França: oposição avança com duas moções de censura contra o Governo, que "forçou" aprovação do Orçamento

Governo francês ativou cláusula controversa que permite fazer passar um orçamento do Estado sem apreciação do parlamento
Governo francês ativou cláusula controversa que permite fazer passar um orçamento do Estado sem apreciação do parlamento
A oposição francesa avançou esta quarta-feira com duas moções de censura contra o Governo do país. As medidas foram interpostas pela Nupes (coligação de esquerda) e pelo RN (Reagrupamento Nacional, partido de Marine Le Pen), devendo chegar ao hemiciclo na próxima segunda-feira.
As duas moções surgem em resposta ao anúncio feito pela primeira-ministra francesa esta quarta-feira. Élisabeth Borne afirmou que irá ativar a cláusula 43.9 da constituição francesa, um mecanismo que permite aprovar o orçamento do Estado sem que este seja aprovado pelo Parlamento.
Estes esforços contudo deverão sair frustrados. Segundo o Le Figaro, os deputados da Nupes recusam-se a votar a favor da moção do RN e vice-versa. Mesmo que os dois lados se entendessem, o grupo parlamentar d'Os Republicanos (centro-direita) recusa envolver-se, não contribuindo assim com os votos necessários para derrubar o Governo.
A ativação da cláusula 49.3 já estava a ser antecipada há vários dias. Na Assembleia Nacional, o debate orçamental dura já há seis dias e o executivo de Emmanuel Macron (que tem apenas maioria relativa) corria o risco de não ver o documento aprovado ou dr este sofrer alterações significativas em matéria fiscal e de despesa pública. Durante o debate foram apresentadas 3500 propostas de alteração, das quais 102 foram aprovadas.
“No momento em que falamos, ao sexto dia de debate [orçamental], um grande número de alterações ainda estão por analisar”, afirmou Élisabeth Borne no Parlamento. “Esta decisão é a escolha da responsabilidade, porque devemos dar ao país um Orçamento coerente com os compromissos assumidos perante os franceses: sem aumento de impostos, sem aumento do défice.”
Na V República, o artigo 49.3 já foi utilizado 89 vezes, sendo que a última vez aconteceu no início do 2020, quando o Governo de Edouard Phillipe aprovou desta forma a reforma do sistema de pensões que seria depois suspensa devido à pandemia e será retomada por Borne.
Este artigo pode ser usado uma vez por sessão legislativa, para o Orçamento e para outra lei que o Governo considere essencial.
Embora não seja a primeira vez que a cláusila é utilizada, o seu uso no atual contexto de crescente tensão social é contudo visto como controverso.
No passado domingo, milhares de pessoas saíram à rua numa "marcha contra o alto custo de vida e a inação climática" em Paris. Esta terça-feira, o país foi paralisado por uma greve geral. Nos cartazes usados nas manifestações, foi possível avistar mensagens contra a ativação da 49.3.
“O uso da 49.3 atesta a fragilidade política do governo, ilustra o desrespeito pela representação nacional e confirma o impasse do executivo”, escreveram os deputados da Nupes no texto da moção de censura apresentada esta quarta-feira. “Esta 49.3, um ato de brutalidade anti-democrática, negação do parlamentarismo, provocação dos cidadãos representados pelos deputados eleitos pela Nupes, leva-nos a pedir a censura deste Governo.”
O texto da RN deverá ser conhecido esta quinta-feira.
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