Economia

Vai comer um chocolate? "Por trás da maioria das tabletes há uma alta probabilidade de haver injustiça", alerta ONG

Vai comer um chocolate? "Por trás da maioria das tabletes há uma alta probabilidade de haver injustiça", alerta ONG
Camille Delbos/Art In All of Us/Getty images

No Dia Mundial do Comércio Justo, a Oxfam Intermón alerta para o lado mais negro do chocolate. Recorda que quem o produz ganha menos do que aquilo que vai pagar por uma tablete

Sabia que 90% dos produtores de cacau do Gana, o segundo maior produtor mundial, não ganham para satisfazer as suas necessidades básicas enquanto os lucros da indústria do chocolate aumentam? O alerta é da Oxfam Intermón, uma ONG com sede em Espanha citada pelo jornal El Pais num artigo sobre o lado mais negro do cacau com o título “A que sabe o cacau? A injustiça, respondem no Gana”.

Na verdade, um relatório da ONG divulgado para assinalar o Dia Mundial do Comércio Justo, que se celebra este sábado, indica que muitos produtores sobrevivem com cerca de um euro por dia, o preço de um pequeno chocolate em Espanha ou Portugal, e viram os seus ganhos caírem 16% desde 2020 enquanto as quatro maiores empresas produtoras de chocolate do mundo – Hershey, Londt, Mondelez e Nestlé - registaram lucros de 15 milhões de dólares (13,7 milhões de euros) nas suas subsidiárias ligadas ao cacau.

Assim, será mais fácil perceber porque é que o presidente do Gana, Nana Akufo-Addo, numa visita a Berna, em 2021, surpreendeu o mundo ao anunciar que ia deixar de vender o seu cacau à Suíça, o maior cliente do país, e estimular a produção nacional de chocolate, numa tentativa de contornar um sistema que privava o seu país da “prosperidade”, recorda a jornalista Beatriz Lecumberri antes de referir que o governante não conseguiu cumprir os seus planos e os produtores de cacau do Gana estão cada vez mais pobres, apesar dos lucros da indústria do chocolate continuarem a crescer.

“Há muitos intermediários e não controlamos nada”, diz Leticia Yankey, uma produtora local, citada pelo El País. “Nos, produtores, precisamos de mais educação e treino. Temos de saber fazer-nos ouvir, em especial porque vemos o preço do cacau a subir no mercado e temos cada vez menos dinheiro no bolso”, afirma.

Seca ameaça piorar vida dos produtores

No primeiro trimestre do ano, o preço da tonelada de cacau subiu e supera, atualmente, os 2.600 euros, enquanto a produção no Gana está em queda devido à seca que anuncia o risco de um problema maior: as alterações climáticas ameaçam reduzir em 40% os terrenos para o cultivo de cacau no país até 2050. E todos os custos de produção subiram, do transporte aos fertilizantes ou mão-de-obra.

Com uma produção estimada de 750 milhões de toneladas na campanha de 2022 –2023, o Gana responde por 15% da produção mundial de Cacau, mas recebe apenas 1,5% dos 120 mil milhões de euros que a indústria do chocolate movimenta anualmente. “Por trás da maioria das tabletes de chocolate que compramos há uma alta probabilidade de haver injustiça social”, afirma Juanjo Martinez, responsável da Oxfam Intermón pelo Comércio Justo, citado pelo jornal espanhol.

As grandes empresas, diz, querem apenas saber a origem do Cacau. “Compram a exportadores e o que aconteceu antes não parece preocupa-las demasiado”, critica.

UE é o maior importador

Dos vários fabricantes contactos pelo diário sobre o tema, apenas a Lindt & Sprungli respondeu, assegurando que “apoia os esforços” de países como o Gana para melhorar as condições de vida dos produtores de cacau e dedica 55 euros por cada tonelada comprada ao desenvolvimento comunitário e a programas de sustentabilidade.

A União Europeia é o principal importador de cacau do mundo, absorvendo 60% das exportações, mas apenas 1% a 2% do chocolate consumido na Europa tem a etiqueta de “comércio justo”, destaca o relatório da Oxfam.

A ONG reconhece que o quadro melhorou na última década e várias empresas de peso no sector lançaram programas de sustentabilidade para ajudar os agricultores a produzir mais e a aumentar os rendimentos. “Houve campanhas de informação e o consumidor está mais alerta”, admite Juanjo Martinez antes de concluir: “Tudo isto é positivo, mas a nossa investigação mostra ser insuficiente”.

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