22 fevereiro 2022 16:37
Do PSD ao Livre, os partidos portugueses com representação parlamentar mostram-se preocupados com as consequências da decisão do Kremlin de reconhecer a independência de duas regiões separatistas ucranianas. E apelam aos decisores políticos para que façam prevalecer a via diplomática. No entanto, os comunistas responsabilizam Kiev por “constantes violações do cessar-fogo” e “sucessivas provocações”
22 fevereiro 2022 16:37
O PSD condena a decisão da Rússia de reconhecer a independência das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, dizendo tratar-se de “uma violação do Direito Internacional, dos Acordos de Minsk e do princípio do respeito pela integridade territorial dos Estados”. Em nota enviada esta terça-feira à imprensa, a comissão permanente nacional do partido acrescenta que “nenhuma ordem internacional pode subsistir quando os Estados se sentem livres para colocar em causa a soberania de outros Estados e para alterar as fronteiras pela força”.
Afirmando defender “sempre a diplomacia e a solução pacífica dos conflitos” e a necessidade de “evitar uma ainda maior escalada da situação”, os sociais-democratas instam a comunidade internacional a “deixar bem claro que há punições para quem não cumpre as normas e as leis internacionais”. Nesse sentido, o PSD afirma concordar com a decisão da União Europeia (UE) de impor novas sanções à Rússia e destaca “o quadro de grande unidade europeia e transatlântica que se tem verificado desde a primeira hora desta crise”.
O presidente do PSD, Rui Rio, escreveu no Twitter que “a Rússia tem de ser condenada”. “Faço parte de uma geração que viveu a Guerra Fria e o pesadelo da Destruição Mútua Assegurada; uma geração que sonhou no dia da queda do muro de Berlim. Esta é a hora em que a Rússia tem de decidir se quer regressar ao pesadelo ou abraçar a paz”, acrescentou.
Num vídeo enviado às redações, o presidente do Chega sustenta que “as atitudes da Rússia não podem ficar impunes nem devem ser ignoradas pelos políticos em toda a Europa”. Essas atitudes materializaram-se esta segunda-feira “em atos concretos de natureza militar e na criação de uma nova narrativa que viola claramente o Direito Internacional e a soberania de um território”, descreve André Ventura.
O partido que lidera manifesta, por isso, “solidariedade para com o povo ucraniano” e exorta as instâncias europeias a adotarem “uma posição firme, conjunta e forte”, lamentando que a atitude da maior parte dos países europeus, “incluindo Portugal”, tenha sido “fraca e frouxa”. “Não é assim que vamos conseguir resolver o conflito na Ucrânia. Hoje será uma parte do território, amanhã será outra parcela”, adverte.
O Chega insta ainda a Rússia “a resolver diplomaticamente a questão com a Ucrânia e com os parceiros europeus”. Ventura lembra que “há momentos da história em que é preciso ter muita firmeza de ação, de valores e de princípios para conter questões que infelizmente não se resolveram pela via diplomática”. E remata: “A história do século XX mostra-nos isso e é importante não esquecer.”
Também a Iniciativa Liberal (IL) condena o que descreve como “as mais recentes violações do Direito Internacional e da soberania da Ucrânia por parte da Rússia, numa escalada de agressão que visa intimidar um país soberano e estender a influência autocrática da Rússia para além das suas fronteiras”. Por isso, a IL “exorta o Governo português a assumir uma posição igualmente clara nesta matéria, estendendo tal exortação a todos os partidos portugueses”.
Considerando que “a Rússia procura uma agressão territorial imperialista de grande escala com justificações étnicas/racistas”, a IL defende em comunicado que “este é um momento em que não podem existir hesitações”. E acrescenta: “Os governantes russos têm medo que o seu povo perceba que a democracia liberal é o único sistema político que lhes pode trazer mais prosperidade e uma vida melhor e o exijam, depondo o atual regime autocrático. Os governantes russos têm medo da democracia liberal a crescer às suas portas.”
Também em comunicado, o PCP manifesta a sua “profunda preocupação” com a situação, salientando que os últimos desenvolvimentos são “inseparáveis de décadas de política de tensão e crescente confrontação” dos EUA e da NATO contra a Rússia. Esta confrontação tem decorrido “nos planos militar, económico e político”, tendo havido “um sistemático avanço da instalação de meios e contingentes militares deste bloco político-militar cada vez mais próximo das fronteiras” russas, prossegue a nota dos comunistas.
“O PCP denuncia a perigosa estratégia de tensão e propaganda belicista promovida pelos EUA, NATO e UE, e apela ao desenvolvimento da ação em defesa da solução pacífica dos conflitos internacionais, pelo fim das agressões e ingerências do imperialismo, pela rejeição do alargamento da NATO e pela sua dissolução, contra a militarização da UE, pelos princípios de paz e desarmamento inscritos na Constituição da República Portuguesa”, acrescenta o PCP.
Os comunistas defendem ainda a adoção de “iniciativas que contribuam para o desanuviamento e que privilegiem um processo de diálogo com vista a uma solução pacífica para o conflito”. Em concreto, com “a promoção da paz e da segurança na Europa, no respeito dos princípios da Carta da ONU e da Ata Final da Conferência de Helsínquia”, detalham. O PCP responsabiliza ainda a Ucrânia por “constantes violações do cessar-fogo”, “sucessivas provocações” e por “uma massiva concentração de forças militares junto à linha de demarcação”. E insiste que “a decisão agora assumida pela Federação Russa não pode ser olhada à margem desta conjuntura e dos seus desenvolvimentos”.
