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“Se as empresas não forem verdes, o financiamento pode desaparecer ou diminuir”

“Se as empresas não forem verdes, o financiamento pode desaparecer ou diminuir”
NUNO FOX

Hoje, uma empresa que não invista na descarbonização e que não seja responsável socialmente, corre o risco de desaparecer. Esta foi uma das mensagens do 7º Congresso da Ordem dos Contabilistas Certificados, uma iniciativa a que o Expresso se associou e que terminou esta sexta-feira

Ana Baptista

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Neste terceiro e último dia do 7º Congresso da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC), que decorreu na Altice Arena, em Lisboa, houve dois temas quentes: o impacto que as ações e objetivos sustentáveis de uma empresa têm no seu financiamento; e a ética na divulgação das informações financeiras e não financeiras, ou seja, as que estão relacionadas com as ações climáticas. Para isso estiveram presentes mais nove oradores, entre eles António Almeida, gestor de cliente do Banco Europeu de Investimento (BEI); Gabriela Figueiredo Dias, presidente do IESBA e ex-presidente da CMVM; Gonçalo Regalado, do Millennium BCP; José Manuel Fernandes, eurodeputado; Pedro Siza Vieira, sócio da sociedade de advogados PLMJ ex-ministra da Economia; Alan Jonhson, presidente da International Federation of Accountants (IFAC) e, a encerrar o Congresso, Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente da República. Estas são as principais conclusões.

1. A urgência climática

  • O ministro da Economia, António Costa Silva já ontem tinha dito que o modelo económico que temos “não é sustentável” e hoje o ex-ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, reforçou essa ideia, concordando que esse modelo “acelera as alterações climáticas”. E, portanto, não há mesmo volta a dar, “vamos ter de viver de uma forma diferente e conciliar o nosso crescimento económico com decisões mais sustentáveis” e “temos de resolver contradições. Não posso querer mais energia verde, mas depois não querer um parque eólico à porta. Nem posso querer mais carros elétricos, mas depois não quero uma mina de lítio”, repara Pedro Siza Vieira.
  • E nem a subida da inflação e das taxas de juro pode refrear estes objetivos. “Quando olhamos para a taxa de exploração de uma empresa vemos o que aconteceu ao custo da energia. A empresas que investiram a tempo na transição e na eficiência energética não estão a ser tão impactadas como as que estão agarradas aos combustíveis fósseis e à eletricidade tradicional e ao gás. Vamos ter de criar soluções de independência energética e esses investimentos não são só para a sustentabilidade ambiental, mas para a sustentabilidade da empresa e dos postos de trabalho”, diz Gonçalo Regalado. Que reforça: “O investimento não pode refrear, tem de ser feito, aliás já devia ter sido feito”.
  • De acordo com José Manuel Fernandes, “a Portugal não faltam recursos financeiros, é preciso é utilizá-los bem”. Por exemplo, no quadro financeiro plurianual e no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) 30% e 37% respectivamente, têm de estar dedicados ao combate às alterações climáticas.
    . É que, diz Pedro Siza Vieira, “o problema das alterações climáticas coloca em causa a nossa existência. Em 2021, 100 milhões de pessoas foram forçadas a migrar e a maior parte já não se desloca por fugas a conflitos, mas por razões ambientais. E nós sentimos isso cá também, com onde de calor ou furacões, algo impensável há 20 ou 30 anos”.

2. A ética social e financeira

  • Foi, precisamente, por as alterações climáticas também terem impacto na vida das pessoas que o conceito de sustentabilidade se alargou e passou a incluir a responsabilidade social e a ética na gestão. “Uma empresa que falha na responsabilidade social, falha. Gerir hoje, é gerir para as pessoas”, comenta Marcelo Rebelo de Sousa, acrescentando que “quanto mais poder se tem, mais humilde se deve ser. Para não subir à cabeça”.
  • A ética assume, assim, uma importância cada vez maior, principalmente depois dos acontecimentos recentes. “Todos os grandes colapsos financeiros, casos de corrupção ou fraudes dos últimos 20 anos têm problemas éticos de abordagem ao negócio”, o que “diluiu, para não dizer teve um impacto fortíssimo, na confiança dos investidores e da comunidade” e, por isso, “há uma crise de confiança que tem um impacto fortemente negativo na forma como o capital chega às empresas, no desenvolvimento económico e na robustez da organização social”, diz Gabriela Figueiredo Dias.
  • Essa ética que tem vindo a ser reforçada nos relatos financeiros vai também ter de passar para os relatos não financeiros que, a partir de janeiro de 2023 vão passar a ser obrigatórios para as grandes empresas e para as PME suas participadas, mas também para todas as empresas que trabalhem com estas, porque é suposto toda a cadeia de valor ser sustentável. Esse relatório não financeiro terá ainda de ser certificado e foram vários os que, durante os três dias de congresso, defenderam ser uma tarefa para os contabilistas certificados, já habituados a trabalhar com a informação não financeira.

3. O impacto no financiamento

  • No Banco Europeu de Investimento já não há outra forma de avaliar as empresas e analisar se são elegíveis para receber financiamento ou não. “A nossa génese foi o apoio à coesão, mas agora é o banco do clima. Desde 2019 que o banco deixou de financiar qualquer projeto de combustíveis fósseis”, explica António Almeida, acrescentando que, “se as empresas não forem verdes, o financiamento que damos desaparecer ou diminuir”.
  • No BCP, apesar de ter um propósito diferente do BEI, a lógica é a mesma. Uma empresa com preocupações de sustentabilidade vai ter mais e melhor acesso a financiamento do que uma que não tenha essas preocupações. E este impacto sente-se mais nas PME e nas micro empresas que tendem a precisar de mais financiamento que as grandes. O problema é que são também as PME e as micro empresas que têm mais dificuldade em aceitar e fazer estas mudanças.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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