24 novembro 2013 13:27

Destruição causada pelo tufão Haiyan na cidade de Tacloban nas Filipinas. A castástrofe marcou a conferência do clima em Varsóvia
erik de castro/reuters
Resultados permitem avançar para acordo global em 2015, mas ambientalistas dizem que os compromissos são fracos, em especial na área financeira.
24 novembro 2013 13:27
A Conferência da ONU sobre Alterações Climáticas (COP19), que terminou ontem em Varsóvia (Polónia), conseguiu alcançar compromissos de financiamento de longo prazo, em particular para o Fundo Verde para o Clima.
Estes compromissos são essenciais para permitir a muitos países lidar com a adaptação às alterações climáticas, bem como apoiar tecnologias menos poluentes, investimentos em energias renováveis e eficiência energética.
Mas as organizações ambientalistas e muitos dos participantes nesta cimeira mundial consideram que os entendimentos alcançados têm pouca substância, embora reconheçam que há alguns resultados concretos.
É o caso da criação do Mecanismo de Varsóvia sobre Perdas e Danos, um princípio que considera que os países desenvolvidos que contribuíram para um histórico de emissões de gases com efeito de estufa responsável pelas alterações climáticas, poderão vir a suportar parte dos seus custos nos países em desenvolvimento.
E é também o caso do REDD+, onde se conseguiu um compromisso de 206 milhões de euros. O REDD+ é uma iniciativa global para criar um valor financeiro para o carbono armazenado nas florestas que inclui, para além da anterior iniciativa REDD (Redução de Emissões por Desflorestação e Degradação Floresta), a sua conservação e gestão sustentável.
Quercus: "oportunidade perdida"
Os países desenvolvidos e em desenvolvimento "perderam uma oportunidade em Varsóvia para definir um caminho claro para aceitar um acordo climático ambicioso e vinculativo em Paris, no final de 2015", considera a Quercus num comunicado divulgado no final da conferência da ONU.
A organização ambientalista insiste que a conferência, "ao não conseguir traçar um calendário que dê tempo suficiente para se ir atingindo consensos, transformando 2014 num ano decisivo", e ao não se darem indicações claras sobre o nível de exigência das ofertas de limitação de emissões de cada um dos países, porque os "compromissos" deram lugar a "contributos", "podemos vir a ter um final de insucesso semelhante à Conferência de Copenhaga em 2009".
Por outro lado, a Quercus assinala que "não se deu relevo suficiente às ações imediatas até ao ano 2020 para se evitar o contínuo aumento das emissões de gases com efeito de estufa à escala global", tornando-se assim mais difícil inverter a tendência de subida que conduzirá a um aquecimento superior a dois graus Celsius por comparação com a era pré-industrial (antes de 1850).
Japão, Austrália e Canadá: as grandes desilusões
Na conferência, houve também uma grande desilusão em relação a três países grandes emissores de carbono. Assim, o Japão, com a justificação de não poder recorrer à energia nuclear depois do desastre da central de Fukushima, em vez de um limite inicialmente traçado de redução em 25% das suas emissões entre 1990 e 2020, prevê agora aumentá-las em 3%.
A Austrália, que não enviou nenhum ministro a Varsóvia, tomou um conjunto de decisões à escala nacional que desmantelam grande parte da política climática em curso.
E o Canadá, que está a investir fortemente nas areias betuminosas para a extração de petróleo, não só não cumpriu as metas de redução de emissões anunciadas antes da Conferência em Copenhaga (2009) como tem, com esta postura, atrasado o avanço de outros países nas negociações.
Moreira da Silva desdramatiza resultados
Apesar das críticas, o ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Ambiente, Jorge Moreira da Silva, que representou Portugal em Varsóvia, afirmou em comunicado no final da conferência que esta "não tinha por objetivo fixar um acordo climático para o período pós-2020".
Essa decisão em torno de um sucessor para o Protocolo de Quioto, que neste momento apenas cobre 15% das emissões globais de gases com efeito de estufa, "esteve sempre prevista para a conferência da ONU a realizar em Paris em 2015".
Assim, a missão da cimeira de Varsóvia passava por aprovar "sem hesitações nem retrocessos, um plano de atividades para 2014 e 2015 que identificasse o trabalho de casa e o respetivo calendário a cumprir por parte de todos os países, tendo em vista a obtenção, em Paris, de um acordo climático pós-2020, ambicioso, justo, custo-eficiente e abrangente".
