Margarida Tavares: “Não é mais grave ter VIH do que ter diabetes”
O debate moderado pela jornalista da SIC Marta Atalaya contou com a presença de Dulce Salzedas (SIC), Sónia Dias (Escola Nacional de Saúde Pública) e, à distância, de Margarida Tavares (DGS)
José Fernandes
A diretora do programa nacional para esta área defende que o teste à infeção deve ser generalizado nos cuidados de saúde, mas reconhece desafios para implementar a estratégia. Esta foi uma das conclusões da segunda conferência Horizonte 2030, uma iniciativa do Expresso com apoio da ViiV Healthcare, que se realizou esta tarde
Francisco de Almeida Fernandes
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É justo dizer que a epidemia de VIH/SIDA foi vítima do sucesso das campanhas de sensibilização desenvolvidas na década de 90. A perceção é dos especialistas em saúde pública, que consideram que a população portuguesa perdeu a noção de risco associado ao VIH, uma ideia que vem sendo apoiada em dados como a diminuição de utilização do preservativo entre os mais jovens. “As mensagens que nos chegam são de sucessos terapêuticos enormes. Já não há medo da morte, de ficar muito magro ou de ficar com mazelas físicas”, afirma Dulce Salzedas, jornalista do Expresso especializada nos temas da saúde.
A jornalista participou na segunda conferência Horizonte 2030, uma iniciativa do Expresso com apoio da ViiV Healthcare, que promoveu o debate em torno do “Rastreio e Diagnóstico” e que contou com Margarida Tavares, responsável pelo Programa Nacional de VIH e Infeções Sexualmente Transmissíveis, e Sónia Dias, diretora da Escola Nacional de Saúde Pública. “Acho que é necessário transformar e adaptar a mensagem para a população”, aponta Dulce Salzedas.
Apesar de a infeção ser hoje “uma situação perfeitamente controlável e tratável”, Margarida Tavares vê na elevada taxa de diagnósticos tardios – quase 50% em 2019 – o maior inimigo do controlo da epidemia. As razões são muitas e de diferentes naturezas, considera a líder do programa nacional e infeciologista do Hospital de São João, mas podem resumir-se a três fatores principais – a ausência de perceção de risco entre heterossexuais e pessoas acima dos 50 anos; o estigma e a discriminação no acesso ao teste; e a falta de conhecimento e proatividade dos profissionais de saúde. “Os próprios profissionais de saúde têm preconceções de quem pode, ou não, estar em maior risco”, revela Sónia Dias, que justifica desta forma que os médicos nem sempre proponham a realização de rastreio.
Superar os obstáculos já identificados e melhorar a prevenção são condições essenciais para avançar no controlo da epidemia de VIH, que, segundo a Organização Mundial de Saúde, deverá ser suprimida até 2030. “Não é mais grave ter VIH do que ter diabetes”, lembra Margarida Tavares, que sublinha, porém, a importância do diagnóstico e, sobretudo, do tratamento.
Sónia Dias defende ser necessário apostar na formação e sensibilização dos profissionais de saúde para o VIH, de forma a que se sintam melhor preparados para propor a realização do teste de rastreio aos seus utentes
José Fernandes
Conheça, abaixo, as principais propostas das participantes desta conferência:
Mais e melhor informação
Mais do que promover campanhas de sensibilização com informação genérica dirigida a toda a população, Sónia Dias acredita ser mais eficaz combater “a desinformação” e esclarecer mitos em torno da infeção. “Por exemplo, na forma como se transmite. Isto é extremamente importante para aquilo que sabemos que são as grandes causas do estigma e da discriminação”, aponta.
Margarida Tavares concorda, mas confirma também a intenção do programa nacional que lidera em promover “exageradamente o teste nos cuidados de saúde”, procurando que a maioria dos utentes seja convidado a fazer o teste em algum momento.
Em complemento, será necessário contratualizar objetivos para o rastreio e prevenção do VIG com os centros de saúde, de forma a incentivar a promoção do teste. A formação dos profissionais de saúde, dotando-os de informação mais atualizada sobre a infeção e a doença, é igualmente visto como um passo fundamental.
Divulgar e oferecer a profilaxia pré-exposição aos grupos mais vulneráveis que considerem estar mais expostos ao risco deve fazer parte dos objetivos a atingir nos próximos anos. Esta é uma forma de prevenção eficaz que pode ajudar a evitar a contração da infeção. “Ainda existem profissionais de saúde que não sabem o que é, que acham que é uma loucura. Isto não pode continuar a acontecer”, avisa Margarida Tavares.
Na segunda conferência, realizada a 12 de julho, os especialistas debateram o tema do "Rastreio e Diagnóstico" do VIH. Pode ouvir o debate na íntegra no podcast em baixo.
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