Contava-me há dias um amigo que um reformado da TAP lhe tinha dito que os velhos hangares do aeroporto de Lisboa foram comprados com uma opção, condição ou característica, que obrigava que pudessem ser desmontados e reposicionados no futuro aeroporto que se previa para breve. Ora estes hangares já datam dos anos 70 ou mais. A gargalhada é imediata, mas não tem graça nenhuma.
Confesso que não sei se foi o “centralismo” de Lisboa e das suas forças vivas, se foi a incompetência de diversos governos, o corporativismo de certos interesses ou na verdade todos estes em conjunto, a realidade é que o adiamento da construção de uma alternativa ao aeroporto da Portela é provavelmente o maior “inconseguimento” da história democrática.
Primeiro foi a guerra sobre a localização do novo aeroporto que iria substituir a Portela, OTA vs Rio Frio que deu até azo a uma indemnização decidida pelo Governo de então aos municípios limítrofes, por “frustração de expectativas”. Depois seguiu-se a discussão sobre a localização de um aeroporto complementar à Portela, que deveria ser uma opção entre Sintra, Alverca ou Montijo (recorrendo sempre a estruturas militares). Três Governos de duas cores políticas diferentes (PS e PSD+CDS) decidiram pelo Montijo e entregaram essa decisão / missão à ANA (Vinci), que tem por contrato a obrigação de construir esse aeroporto complementar. Entretanto passaram-se sete anos desde essa decisão de Passos Coelho e Sérgio Monteiro e nem um metro de terra foi movimentado desde então, pelas razões que já todos conhecemos.
Pelo caminho fez-se, inaugurou-se e fechou-se um aeroporto em Beja.
Finalmente já com Pedro Nuno Santos a substituir o mal sucedido Pedro Marques, o Governo de António Costa retoma o dossier e esbarra na oposição dos autarcas do PCP na região. Apesar da disponibilidade do PSD para ajudar a contornar o problema, o Governo não conseguiu avançar. Se a pandemia aliviou a pressão sobre o esgotamento do aeroporto de Lisboa, e podia ter criado o espaço temporal para proceder a remodelações na Portela ou a adiantar a construção do novo aeroporto do Montijo, a verdade é que nada se fez e, com o regresso do turismo, o caos regressou também.
A questão que hoje se coloca é se ainda vale a pena construir o Montijo para aliviar a Portela, algo que é mais rápido de realizar do que um aeroporto de grandes dimensões, ou se avança já para o aeroporto definitivo de grandes dimensões que era consensual dever ser em Alcochete e que permitiria “encerrar” e desmantelar o aeroporto da Portela como sempre foi consensual: tirar os aviões do centro da cidade.
Entre avanços e recuos, hesitações e incompetência, e mesmo sendo Portugal um dos países mais atrativos do mundo em matéria de turismo, tendo uma das economias cujo produto mais depende do turismo, mesmo assim não conseguimos decidir ou fazer em tempo a principal infraestrutura de suporte ao apoio do turismo. É ridículo.
Entretanto pelo caminho tivemos um rol de líderes regionais e autarcas a defender, como lhes compete, a construção do aeroporto o mais perto possível das suas regiões. Se a localização em Monte Real é uma aspiração com décadas, e a localização de um aeroporto na região centro é uma inevitabilidade face à forte atração turística de polos como Fátima, Coimbra ou Batalha e Tomar, o auge destes disparates foi ter o anterior autarca de Coimbra a defender em campanha eleitoral um aeroporto internacional em Coimbra perante a incredulidade de todos os seus pares que durante anos fizeram lobby por Monte Real. Depois surgiu a oportunidade de Tancos, que merecia ser estudada, nem que fosse como complemento da Portela e alternativa ao Montijo, que em boa hora o PSD de Santarém defendeu. Mas chegamos aqui e nada.
Alguém costumava dizer que pior do que uma má decisão é uma indecisão e eu tenho a certeza que este é claramente o exemplo deste novo aeroporto.
Entretanto surgiu mais uma alternativa promovida por um grupo, aparentemente secreto, de investidores privados a querer localizar esse aeroporto entre Santarém e Torres Novas. A este propósito não podia deixar de dizer que num momento de grande tensão política sobre o novo aeroporto e de um certo cansaço popular acerca desta nossa incapacidade de resolver a questão do aeroporto, não é de grande bom senso a forma como este novo projeto veio a público, por mais razoável que seja a proposta: através de duas notícias muito pouco transparentes do Expresso, sem mencionar fontes nem investidores o que levou a grandes especulações. Se a proposta existe deve ser pública o quanto antes e as suas potencialidades estudadas em par com outras. Mas se servir apenas para valorizar terrenos e para promoção pessoal e política de alguns então mais vale não nos fazerem perder tempo.
Não sou especialista nem em infraestruturas e muito menos em aeronáutica, mas tenho a certeza que o melhor para o país é que comecem a construção do novo aeroporto o quanto antes possível. Faça-se o novo aeroporto, porra.
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