16 janeiro 2009 11:10
Carlota Perez, investigadora no SPRU em Inglaterra, especialista em ciclos longos tecnológicos e no papel do capital financeiro, fala de um ponto de viragem que se estará a viver nesta crise global. A prioridade deverá estar nas políticas de massificação da Revolução da Informação.
16 janeiro 2009 11:10
"Estamos num ponto de viragem", afirma-nos Carlota Perez, investigadora venezuelana no Centro de Análise de Políticas da Área Financeira da Escola de Negócios da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. E acrescenta: "Se a história servir de referência, estamos a meio do caminho na Revolução da Informação".
Ao fim de trinta anos, o que a especialista em ciclos tecnológicos chama de "período de instalação" da Sociedade da Informação e do Conhecimento esgotou-se. A sua crise de 'limpeza' ocorreu com a derrocada do Nasdaq (a bolsa tecnológica de Nova Iorque que foi inspirada pelo hoje tristemente famoso Bernard Madoff) em 2000.
O que estamos, agora, a viver é a passagem para um período de massificação (de "desdobramento", na expressão usada pela investigadora) da Revolução da Informação. Finalmente, estaremos a chegar à "idade de Ouro" do que o futurista Alvin Tofler baptizou de 'Terceira Vaga'.
O que deixa uma nota de optimismo na paisagem recessiva actual. Há luz ao fundo do túnel da crise global actual. Um aspecto que já referia Brian Berry, outro especialista em ciclos longos, na entrevista que nos concedeu no ano passado.
Prepare já hoje o Dia Seguinte à Crise procurando as oportunidades que esta massificação da sociedade da informação e do conhecimento ainda tem para oferecer.
Mas, essa passagem - que está a ser e continuará dolorosa por algum tempo - é facilitada se os decisores políticos navegarem na direcção certa, acentua Carlota Perez.
Duas condições políticas
A transição com êxito de fase tem, no entanto, duas exigências, segundo esta investigadora do Centro inglês de Investigação sobre Políticas Científicas e Tecnológicas da Universidade de Sussex, mais conhecido pelo seu acrónimo SPRU.
Primeira exigência: proceder a "uma recomposição institucional" que coloque o capital produtivo no posto de comando da criação de riqueza, devolvendo, em simultâneo, ao capital financeiro o seu lugar de "facilitador da economia real". Neste ponto, Carlota Perez recorda uma galeria de economistas célebres que defende essa posição política de subordinação da finança à economia real empreendedora: Joseph Schumpeter (que colocava no centro do capitalismo o empreendedor e o capital produtivo), Thorstein Veblen, A.C. Pigou e John Maynard Keynes (muito actual, "The Grand Slump of 1930", publicado em Londres em Dezembro de 1930).
Segunda exigência: investir na direcção certa, na massificação da infra-estrutura tecno-económica do actual ciclo tecnológico. É esse investimento de emergência que terá, a médio e longo prazos, o principal efeito multiplicador.
Estes eram os conselhos de Perez em 2003 quando escreveu o livro 'Technological Revolution and Financial Capital: The Dynamics of Bubbles and the Golden Age', cujo epílogo era um manifesto sobre o ponto de viragem.
A economia de casino depois de 2000
Contudo, o caminho seguido pelos decisores políticos após o "crash" do NASDAQ, particularmente na potência mundial dominante, os EUA, foi outro. Instigou-se um divórcio entre o capital financeiro e o capital produtivo num momento crucial. O que foi privilegiado foram as "práticas de economia de casino" que geraram uma nova bolha financeira nos anos 2000.
Mas, agora, "este segundo episódio" - a "bolha" do imobiliário e dos derivados financeiros - tem uma diferença fundamental em relação à euforia do Nasdaq: a bebedeira de crédito não esteve ligada ao parto de nenhum novo tecido económico, mas sim de um sistema financeiro fictício que hoje vale 15 vezes a economia real mundial e que é, pela primeira vez, globalizado.
Um tal erro político só poderia conduzir a um novo colapso e uma recessão ainda mais profunda e globalizada. Situação que só se alterará, diz Perez, quando os reguladores políticos restaurarem a confiança recolocando o acento tónico na criação de riqueza real ligada à Sociedade da Informação e do Conhecimento.
Corrigir o tiro
"O objectivo político saudável não é controlar a finança mas guiá-la no sentido de estar ao serviço da produção", sublinha a nossa entrevistada. Quando este paradigma básico for reposto, entraremos numa "fase de sinergia" que poderá permitir um crescimento sustentável durante mais duas a três décadas.
Artigo actualizado e ampliado a partir da versão original publicada na edição em papel de 10/01/09