22 maio 2014 8:39

Ricardo Salgado diz que "a crise bateu forte e bateu no grupo"
alberto frias
Ricardo Salgado afirma que "todos nós cometemos erros" no Grupo Espírito Santo. Se cai um, caem todos?
22 maio 2014 8:39
"Nós cometemos erros, todos nós cometemos erros e eu assumo que o grupo cometeu erros, mas erros provocados pela nossa estrutura e organização no topo, à qual deveríamos ter prestado mais atenção". Está explicada a "defesa" de Ricardo Salgado, homem forte do império Espírito Santo. A responsabilidade não é individualmente sua, mas coletiva dos órgãos de gestão do GES; e os problemas detetados na auditoria aconteceram sem que Salgado o soubesse.
A resposta é dada numa longa entrevista publicada esta manhã no "Jornal de Negócios", em que o presidente executivo do Banco Espírito Santo começa por dizer: "Eu assumo que também sou responsável". A frase tem duas partes essenciais. Uma é "sou responsável"; a outra é "também".
Além de Ricardo Salgado, também José Maria Ricciardi, José Manuel Espírito Santo e Manuel Fernando Espírito Santo são ou foram nos últimos anos administradores simultaneamente das áreas financeira e não financeira do grupo Espírito Santo.
Em causa estão irregularidades nas contas da Espírito Santo International, que foram detetadas numa auditoria realizada pela KPMG a pedido do Banco de Portugal, informação que foi divulgada na noite de terça-feira no prospeto de aumento de capital do Banco Espírito Santo. A ES International é uma holding de topo na estrutura do império Espírito Santo, que concentra as participações na área financeira (o BES) e na área não financeira (a Rio Forte). Os problemas agora detetados estão no GES, não no BES.
O banqueiro explica que "a crise bateu forte e bateu no grupo", o que obrigou os gestores a concentrarem-se no sector financeiro "e a uma menor atenção na área não financeira".
"De repente os problemas desabam e apanham-nos desprevenidos e despreparados para fazer face a essa situação". E isso acontece, adita Salgado, por causa da "dispersão enorme de atividades e de holdings, muitas delas no Luxemburgo, da área não financeira, em Portugal, América Latina, os EUA e um pouco em África."
Perante "uma estrutura extremamente frágil, administrativa, contabilística e financeira", Ricardo Salgado acaba por responsabilizar o responsável pela contabilidade da ES International, que entretanto se demitiu.
O desvio nas contas foi detetado aquando da auditoria do Banco de Portugal às contas do grupo, no âmbito do ETICC, que visava medir a exposição de crédito nos bancos a grandes clientes e partes relacionadas. "Quando se dá o exercício do ETRICC nós viemos a perceber que havia uma parta da dívida que não estava contabilizada".
Um por todos, todos por um?
Além do papel do contabilista (ou commissaire aux comptes, na terminologia luxemburguesa, onde estão sediadas as "holdings em causa"), que entretanto se demitiu, Ricardo Salgado alarga a responsabilidade a toda a gestão da ES International. "A responsabilidade existe ao nível do Conselho de Administração da ES International. Ela está lá e não há nada a fazer", diz ao "Negócios". O banco "não sabia que havia uma enfermidade ao nível da ES International. Não sabia", garante Salgado. "Houve uma negligência grave. Dolo acho que não. E uma coisa que a KPMG apurou é que também não houve desvios de dinheiros".
"Eu assumo que também sou responsável", afirma o presidente do Banco Espírito Santo, que inclui diretamente os demais ramos da família, todos envolvidos na gestão de empresas do grupo. "Faço parte de um grupo familiar. E os cinco grupos familiares em torno da ESI [os cinco ramos da família Espírito Santo], todos nós somos responsáveis e sou solidário com o grupo com certeza. Agora, o que posso dizer é que a minha vida começa às 8h30 no banco e acaba às 10 da noite no banco". Ou seja, o dia a dia de Salgado não passa pelo GES, só pelo BES. "Pessoalmente, as consequências que eu tiro é que partilho da solidariedade ao nível do conselho de administração da ES International".
"Não acho que me devia demitir", responde Ricardo Salgado ao "Jornal de Negócios". "A minha função é 100% no sector financeiro".