Ambições de quem quer reforçar a União Europeia

Francisco de Almeida Fernandes
Quatro dezenas de jovens participaram, durante quatro dias, numa maratona de debates e discussão sobre os desafios enfrentados pela União Europeia. A subida em flecha da inflação — que recuou ligeiramente, em agosto, para 9% —, o aumento dos custos de produção com impacto nos bolsos dos portugueses, a crise energética e o futuro do planeta marcaram a agenda do Summer CEmp 22, organizado pela representação portuguesa da Comissão Europeia. O município da Ribeira Grande, em São Miguel, Açores, serviu como pano de fundo para a interação entre universitários e políticos, jornalistas e membros de comunidades locais, como Rabo de Peixe, conhecida pela pobreza extrema dos seus habitantes. Que visão têm estes futuros líderes sobre a importância do projeto europeu em regiões ultraperiféricas?
“O impacto da União Europeia (UE) para as regiões ultraperiféricas não é suficientemente claro se pensarmos no cidadão médio”, aponta Tomé Ribeiro Gomes, de 29 anos. Doutorado em História, Estudos de Segurança e Defesa, Tomé é natural de Angra do Heroísmo e, por isso, conhece bem as dificuldades de viver, estudar e trabalhar numa ilha. Acredita que existe uma “distância que não é só geográfica”, mas que se reflete no afastamento de regiões como os Açores ou a Madeira da “governação” e que aumenta a desigualdade em relação ao resto do país e, ainda mais, à Europa. Porém, aponta o presidente da Associação Agrícola de São Miguel, o contributo da UE para o desenvolvimento do arquipélago é inquestionável e valorizado. “Não tínhamos os Açores da forma como são hoje se não fossem os apoios da UE”, afirma Jorge Rita.
Na agricultura, importante sector para a economia regional, os incentivos comunitários atribuem “ajudas adicionais” para as regiões ultraperiféricas, complementados com apoios do Governo do arquipélago. E a justificação é fácil de compreender. “As dificuldades da distância dos mercados, a orografia dos solos e a dispersão das ilhas” tornam “os custos de família, de sociedade e de produção” mais elevados. Apesar de dizer que “devemos muito à UE”, não deixa de sublinhar o que os Açores dão em troca — uma posição geoestratégica e uma dimensão territorial “fundamentais”. “Damos muito mais Europa à Europa pelo mar. A dimensão do mar dos Açores é a maior que a Europa tem em termos de mar”, lembra.
Todos a uma só velocidade
A cooperação, a prosperidade e a igualdade de oportunidades estão na origem da criação do projeto europeu, e para estes jovens continuam a ser valores que importa defender a todo o custo. Para isso são necessárias mais medidas locais, adaptadas aos desafios das diferentes comunidades, desde os custos proibitivos da habitação aos “salários dignos” que, dizem, continuam por aparecer. Os ordenados pouco “competitivos” em Portugal continuam, aponta Daniel Silva, de 24 anos, a contribuir “para a fuga de cérebros”. “Se não há como ter casa, não há quem fique”, lamenta.
No caso das regiões autónomas, a responsável pelo desenho dos fundos regionais da Comissão Europeia (CE), Sofia Colares Alves, acredita que “é mais claro [o contributo da UE] para o desenvolvimento” através das grandes obras e investimentos públicos. “Um investimento envolve e chega à comunidade”, afirma, e dá como exemplo o caso da fábrica de chá da Gorreana (ver caixa). Porém, continua a existir dificuldade na “comunicação dos fundos”, porque os políticos — nacionais, regionais e locais — atribuem “os problemas à Europa”, mas “os louros são os Estados-membros que os colhem”. Isto dificulta a perceção da importância, junto da população portuguesa e europeia, dos fundos comunitários.
Jorge Rita aponta ainda outro problema, o de uma Europa a várias velocidades. “Não pode haver a Alemanha e Portugal, os países do Norte e os do Sul. Tem de haver uma Europa de confederações em que todos se integrem”, pede.
Debate com universitários vai para discurso do “estado da união”
A resolução de muitos destes desafios, não apenas económicos, mas também ao nível do ambiente e da coesão social, está nas mãos de todos e em particular dos mais jovens. “Se as novas gerações perceberem que estamos a ouvir, haverá mais participação na construção das nossas políticas”, defende Elias Kuhn von Burgsdorff, redator dos discursos da presidente da CE, Ursula von der Leyen.
É preciso ter mais “fermento cívico” em Portugal para ter cidadãos a participar nas decisões políticas
Ele garante que, após o debate com os universitários, levará para “o discurso do estado da união” a “importância do local”. Participar nos atos eleitorais, nacionais e europeus, é essencial, consideram jovens e mentores. “Falta em Portugal mais fermento cívico”, diz Tomé Ribeiro Gomes.
Turismo e coesão
Sustentabilidade
Summer CEmp 22
Os Açores acolheram durante quatro dias o Summer CEmp 22, organizado pela representação da Comissão Europeia (CE) em Portugal, evento no qual o Expresso esteve presente. A ilha de São Miguel recebeu a escola de verão, que contou com 40 jovens universitários e mais de meia centena de oradores — locais, nacionais e europeus.
Textos originalmente publicados no Expresso de 2 de setembro de 2022
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