Deste modo, os resultados da cimeira, "não sendo tão ambiciosos como gostaríamos, ainda assim fornecem os elementos necessários para a conclusão do acordo pós-2020 em Paris".
Moreira da Silva justifica a sua posição sublinhando que foi acordado que todos os países - industrializados e em vias de desenvolvimento - farão todos os esforços para apresentar, de uma forma transparente e racional, até março de 2015, as respetivas contribuições nacionais de redução das emissões para o período pós-2020.
O ministro do Ambiente salienta também que "os países industrializados reafirmaram o seu compromisso de mobilizar, através de financiamento público e privado e recorrendo a várias fontes, montantes crescentes de financiamento até atingir 100 mil milhões de euros por ano em 2020, para a mitigação e adaptação às alterações climáticas nos países em vias de desenvolvimento".
E destaca ainda os compromissos obtidos na desflorestação (REDD+), responsável por 20% das emissões globais, e com a criação do Mecanismo de Varsóvia sobre Perdas e Danos, "um dos temas prioritários, em particular dos pequenos Estados-ilha, e uma reivindicação de longa data de outros países em desenvolvimento vulneráveis às alterações climáticas, entre os quais se encontram alguns países da CPLP".
O papel da União Europeia
Um acordo global para suceder ao Protocolo de Quioto "é absolutamente necessário e urgente", mas Moreira da Silva salienta que "não devemos nem podemos esperar por este acordo para continuarmos a assumir, na UE e em Portugal, as nossas responsabilidades na redução das emissões e na adaptação às alterações climáticas".
Em todo o caso, a Quercus reconhece que, "embora a UE tenha tido diversas iniciativas em Varsóvia, não conseguiu fornecer os incentivos necessários para desbloquear as discussões sobre ações climáticas de curto prazo".
Mas poderia tê-lo feito, "movendo a sua meta de redução das emissões até 2020 para 30% e proporcionando uma promessa ambiciosa de financiamento climático".
Porém, os Estados-membros, "com destaque para os obstáculos da Polónia, a própria organizadora da conferência, não conseguiram chegar a acordo sobre tais iniciativas".
Portugal com 3º melhor desempenho
Em Varsóvia, a Rede Europeia de Ação Climática (CAN), organização a que a Quercus pertence, apresentou o Climate Change Performance Index (CCPI), índice que coloca Portugal em terceiro lugar na lista dos países com melhores políticas ambientais e com políticas mais eficazes de combate às alterações climáticas.
Esta é uma classificação que compara o desempenho de 58 países que, no total, são responsáveis por mais de 90% das emissões de dióxido de carbono associadas à energia.
O objetivo do índice é aumentar a pressão política e social, nomeadamente nos países que têm esquecido o trabalho nacional no que respeita às alterações climáticas. O CCPI é da responsabilidade da organização não governamental de ambiente GermanWatch e da Rede Europeia de Ação Climática (CAN).
Neste nono ano do índice, Portugal consegue o melhor lugar de sempre, subindo uma posição, pela redução no uso de combustíveis fósseis, fomentada pelo contexto de crise, e pelos resultados da política energética, devido principalmente ao investimento nos últimos anos em energias renováveis.
Como lidar com a crise
"Portugal é um exemplo de como lidar com a crise económica", afirmou um comunicado da Quercus quando foi divulgado o CCPI, "obtendo resultado das políticas climáticas e reduzindo a dependência de recursos, lucrando com investimentos, feitos em governos anteriores, em áreas chave, como as energias renováveis, ainda que alguns destes investimentos comprometam a biodiversidade e a integridade de áreas classificadas e relevantes para a conservação da natureza".
Mas a posição do nosso país pode estar ameaçada "pela política menos construtiva do atual governo, que já abrandou alguns dos investimentos benéficos, em particular nas energias renováveis".
Os melhores lugares do CCPI foram para três países europeus: Dinamarca, Reino Unido e Portugal, que ficaram à frente da Suécia (sétimo lugar). A Alemanha saiu do Topten, ocupando agora o 19º lugar, muito penalizada pela atitude que tem tomado em decisões de política climática à escala europeia na área do comércio de emissões e da melhoria de eficiência dos automóveis.