Internacional

Věra Jourová: “Vender 'cidadania' ou 'residência' coloca mais ou menos os mesmos riscos para toda a Europa”

23 janeiro 2019 20:47

Susana Frexes

Susana Frexes

correspondente em Bruxelas

Věra Jourová

thierry monasse/getty

A comissária europeia com a pasta da Justiça, Consumidores e Igualdade de Género considera injusto que a cidadania seja atribuída mais facilmente a quem tem dinheiro do que a alguém que está integrado num determinado país. No caso português e dos Vistos Gold de residência, defende que deve haver transparência e ligações genuínas da pessoa em causa ao país. A checa Věra Jourová espera agora que Portugal nomeie um representante para o Grupo de Especialistas, proposto nesta quarta-feira por Bruxelas, e que deveria começar a funcionar ainda este ano para melhorar a transparência, gestão e segurança dos esquemas de vistos e passaportes gold

23 janeiro 2019 20:47

Susana Frexes

Susana Frexes

correspondente em Bruxelas

Chipre, Malta e Bulgária são os três países que têm esquemas de atribuição de Passaporte Gold, ou seja, de cidadania. Os alertas são principalmente para eles ou também para os 17 que têm esquemas de atribuição de residência?

O alertas são para todos, porque vender "cidadania" ou vender "residência" coloca mais ou menos os mesmos riscos para toda a Europa. Por isso temos de prestar atenção e envolver os restantes estados-membros no processo de como melhorar e tornar os sistemas mais seguros.

No caso de Portugal, o relatório menciona o facto de alguém poder obter a residência, residindo no país apenas sete dias por ano. Como olha para este caso?

No relatório, referimos as decisões do Tribunal Europeu de Justiça que dizem que para se atribuir cidadania europeia ou residência deve haver ligações genuínas da pessoa em causa ao país. E no caso da residência, deve haver propósitos muito claros e transparentes. Esta é a mensagem para todos os estados-membros, para que cumpram estes requisitos. Se vão atribuir cidadania ou residência, têm de saber quem são as pessoas, o que querem fazer no território europeu. E pedir a presença física, especialmente no caso de estarem a conceder a cidadania.

A Comissão quer criar um grupo de especialistas dos vários estados-membros para melhorar a transparência, a gestão e a segurança dos esquemas de vistos e passaportes gold. Espera que Portugal também participe?

Consideramos importante que todos os estados-membros participem neste grupo. Porque se uma pessoa tem acesso à cidadania de um, então tem direitos em todos os estados-membros. Esperamos que agora nomeiem os seus representantes e comecem a trabalhar em breve, ainda este ano.

Acompanhou o caso de corrupção que envolve os Vistos Gold em Portugal e cuja decisão do tribunal foi conhecida este mês?

Não conheço o caso em detalhe. De forma mais geral, se há uma suspeita de corrupção, esperamos que os tribunais nacionais atuem e julguem os casos.

A Comissão Europeia não pode abolir estes esquemas. Parece-lhe que os Estados-membros também não estão dispostos a fazê-lo?

No caso de estes esquemas terem de existir - e nós não podemos aboli-los - recomendamos que os tornem mais seguros, sob um controlo mais restrito, e que permitam aos (restantes) estados-membros terem uma palavra a dizer.

O que pode fazer a Comissão Europeia neste caso?

Acho que fizemos o correto. Descrevemos a situação nos estados-membros, e tudo o que sabemos sobre os riscos possíveis para a segurança. Na Europa, há um enorme pedido para que os europeus estejam mais seguros e para protegermos melhor as fronteiras externas. Por isso, temos de ter em conta os riscos, como a lavagem de dinheiro, a corrupção, a fuga aos impostos. [No relatório], descrevermos estes riscos e fazemos propostas, porque estamos profundamente convencidos de que, se um estado-membro vende "cidadania", que é também cidadania europeia, então os outros estados-membros têm de estar mais envolvidos no processo e nas decisões.

Mas na sua opinião, o melhor seria aboli-los?

Quando vejo o que muitas pessoas - que têm ligações genuínas com um país, que vivem lá, que aprenderam a língua e a cultura, que se integraram, que tiveram filhos - têm de esperar pela cidadania porque não têm dinheiro suficiente, pessoalmente, não acho que isto seja justo.