Longevidade

Longevidade: conselhos para o novo ministro da Saúde, a pensar nos mais velhos

O debate foi moderado pelo diretor-adjunto do Expresso, David Dinis
O debate foi moderado pelo diretor-adjunto do Expresso, David Dinis
NUNO FOX

Manuel Pizarro foi nomeado titular de uma das pastas mais importantes do Governo. Esta terça-feira o conselho consultivo do projeto Longevidade reuniu para abordar os desafios do envelhecimento no atual contexto de crise

A guerra na Ucrânia, a crise energética e a subida galopante da inflação estão a afetar profundamente a vida dos portugueses. Para enfrentar a perda de poder de compra, o Governo apresentou um pacote de medidas extraordinárias, destinadas a reforçar os rendimentos da população: trabalhadores, crianças, jovens e pensionistas são a prioridade deste novo regime de apoios, intitulado “Famílias Primeiro”.

Numa época em que Portugal enfrenta também um enorme desafio demográfico – somos o quarto país mais envelhecido do mundo -, o conselho consultivo do projeto Longevidade esteve reunido na manhã desta terça-feira, para discutir como os mais velhos estão a viver o presente momento.

Estas foram as principais conclusões do debate:

Desigualdades Luís Jerónimo não tem dúvidas: o apoio às pessoas mais vulneráveis é um problema de fundo. Num país marcado por grandes desigualdades – no rendimento, no acesso à saúde e ao trabalho, na habitação – os mais velhos são a população mais afetada. “[O atual momento] terá forte impacto nos mais velhos. E isto está relacionado com os recursos limitados desta faixa etária, mais fragilizada, sem capacidade para enfrentar a crise”, disse o Diretor do Programa Desenvolvimento Sustentável, da Fundação Calouste Gulbenkian, acrescentando à atual crise a “revolução demográfica, digital e climática”. “Podemos analisar os fatores separadamente, mas o impacto nos seniores será generalizado”, pelo que os apoios à terceira idade são prementes.

Sistema de Saúde Portugal é um dos países da Europa onde os últimos anos são vividos com maior carga de doença. “É preciso mudar a forma como são seguidas as pessoas com doenças crónicas”, disse Nuno Marques. “Temos um grande foco nos problemas agudos, visível nas urgências, mas as pessoas só se deslocam porque não são seguidas devidamente”, disse o presidente do Observatório Nacional do Envelhecimento. Ou seja, o modelo hospitalar português está desajustado da realidade, vocacionado para a doença aguda quando uma parte considerável da população sofre de doença crónica. “Se os idosos tiverem uma consulta numa semana, na seguinte já não vão às urgências. E isto explica a razão para termos um terço a mais de idas à urgência.”

Prevenção Para a diretora da Escola Nacional de Saúde Pública, Sónia Dias, existe efetivamente um problema de integração dos cuidados de saúde primários nos cuidados hospitalares. Mas há outros problemas que carecem de solução: como vamos conseguir tratar das políticas de saúde a nível de prevenção e promoção? “É indiscutível que o facto de sermos mais velhos nos trará mais carga de doença, mas isto não é uma fatalidade, nem todos vamos ter doenças crónicas. Há uma série de causas de problemas de saúde que podem ser prevenidas.” Uma opinião partilhada por Simon Gineste, diretor-geral da Novartis Portugal: “As doenças cardiovasculares representam 10% da despesa em saúde, mas a grande maioria destas causas são evitáveis. Estamos a fazer prevenção?”

O presidente do Observatório Nacional do Envelhecimento, Nuno Marques
NUNO FOX

Recursos humanos Os últimos meses foram atribulados no SNS: a sobrecarga das urgências levantou um problema de má articulação entre hospitais e Cuidados de Saúde Primários (CSP). “Temos um bom rácio de médicos por habitante, mas existe um problema de distribuição dos recursos humanos. A capacidade do SNS será suficiente se conseguirmos distribuir bem os nossos clínicos”, disse Manuel Caldas de Almeida, vice-presidente do secretariado nacional da União das Misericórdias. Nuno Marques, presidente do Observatório Nacional do Envelhecimento, acrescentou a necessidade de investir em melhores CSP e numa maior capacidade de reposta hospitalar. “Assim, quando um doente tem uma descompensação, não precisa de ir às urgências.”

Pensões Se nada mudar na demografia e economia portuguesa, estima-se que daqui a 40 anos as taxas de substituição (diferença entre o último salário e a primeira pensão) rondem os 50%. Significa uma perda de metade dos rendimentos, com impacto em praticamente todas as áreas. “Temos reformados que têm pela frente tanto tempo de reforma como de vida ativa”, disse Edmundo Martinho. Um fator que coloca pressão na população ativa, numa lógica de compromisso geracional, e levanta um problema de sustentabilidade da Segurança Social. O setor privado terá o seu papel: hoje, um terço da população portuguesa tem seguro de saúde privado. “Se não conseguirmos articular todos os stakeholders o sistema vai colapsar”, disse Maria João Luís, presidente executiva da Multicare Seguros de Saúde.

Literacia e tecnologia Num tempo de desmaterialização da economia, digitalização e o recurso generalizado à tecnologia, a literacia assume um papel fundamental na gestão das pensões de reforma, rendimentos e poupanças. “As pessoas vivem com reformas curtas e não sabem geri-las. Precisam de conhecimento, de serem capacitadas para saber resolver problemas do dia a dia, de aprender a lidar o orçamento e que tenham conhecimento sobre seguros”, disse Maria Amélia de Cupertino Miranda. Ana Sepúlveda, da Associação Age Friendly Portugal e que tem contactado diferentes países com políticas ativas de longevidade, lembra a necessidade de haver maior informação, mas destaca também a capacidade de Portugal aderir à inovação. “Queremos exportar mais soluções”, afirmou.

Maria Amélia Cupertino de Miranda alertou para a necessidade de promover a literacia financeira dos mais idosos
NUNO FOX

Moderado pelo diretor-adjunto do Expresso, David Dinis, o debate contou com a presença de Luís Jerónimo, diretor do programa Desenvolvimento Sustentável da Fundação Calouste Gulbenkian, Edmundo Martinho, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Ana Sepúlveda, da Associação Age Friendly Portugal, Simon Gineste, diretor-geral da Novartis Portugal, Maria Amélia de Cupertino de Miranda, presidente da Fundação António Cupertino de Miranda, Sónia Dias, diretora da Escola Nacional de Saúde Pública, Nuno Marques, presidente do Observatório Nacional do Envelhecimento, Manuel Caldas de Almeida, vice-presidente do secretariado nacional da União das Misericórdias, e Maria João Luís, CEO da Multicare Seguros de Saúde.

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