Presidente da Câmara dos Representantes dos EUA reuniu-se com cúpulas militares para afastar Trump de qualquer manobra imprevisível
The Washington Post/Getty Images
Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, disse esta sexta-feira estar a fazer possível para garantir que os chefes dos vários ramos militares do país mantêm os alertas ligados contra qualquer ato violento que o Presidente Trump ainda possa tomar antes da tomada de posse de Joe Biden
A presidente da Câmara dos Representantes do Estados Unidos, Nancy Pelosi, parece estar mesmo convencida de que Donald Trump pode mesmo ser um perigo físico para os norte-americanos, isto apesar de o ainda Presidente dos Estados Unidos já ter dito que a transição será "ordeira".
Esta sexta-feira, através de um comunicado citado por vários meios de comunicação norte-americanos, fez saber que já se reuniu com o principal oficial militar do país sobre as "precauções disponíveis" para impedir que Trump possa enviar os militares na rua, ou mesmo dar ordens para um ataque nuclear.
“A situação em que nos coloca este Presidente desequilibrado não poderia ser mais perigosa e devemos fazer tudo ao nosso alcance para proteger o povo americano dos seus ataques ao nosso país e à nossa democracia”, lê-se no comunicado.
Ao mesmo tempo, vários membros do Partido Democrata já pediram que se dê início a um processo de remoção do Presidente, já que o vice-Presidente e o gabinete de ministros de Trump não deram ainda sinais de estarem a ponderar acionar a 25ª emenda, que transfere o poder do Presidente em exercício para o seu vice, quando o primeiro se encontre incapacitado de cumprir os seus deveres, por razões de saúde, física ou mental apesar de esta última hipótese nunca se ter colocado antes.
O caso vem no seguimento da invasão do Capitólio, onde se localizam as duas câmaras do Congresso norte-americano, por parte de apoiantes de Trump convencidos de que as eleições presidenciais que Trump perdeu lhe foram roubadas por uma fraude montada pelos democratas. Trump pediu à multidão que o ouvia na quarta-feira, dia da confirmação de Biden no Senado, que marchasse até ao Capitólio, repetiu dezenas de vezes a que as eleições haviam sido roubadas àquelas pessoas que ali o ouviam e também disse que só com atitudes fortes é que se pode mudar alguma coisa.
Centenas de pessoas invadiram então o Capitólio, logo a seguir ao seu discurso. Do caos, além da destruição de vários artefactos, escritórios e mobília, resultaram cinco mortos. Alguns analistas legais alegam que Trump pode vir a ser julgado por ter liderado o motim, mas a linha entre a liberdade de expressão e o incitamento à violência é muito ténue, como explicou, em entrevista ao Expresso no rescaldo dos confrontos, Mark Tushnet, professor de Direito na Universidade de Harvard e conselheiro jurídico do Congresso americano.
Planos para 'impeachment' avançam
O "New York Times" escreve, esta sexta-feira, que os planos para um segundo 'impeachment' de Trump por culpa do seu alegado papel na incitação de um ataque violento ao Capitólio, estão já em estado avançado e podem ter início já na próxima semana.
O representante democrata da Carolina do Sul, Jim Clyburn, disse ao POLITICO que os artigos de 'impeachment' podem ser redigidos "muito em breve". “Acredito que devemos ter preparados, até este fim-de-semana, os artigos de fundamentação do processo de remoção. Devemos estar prontos para os votar assim que cheguem a plenário", disse o democrata que acredita num consenso de ambas as alas. "Acho que sim, que será um apoio bipartidário", acrescentou.
O apoio dos republicanos a este tipo de medidas pode até ser mais robusto do que as intervenções públicas dos membros do partido dão a entender (até agora apenas Adam Kinzinger, do Illinois, falou publicamente sobre o seu apoio ao fim antecipado do mandato de Trump) mas é pouco crível que apenas a 12 dias da tomada de posse do Presidente eleito Joe Biden haja um apetite generalizado entre as hostes republicanas por mais um momento embaraçoso e disruptivo para o partido.
Para que um processo de remoção seja bem-sucedido é preciso que dois terços do Senado aceitem condenar o Presidente por algum crime suficientemente grave para justificar esse caminho - e em 2019 apenas um senador republicano, Mitt Romney, votou pelo 'impechment' de Trump, um ação desencadeada depois de o Presidente ter tentado garantir apoio de um governo estrangeiro, o da Ucrânia, a uma investigação contra o seu na altura apenas rival político, hoje Presidente eleito, Joe Biden, ameaçando cortar as ajudas financeiras a esse país, essencial no jogo geopolítico entre a Rússia e o Ocidente.
O problema é que, para um processo de remoção, que supõe um julgamento no Senado, o calendário já não dá - e para que a 25ª emenda se torne uma realidade é preciso que Trump aceite essa transição de poder para Mike Pence (como Ronald Reagan ou George Bush por razões de saúde) o que ninguém pressupõe que seja o caso.
Trump pode opor-se a esse afastamento enviando uma carta ao Congresso, sendo que Pence e a Administração teriam então quatro dias para responder. O Congresso reunir-se-ia para votar mas não basta uma maioria de um para afastar um presidente - são necessários dois terços da maioria - normalmente 67 senadores e 290 membros da Câmara dos Representantes.
Em declarações ao Expresso, Joshua Dressler, professor emérito de Direito da Universidade do Ohio disse que provavelmente não vai apostar o seu dinheiro numa remoção antes do tempo: “Se quisermos ser realistas, não há tempo para um julgamento de 'impeachment', não é opção. A 25ª é possível, mas exige uma votação de 2/3 do Senado e da Câmara, o que não é provável. Mas mais importante do que a remoção é ficar tão claro a raiva e o choque experimentados pelos membros do Congresso e outros que trabalham para Trump”, diz o professor, que alerta, porém, para a necessidade de não alienar os muitos milhões que voltaram a escolher Trump: “os congressistas devem evitar criar uma camada extra de crispação e divisão entre os norte-americanos”.
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