Apesar dos esforços das autoridades fiscais na adoção de mecanismos que dificultem o recurso, pelas grandes multinacionais, a esquemas de planeamento fiscal que promovem a erosão da base tributária e a transferência de lucros para jurisdições mais favoráveis, novos dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) mostram que a elisão fiscal permanece uma ameaça.
A prevalência de estratégias assentes na transferência de lucros e erosão da base tributável (BEPS, na sigla em inglês) impõem a “adoção rápida de uma reforma internacional”, faz notar a OCDE, a propósito da 4ª edição do relatório sobre impostos empresariais, divulgada esta quinta-feira, dia 17.
“A informação mais recente destaca os riscos contínuos de BEPS e a necessidade de se aplicar a solução dos ‘dois pilares’ para garantir que grandes empresas multinacionais paguem uma parcela justa de impostos onde quer que operem e obtenham os seus lucros”, indica em comunicado a organização.
Em julho de 2021, mais de 135 países que integram o Quadro Inclusivo BEPS da OCDE/G20 chegaram a um acordo preliminar (Portugal incluído) de adoção de soluções, de âmbito internacional, para fazerem face aos desafios fiscais com a digitalização e globalização da economia mundial.
Essas respostas estão enquadradas nos pilares 1 e 2, em que o primeiro prevê a tributação de uma parte do rendimento pelas jurisdições onde as grandes multinacionais têm os seus utilizadores ou clientes finais e o segundo pretende acautelar que os resultados destas companhias estão sujeitos a um nível mínimo de tributação efetiva, não inferior a 15%.
Nestas estatísticas anuais sobre os impostos que incidem sobre as empresas, a OCDE abrangeu mais de 160 países e jurisdições e incluiu dados de quase 7 mil multinacionais, o que “representa um grande impulso nos esforços de transparência fiscal”, faz notar a instituição.
Segundo a OCDE, em média, as receitas por funcionário obtidas pelas empresas em jurisdições com um imposto empresarial nulo é de dois milhões de dólares, por comparação com apenas 300 mil dólares em territórios em que o IRC fica acima deste patamar.
Além disso, observou-se que em países que dão grandes benesses ao investimento, as receitas declaradas por filiais representam 35% do negócio global, enquanto a participação média na faturação dos grupos empresariais por parte de subsidiárias localizadas em jurisdições de alta, média e baixa tributação é de cerca de 15%. “Embora estes efeitos possam refletir estratégias comerciais, muito provavelmente indicam a existência de BEPS”, sinaliza a OCDE.
Os dados, agora publicados, mostram também que o IRC “permanece uma fonte de receita importante para a maioria dos países, especialmente para as economias em desenvolvimento e emergentes”. Em média, o IRC representa uma fatia maior do total de impostos em África (18,8%), Ásia e Pacífico (18,2%) e América Latina e Caribe (15,8%), por comparação com os países da OCDE (9,6%).
“Após décadas de cortes nas taxas legais de IRC, os novos dados apontam para uma estabilização das taxas de IRC em 2022, com algum estreitamento das bases tributárias em 2021, à medida que os países procuram encontrar um equilíbrio entre o aumento da receita e o incentivo ao investimento”, indica ainda o relatório.
Por outro lado, a estabilização das taxas de IRC também pode ser uma resposta aos desafios fiscais enfrentados pelos governos após a pandemia de Covid-19. A taxa nominal de imposto média para todas as jurisdições analisadas foi de 20% em 2022, o mesmo valor apurado para 2021 e que compara com os 28% registados em 2000.
A OCDE refere ainda que “há alguma evidência de que os governos têm usado o IRC para tentar impulsionar a recuperação económica, incentivando o investimento, em particular, em Investigação e Desenvolvimento (I&D)”. O que tem contribuído para estreitar as bases tributárias, fruto de ‘subsídios’ fiscais mais generosos, o que aconteceu em 65 jurisdições em 2021, contra 57 países em 2019.
Além disso, verifica-se, igualmente, uma maior “generosidade” dos benefícios fiscais para I&D em 2020 e 2021 em vários países da OCDE e Estados-membros da União Europeia, após o início da pandemia.
Portugal entre os que promoveram maiores descontos no IRC
Entre 77 jurisdições analisadas em 2021, 65 ofereceram descontos fiscais significativos, o que significa que os investimentos nessas localizações ficaram sujeitos a taxas médias de imposto abaixo do IRC.
Portugal encontra-se nesse grupo, em que, em média, a redução do IRC foi de 1,6 pontos percentuais (p.p.). Em 2021, indica a OCDE, as maiores descidas foram em Malta (6,6 p.p.), Itália (6,5 p.p.), Portugal e Reino Unido (ambos com 6,4 p.p.), Turquia (4,2 p.p.) e Polónia (3,5 p.p.).
Recorde-se que, em Portugal, existe o Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE) que é o mais reconhecido regime de apoio fiscal em sede de IRC. Segundo os últimos dados da Agência Nacional de Inovação, citados pelo ‘Jornal de negócios’ ao longo de 16 anos, o SIFIDE atribuiu mais de 3.376 milhões de euros de créditos fiscais a 5.137 empresas.
Entretanto, o Governo está a proceder a alterações neste benefício em diploma próprio, ou seja, fora do Orçamento do Estado para 2023.
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