“Não é a primeira vez que se cometem estes atos, que nós classificamos como terroristas, contra a integridade dos cidadãos” com o objetivo de “instalar o pânico na população e impedir o escrutínio do poder político”. Estas são as palavras usadas por Bubacar Turé, vice-presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), para descrever ao Expresso o clima que se vive na capital da Guiné-Bissau.
Nesta segunda-feira, um grupo de homens armados e de cara tapada invadiu as instalações da Rádio Capital em Bissau, dispararam tiros, ferindo sete jornalistas, e destruíram todo o equipamento. Viveram-se horas de pânico no bairro militar, onde se encontram as instalações da rádio que já fora assaltada em julho de 2020.
Na véspera, a LGDH já denunciara “uma onda de raptos em Bissau” que atingiu os cidadãos Wilson Barbosa, da direção geral das Alfândegas, e Armindo Celestino da Silva, detidos atualmente na segunda esquadra do ministério do Interior. A Liga exige que este ministério cesse de “imediato a prática de atos ilegais restritivos das liberdades dos cidadãos”.
À Deutsche Welle, o porta-voz do ministério do Interior, Salvador Soares, declarou: “As pessoas invadiram a Rádio Capital, fizeram alguns disparos, com danos materiais e fugiram. Neste momento estamos a investigar a situação juntamente com a Polícia Judiciária”. O porta-voz sublinhou que o ataque à rádio não tinha ligação à tentativa de golpe de Estado de 1 de fevereiro, sem prestar mais explicações.
“A imprensa livre constitui a espinha dorsal de uma democracia pluralista e do Estado de Direito. Este ato hediondo contra a Rádio Capital FM, para além de constituir um atentado à liberdade de imprensa, visa também semear terror no país através de uma vã tentativa de silenciar as vozes dissonantes para melhor instituir um regime ditatorial na Guiné-Bissau”, lê-se no comunicado lançado esta terça-feira pela LGDH que tem por objetivo “encorajar o povo guineense a manter-se firme, vigilante e determinado a combater quaisquer atos que ponham em causa os alicerces da paz, da unidade nacional e da coesão social”.
“Desde o início deste governo em 2020 que o poder político é alérgico aos direitos da população e tudo tem feito para coartar os direitos humanos na Guiné-Bissau”, diz Turé ao Expresso classificando o comportamento como “inaceitável” e prometendo uma resposta por parte dos ativistas dos direitos humanos que, tal como os jornalistas, têm estado na mira das autoridades.
“Estamos dispostos a combater isto por todos os meios”, acrescenta Bubacar Turé especificando-os como “denúncia” e “lamentando o silêncio da comunidade internacional perante ataques como o que atingiu a Rádio Capital” por comparação com o coro quase unânime que condenou o golpe de 1 de fevereiro sem questionar as condições em que ocorreu.
“Desde 2020 que há sequestros, raptos, detenções arbitrárias sem mandados de captura”, relata o ativista, esclarecendo que a população da Guiné-Bissau já vive “um medo generalizado”. “A seguir ao ataque à Rádio Capital houve pânico, as pessoas corriam na rua em fuga, iam buscar as crianças à escola”. “O clima é de tensão para que as pessoas desistam de se opor. E já funcionou! É essa estratégia que nós denunciamos: queremos preservar os direitos conquistados e as instituições da democracia”, conclui o ativista.
Há congresso do PAIGC ou não?
Já vigorava na Guiné-Bissau o estado de alerta devido ao aumento de casos de covid-19, porém, a partir de quarta-feira passada, foram proibidas as atividades político-partidárias pelo período de um mês, o que pode ainda inviabilizar a realização do congresso do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) agendado para arrancar a 17 deste mês, prolongando-se até 20.
A data da realização do congresso, onde será eleito o próximo presidente do maior partido guineense, mantém-se. Entretanto, aguarda-se a decisão do tribunal a um recurso que resultou de uma providência cautelar avançada por um militante do PAIGC alegando irregularidades num setor local do partido.
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