O Banco de Inglaterra viu-se obrigado, na quarta-feira, a intervir no mercado obrigacionista com um programa de compras de 65 mil milhões de libras (cerca de 75,3 mil milhões de euros ao câmbio atual) para evitar que a queda dos preços das “gilts” levasse ao colapso de fundos de pensões no Reino Unido.
É mais um efeito das medidas propostas pelo novo governo britânico de Liz Truss que visam estimular o crescimento económico através de cortes de impostos e de investimento massivo financiado através de um forte crescimento no endividamento. O banco central britânico anunciou na quarta-feira um programa que iria abranger dívida britânica de longo-prazo, que estava a desvalorizar fortemente, numa “reavaliação que se tornou mais significativa no último dia [terça-feira]”, disse o banco no comunicado.
Se se agravasse, “haveria um risco material para a estabilidade financeira do Reino Unido”, o que “levaria a uma contração indesejável das condições financeiras e uma redução do crédito à economia real”. O banco central vai adquirir 5 mil milhões de libras (5,8 mil milhões de euros) em obrigações com maturidade superiores a 20 anos, por cada dia útil, até 14 de outubro.
De acordo com a Bloomberg, o Banco de Inglaterra teve de entrar em jogo para evitar que fundos de pensões tivessem de, perante a perda de valor das obrigações de longo-prazo, entrar com colateral para compensar esses montantes.
O Banco de Inglaterra fora avisado por gestores de fundos desta possibilidade, de serem desencadeadas as chamadas margin calls (valores de cobertura adicionais), e de se criar um ciclo vicioso de fundos porem à venda obrigações de longo-prazo para se livrarem da perspetiva de terem de cobrir capital em falta, pressionando ainda mais os preços.
Situação agravada nos fundos de pensões que seguem uma estratégia de investimento com base nas responsabilidades existentes (liability-driven investment strategies, ou LDI), que obrigam a garantias para o cumprimento dos pagamentos face aos ativos existentes.
O Financial Times cita um banqueiro londrino a dizer que, na manhã de quarta-feira, não havia compradores de obrigações soberanas britânicas de longo-prazo naquele que podia ter sido um “momento Lehman”.
E cita a gestora de estratégias LDI de 30 fundos de pensões britânicos, a Cardano Investment, que diz que se não tivesse havido uma intervenção do banco central na quarta-feira, a rendibilidade das obrigações teria disparado para até 8% face a 4,5% e 90% dos fundos de pensões britânicos não teriam colateral.
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