26 agosto 2022 0:03
A covid fez esquecer como se fala de banalidades sem stressar
26 agosto 2022 0:03
O truque — ensinaram-me há algum tempo — é não deixar cair a bola no chão. A bola tem de saltitar por todos. Simples. Para mim não era. Nunca foi. Não é. O desporto aqui descrito existe há dezenas de milhares de anos e chama-se “conversa de chacha”, aquela converseta que se tem com estranhos, semidesconhecidos ou pessoas pelas quais não temos grande interesse ou a quem nada nos ocorre perguntar mas com quem, por algum motivo, nos vemos a conviver numa determinada situação durante um curto período. Ora, o silêncio seria insuportável e bizarro. Ainda mais se estivermos a falar de uma festa, pelo que se desenvolveu essa técnica de “conversa de chacha”, que é a capacidade de vários seres humanos fingirem interesse no que os outros dizem e assim se irem questionando sobre um ramalhete de assuntos inofensivos (nem finanças, nem sexo, nem política, nem morte...), fazendo com que o tempo passe e ao longe pareça que estão a ter um convívio salutar e bem-disposto. Pode até não ser o caso. Seja como for, a “bola não pode cair”. Ou o grupinho cala-se — há uma sensação de “certo... pois...” — e, possivelmente, dispersa. Pois bem, isto que aqui foi descrito parece não ser nada de mais. Já os ingleses estão a levar muito a sério a possibilidade de a covid e os confinamentos terem ferido de morte a small talk, essa “cola da vivência em sociedade”. Para eles, isso é inconcebível, pois temem que tudo fique resumido ao silêncio ou “à ratoeira da meteorologia”, ao “e este tempo, hein?” — o grau zero da converseta. É uma questão civilizacional. Mas a coisa já vinha de antes das pandemias.
Este é um artigo do semanário Expresso. Clique AQUI para continuar a ler.