construir o seu salva-vidas em pleno naufrágio” e assim nasceram muitos dos mecanismos financeiros que hoje asseguram a estabilidade da economia europeia, do euro e dos próprios Estados-Membros.
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