Na era do conhecimento acessível à generalidade da população, ainda há falta de informação sobre a saúde que prejudica o combate à epidemia de VIH/SIDA. Muito mudou nos últimos 41 anos desde a descoberta dos primeiros casos de doença causada pelo vírus da imunodeficiência humana, mas há coisas que se mantêm: o estigma, o medo e, sobretudo, a vergonha. Para combater a desinformação e contribuir para a literacia em saúde, o projeto Horizonte 2030, criado pelo Expresso com apoio da ViiV Healthcare, dedica esta semana à desconstrução de cinco dos principais mitos em torno da infeção.
Infeção VIH é exclusiva de homossexuais e toxicodependentes
Na década de 80, o medo da nova infeção por VIH e o desconhecimento que a acompanhava criou, na sociedade, preconceitos que ainda hoje, 40 anos depois, continuam a prejudicar o combate à epidemia. O vírus ficou associado à prática de sexo de homens com homens e mais tarde, na década de 90, aos utilizadores de drogas. Porém, esclarece Rosário Serrão, trata-se de uma ideia errada. “A verdade é que qualquer pessoa pode estar sujeita à infeção por VIH desde que haja relações sexuais não protegidas”, afirma a infeciologista do Hospital de São João, no Porto.
A especialista, que acompanha portadores do vírus, diz que “os homossexuais são muito mais cuidadosos e testam-se muito mais” do que os heterossexuais que, de uma forma geral, têm uma menor noção do risco. Aliás, os números oficiais mais recentes, publicados pela Direção-Geral da Saúde (DGS) em 2020, com dados referentes a 2019, mostram que uma elevada percentagem dos novos diagnósticos acontece na população heterossexual com mais de 50 anos. “Os diagnósticos nos heterossexuais são, normalmente, em pessoas com mais de 50 ou 60 anos, que são diagnosticadas num estadio mais avançado, porque nesta faixa etária não se pensa neste assunto”, atesta Rosário Serrão.
Desafio
Aumentar número de testes ao VIH na população em geral
Além da infeção por VIH servir como uma camada adicional de discriminação para homossexuais, transexuais e toxicodependentes, entre outros, o estigma tem um efeito perverso no que à prevenção diz respeito. Quando uma pessoa recorre aos cuidados de saúde com queixas de anemia ou infeções oportunistas, causadas pelo vírus, muitas vezes “não é posto em causa se se pode tratar de uma infeção por VIH”. Por outro lado, importa reforçar que os utilizadores de drogas acompanhados por centros de atendimento especializados são regularmente sujeitos à testagem.
Um dos grandes desafios para a redução de novos casos é, defendem as organizações de base comunitária e os infeciologistas, derrubar mitos como este e conseguir aumentar o número de testes na população em geral. “Temos uma percentagem elevada, cerca de 50%, de novos casos que são diagnosticados em pessoas já com late presenters [em fase avançada da infeção]”, aponta Rosário Serrão. A consequência é clara: quanto mais tarde é feito o diagnóstico, mais difícil é tratar a infeção. Por isso mesmo, os especialistas acreditam que todas as pessoas, independentemente do seu estilo de vida ou orientação sexual, devem testar-se pelo menos uma vez na vida.
Mas o problema também está nos médicos de família, apontou recentemente Margarida Tavares, infeciologista e coordenadora do Programa Nacional para as Infeções Sexualmente Transmissíveis e Infeção por VIH, num debate organizado pelo Expresso. “Também é um problema dos profissionais de saúde que não oferecem o rastreio tanto como deviam, e também porque não colocam esta hipótese de diagnóstico quando as pessoas vão aos cuidados de saúde”, lamentou.
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