Lucros dos bancos não são “escandalosos”

Rentabilidade: banqueiros falam em otimismo, não veem incumprimento excessivo e dizem que há uma ‘guerra’ de spreads no crédito à habitação e um ‘mito’ nos juros dos depósitos
Rentabilidade: banqueiros falam em otimismo, não veem incumprimento excessivo e dizem que há uma ‘guerra’ de spreads no crédito à habitação e um ‘mito’ nos juros dos depósitos
Jornalista
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Os bancos portugueses estão mais sólidos, apresentam lucros mais altos, mas esse retorno não é imoral nem escandaloso, defende quem está na sua liderança. Só com melhor rentabilidade as entidades conseguem atrair capital de acionistas e podem apoiar empresas e famílias — e é isso que os banqueiros dizem que está a ser feito.
“Lucros imorais? A banca portuguesa está com a economia portuguesa como já esteve na covid-19. Tudo o que estamos a fazer é que os clientes com mais dificuldades sejam apoiados”, garantiu o presidente executivo do BCP, Miguel Maya, no CEO Banking Forum, iniciativa do Expresso e da Accenture, esta quarta-feira. Um exemplo são as execuções judiciais para o banco tomar posse de casas: são seis vezes inferiores às de 2018. Para provar o seu ponto, Miguel Maya desdramatizou: “Se os lucros fossem assim tão elevados, você, com os depósitos, estava a comprar ações dos bancos. Se os lucros são assim tão elevados face ao capital investido”, os portugueses investiam em ações dos bancos. “Não é isso que acontece.”
Paulo Macedo também recusa que haja excesso de rentabilidade: só com ela a Caixa Geral de Depósitos conseguirá “pagar a ajuda que o Estado lhe deu”. Uma devolução de €2,5 mil milhões aos contribuintes e €1000 milhões aos privados, que o gestor acredita que possa ficar finalizada em 2025.
“Os bancos têm um contexto: o facto de terem lucro é muito importante para apoiarem as famílias, para continuarem a fazer grandes investimentos”, defende Pedro Castro e Almeida, do Santander. Lembra que o retorno passado foi “muito baixo” e até negativo e que no ano passado foi de 8,8%, o que fica abaixo do custo que os acionistas têm de ter no capital ali investido. “Os resultados de 2023 vão ser bons. Mas ter €200 milhões em 2005 não é o mesmo que em 2023. Vamos ter boa rentabilidade. Vai ser escandalosa em comparação com a Europa? Não. Vai chegar a rentabilidade dos EUA? Não. Os investidores acreditam que vão ter esta realidade? Não”, disse o líder do Santander.
É por isso que João Oliveira e Costa, do BPI, deixa um pedido: “Isto não vale tudo. É um dos sectores mais fundamentais da nossa economia. Penso que será aconselhável não utilizar a banca como mecanismo para ser populista.”
No caso do Novo Banco, ainda a disputar verbas de quase €500 milhões ao Fundo de Resolução, a rentabilidade é necessária para pôr o banco no terreno. Está “muito bem capitalizado, tem uma boa posição para apoiar a economia”, e Mark Bourke, o presidente executivo, assumiu que “o banco está a preparar-se para uma transação”, que deverá passar pela ida para a Bolsa de parte do capital. Quando, ainda não há datas.
Otimismo
Os banqueiros defendem a necessidade de lucros, recusam que sejam excessivos, negam incumprimento generalizado e argumentam que têm já medidas no terreno para apoiar as famílias e as empresas.
Macedo recorreu a dados “objetivos” do Banco de Portugal para tirar algum peso da atual situação: “Temos um terço das famílias com crédito à habitação, que não está nem nos mais vulneráveis nem nos mais idosos, concentrado na classe média: dois terços dos créditos estão em pessoas com rendimento acima da média.” Anunciou ainda uma redução até 50 pontos-base na taxa dos créditos à habitação dos clientes que têm legalmente direito a bonificação dos juros. O líder da CGD frisa que há “uma ‘guerra’ de spreads” no crédito à habitação: “O que vejo é que há spreads que estão muito inferiores a 1%, a 0,8%. O que vemos é que a cada mês um banco faz uma promoção, outro desce.” Nos depósitos, também há um “‘mito’ completo”: “Se formos ver tudo o que são ofertas de taxas, a cada 15 dias há um banco que aumenta uma.” Porém, não falou no tempo e no desfasamento que permitiu que a margem dos bancos disparasse nos últimos trimestres. Macedo avisa que não vai haver alinhamento de juros de crédito e depósitos, senão não havia negócio.
Em relação à economia, os responsáveis dos bancos defendem que tudo está melhor (mas ainda com problemas estruturais por resolver, como sublinhou Maya). “Se olhássemos há 12 ou 6 meses, não acreditávamos que hoje estivéssemos a crescer a 2,5%. Essa perspetiva não existia, obviamente que ambicionamos crescer mais, mas em média não foi esse o número a que se cresceu”, disse Oliveira e Costa. Como inverter? Olhar para a Irlanda é a proposta do líder do BPI. “Um dos temas em que devíamos fazer um trabalho de fundo para uma economia tão pequena como a nossa é os incentivos fiscais nas empresas.”
Em momentos de incerteza há oportunidades para agarrar. Como reinventar a banca e as empresas foi o tema do CEO Baking Forum, que reuniu vários especialistas do sector financeiro. “Em todas as corridas de carros há quem abrande e quem acelere, arrisque oportunidades e saia vencedor”, afirma Peter Sidebottom, responsável pela Estratégia Bancária Global da Accenture. Tudo para dizer que mesmo em “momentos de incerteza é preciso tirar partido das oportunidades” e que “o cliente é o centro do negócio”. No mesmo sentido, Madalena Tomé, CEO da SIBS, considera “a transformação dos serviços financeiros”, em termos tecnológicos e recurso à inteligência artificial (IA), “uma revolução com enormes desafios” e como ferramenta de combate à fraude. Para o responsável de Inovação do BPI, Afonso Eça, a IA tem de estar ao serviço do cliente e “é apenas um meio a utilizar”. Já Catarina Castro, CEO da Blue CP, considerou importante “conciliar a origem da banca — antiga e secular — e motor da economia com a tecnologia para ter tempo de ouvir e perceber a vida dos clientes”. E Emanuel Agostinho, administrador da Accenture, acrescentou: “O admirável mundo novo da IA dá excelentes opções para melhor servir o cliente.” I.V.
“A Caixa tem de dar rentabilidade, para pagar a ajuda que o Estado lhe deu. Até 2024 tem capacidade para pagar tudo ao Estado em 2025”
Paulo Macedo
Presidente da CGD
“O discurso político devia estar claramente focado na inovação na produtividade, criando maior riqueza para o país”
Miguel Maya
Presidente do BCP
“É uma questão de ambição: se queremos continuar a crescer [Portugal] entre 1% a 2% ou se queremos crescer entre 3% a 5%”
Pedro Castro e Almeida
Presidente do Santander Portugal
“Devíamos pensar nos incentivos fiscais e nomeadamente no incentivo fiscal nas empresas”
João Oliveira e Costa
Presidente do BPI
“Portugal tem cinco grandes bancos, e é uma configuração interessante e competitiva”
Mark Bourke
Presidente do Novo Banco
CEO Banking Forum
Pelo quinto ano consecutivo, o Expresso, em parceria com a Accenture, juntou os cinco maiores bancos nacionais para discutir os desafios da economia nacional. Sustentabilidade da banca, PRR, inflação e impacto na economia foram alguns dos temas.
Textos originalmente publicados no Expresso doe 26 de maio de 2023
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