Antes disso, o comunista Miguel Tiago já tinha acusado o primeiro-ministro de fazer de “cãozinho da NATO”, acrescentando “que vergonha”. Fê-lo no Twitter em resposta a uma publicação de António Costa, que escreveu que “o reconhecimento russo das duas regiões separatistas da Ucrânia viola claramente os Acordos de Minsk e põe em causa a integridade territorial da Ucrânia”.
Ainda pelo Governo, o ministro dos Negócios Estrangeiros classificou como “ilegítimo e ilegal” o reconhecimento pelo Presidente russo da independência dos territórios separatistas pró-Rússia na Ucrânia. “Em nome de Portugal, gostaria de expressar toda a minha solidariedade para com a Ucrânia e a nossa firme condenação do ato ilegítimo e ilegal da Federação Russa”, declarou Augusto Santos Silva.
Em declarações à TSF, Luís Fazenda, do Bloco de Esquerda (BE), condenou o que descreveu como uma “onda imperialista da Rússia”. “Só podemos condenar o reconhecimento da independência das repúblicas separatistas na Ucrânia. O processo de paz obrigaria a uma via diplomática, um diálogo político, real e concreto, e não propriamente extremar as posições. A Rússia fê-lo. Isso é absolutamente condenável e esperamos que esta escalada não continue. Há que encontrar o espaço para a via diplomática e para minimizar aquilo que possam ser escaladas de guerra”, exortou.
Aquele que é um dos fundadores do BE traçou igualmente um roteiro para uma solução pacífica: “É necessário que a Europa ganhe o seu espaço neste contexto e quer a França, quer a Alemanha, quer outros países estão a tentar essa via diplomática, de modo a amortecer esta escalada de tensões que pode ter um desfecho muito negativo”. Fazenda defendeu ainda que a situação atual “está a ser um teste para a Europa”.
O bloquista referiu que “não é muito normal, do ponto de vista da política internacional, que tenha sido o presidente dos EUA a anunciar que se houver uma invasão da Ucrânia, o gasoduto a norte de Nord Stream 2 será encerrado pela Alemanha”. “Aí há um défice da Europa e um défice da liderança do próprio Estado alemão”, diagnosticou.
O PAN critica a posição da Rússia, frisando que constitui uma “violação da soberania dos povos”, ao “arrepio” do acordo de Minsk e pede à comunidade internacional que “redobre a mobilização” com vista a garantir a paz e os direitos humanos fundamentais.
“Num contexto em que o mundo ainda está fortemente pressionado pelos impactos socioeconómicos trazidos por uma crise sanitária global, a opção por um conflito armado não é de todo aquilo de que necessitamos”, afirma o PAN numa nota.
O partido liderado por Inês de Sousa Real sustenta ainda que o Governo português, “mais do que defender sanções” a Moscovo, deve rever a atribuição de vistos gold a cidadãos russos, que “muitas vezes se sabe pertencerem à oligarquia que rodeia e apoia Putin” e o seu Executivo. “E que sabemos coloca em Portugal dinheiro proveniente de origem muito duvidosa. Só com esta revisão o Governo poderá ter uma ação no contexto interno coerente com o que defende no contexto internacional”, observa.
O Livre condena o reconhecimento da independência dos territórios separatistas pró-Rússia pelo Kremlin, uma ação “ilegal” que agrava “brutalmente” a crise que se vive na Europa, e apela à unidade da UE. “Portugal deve agir no quadro da UE e em coordenação com os parceiros internacionais, pois só a unidade na política externa por parte da Europa permitirá defender a integridade territorial e a soberania da Ucrânia e o cumprimento do Direito Internacional. Portugal e a UE tudo devem fazer para evitar a guerra e o desastre humanitário que se avizinha”, diz Pedro Mendonça, porta-voz do Livre, ao Expresso.
Afirmando que a Ucrânia tem as suas fronteiras internacionalmente reconhecidas e a Rússia, enquanto signatária da Carta da ONU, se comprometeu a não lançar “ações agressivas, nem provocação”, o Livre lamenta que Moscovo não cumpra as “condições mínimas exigíveis” para evitar o conflito, apelando a uma resposta inequívoca por parte da UE. “À tentação imperial russa, a Europa deve responder com união, legalidade internacional, defesa dos Direitos Humanos e ações que mostrem que o tempo dos impérios não é este, que este tem de ser o tempo da paz, prosperidade e segurança para todos os povos europeus”, insiste.
Considerando que este não pode ser o “tempo da força das armas, do gás e do petróleo”, o porta-voz do Livre defende ainda que a atual crise não deixa dúvidas sobre a importância geoestratégica de a Europa “aumentar massivamente” o investimento em renováveis e outras alternativas energéticas. “Esta crise que vivemos demonstra também que é finalmente a hora de investigar o dinheiro sujo dos oligarcas, confiscar propriedade, retirar licenças a bancos russos e, caso seja necessário, retirar a Rússia do sistema SWIFT de pagamentos internacionais”, acrescenta.