Irmãos, como sabeis, a idade avançada torna cada vez mais difícil cumprir o magistério que me foi confiado pela inescrutável sapiência do Espírito Santo e por isso preparei a minha alma para terminá-lo com a solene dignidade inerente ao meu posto, mas tudo isso foi para as urtigas assim que caí no erro de permitir que o meu honrado nome fosse enlameado com contratos de adjudicação autorizados por um tal de Medina que é amigo dos russos ortodoxos para altares-palcos de betão desenhados por arquitetos como o Manuel Salgado que mais parecem um zigurate blasfemo da Babilónia, feitos com andaimes comprados ao sucateiro Manuel Godinho, ecrãs gigantes contratados à JP Sá Couto e velas feitas com parafina da Sonangol, num evento que começou como um humilde filme do Pedro Costa filmado com uma Super 8 a tiracolo num bairro social da Amadora, mas que, depois de passar pelo Carlos Moedas, transformou-se numa espécie de sequela de uma superprodução do Cecil B. DeMille realizada em Bollywood com financiamento da Netflix. E ainda por cima, como se não me bastasse, acabo defendido em praça pública pelo Augusto Santos Silva, que gosta tanto de católicos como o imperador Nero. Assim sendo, decidi bater com a porta, misturando o meu sagrado nome com as Alexandras Reis e os Migueis Alves desta vida, justificando a minha abdicação com aqueles eufemismos bacocos usados por qualquer ex-vereador do urbanismo, como “entendi não reunir condições para continuar a desempenhar as funções para as quais foi nomeado”. Por isso addio, adieu, aufwiedersehen, goodbye, como diz o ecuménico José Cid. E só tenho pena de não ter seguido os conselhos do Bento XVI, que, coitado, demitiu-se quando soube que o Cavaco Silva andava por aí a dizer que foi graças a uma cunha dele que Nossa Senhora inspirou a sétima avaliação da “troika”.V.E.