Eleições no Brasil

"O rei da estupidez" e o "amigo de bandidos": debate entre Lula e Bolsonaro pôs covid-19, corrupção e pedofilia ao barulho

Lula da Silva e Jair Bolsonaro
Lula da Silva e Jair Bolsonaro
Alexandre Schneider

A segunda volta no Brasil acontece a 30 de outubro. Os ânimos estão acesos entre os dois candidatos a Presidente, e o mais recente debate fez surgir acusações de parte a parte. Covid-19, desflorestação, corrupção e até abuso sexual de crianças estiveram em destaque

“Um pequeno ditador” e “o rei das notícias falsas e da estupidez”: foi assim que o candidato presidencial Lula da Silva descreveu o opositor, Jair Bolsonaro, num debate televisivo a alguns dias de ser decidido o futuro político de uma das maiores democracias do mundo, o Brasil. A gestão da pandemia, a desflorestação da Amazónia, a pedofilia e a corrupção foram os temas quentes do confronto.

Durante duas horas, Luiz Inácio Lula da Silva tentou aumentar a vantagem adquirida na primeira volta recorrendo a argumentos em torno da covid-19 e da destruição da floresta amazónica. “O facto é que a sua negligência garantiu a morte de 680 mil pessoas – mais de metade das quais poderia ter sido salva”, apontou Lula a Bolsonaro. De acordo com o antigo Presidente brasileiro, o país somou 11% das mortes provocadas pela covid-19 no mundo, embora a sua população constitua 3% do total mundial.

“Nunca antes na História houve um Governo que brincou com uma pandemia ou com a morte como você”, acusou Lula da Silva, referindo-se ao facto de Bolsonaro não ter sido vacinado e de ter aludido à covid-19 como se de uma “gripezinha” se tratasse. O atual líder brasileiro rebateu garantindo ter-se comovido com “cada morte”, e que, sob a sua governação, foram compradas “mais de 500 milhões de vacinas”. O Brasil foi “o país que mais vacinou no mundo”, retorquiu, socorrendo-se dos números absolutos.

Mas Lula aproveitou para desferir novos golpes, e garantiu que o ambiente também foi desconsiderado sob a égide de Jair Bolsonaro. “Você não mostrou respeito pela Amazónia… nenhum”, disse Lula, prometendo criar um ministério para os povos nativos, caso seja eleito. “Vamos vencer essas eleições, para cuidar da Amazónia e proibir a invasão de terras indígenas e a mineração ilegal”, vincou.

O líder da direita radical brasileira, eleito em 2018, depois de Lula da Silva ter sido detido por acusações de corrupção que foram posteriormente anuladas, contra-atacou: atribuiu ao adversário o envolvimento em escândalos de corrupção que envergonharam o Partido dos Trabalhadores (PT) durante os quase 14 anos no poder (entre 2003 e 2016). De acordo com o atual Presidente do Brasil, o PT estaria ligado a fações do crime organizado das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. “Você é uma vergonha nacional”, declarou Bolsonaro.

“Amigos de bandidos”

O ‘petista’, que visitou em campanha um dos maiores conglomerados de favelas no Rio de Janeiro, o Complexo do Alemão, viu ainda a sua iniciativa - de captar eleitores da classe trabalhadora - ser atacada. Jair Bolsonaro arriscou, assim, afastar centenas de milhares de residentes em favelas durante o debate de domingo. "Vocês são amigos de bandidos. Na favela, não tinha polícia ao seu lado, só traficantes", disparou Bolsonaro contra Lula da Silva. Foi, de resto, um dos momentos mais tensos do primeiro bloco do debate.

Entre o rol de acusações, Bolsonaro ainda defendeu que o antigo Presidente do Brasil se aproximou de “autocratas” de esquerda, em que se incluem os líderes da Nicarágua e Venezuela, Daniel Ortega e Nicolás Maduro. Lula contestou: seria Bolsonaro – antigo militar, conhecido por celebrar ditadores como o general chileno Augusto Pinochet – que representaria uma ameaça à jovem democracia brasileira.

No debate promovido pelo jornal “Folha de São Paulo”, “UOL”, “TV Band” e “TV Cultura”, os dois apontaram o dedo um ao outro invocando as mentiras de parte a parte. “O meu oponente é basicamente o mentiroso mais sem vergonha que existe”, atirou Lula. “Sou eu que defendo a democracia e a liberdade – muito mais do que este pequeno ditador… quero governar este país democraticamente como fiz duas vezes antes”, disse o antigo líder sindical, que esteve no poder entre 2003 e 2010.

As polémicas declarações sobre jovens venezuelanas

Foi também abordado no frente-a-frente o vídeo de uma entrevista em que Bolsonaro surge a fazer declarações sobre uma visita a jovens venezuelanas numa favela. Os apoiantes de Lula associaram de imediato o Presidente brasileiro a pedofilia, mas Bolsonaro disse ter sido alvo de ‘fake news’ e afirmações caluniosas. Durante o debate, Bolsonaro fez referência a uma decisão do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, que determinou que a campanha de Lula da Silva retirasse um vídeo alusivo à polémica.

Contudo, Lula da Silva alegou que Bolsonaro teve de se justificar, nas redes sociais, na madrugada de domingo, explicando por que mentiu ao associar jovens venezuelanas à prostituição. Apesar de não se ter prolongado no caso do vídeo em que Bolsonaro diz ter ido à casa de adolescentes venezuelanas depois de ter “pintado um clima”, o ‘petista’ usou um ‘pin’ da campanha contra o abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil.

O candidato da direita radical brasileira obteve um resultado superior às expectativas na primeira volta, arrancando das mãos de Lula da Silva a ‘prometida’ vitória enfática. Bolsonaro obteve 43% dos votos contra 48% de Lula, mas as sondagens previam que o atual Presidente não obtivesse mais de 37%.

Lula mantém o favoritismo para vencer, mas, nos últimos dias, os dois candidatos embarcaram numa campanha acesa nos três estados do sudeste que devem decidir o resultado: Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Juntas, aquelas regiões acolhem quase 64 milhões dos 156 milhões de eleitores brasileiros.

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