Economia

Organização Internacional do Trabalho: sector automóvel português suscita preocupações

Foto: Autoeuropa
Foto: Autoeuropa

O país corre o risco de perder para localizações mais centrais com os modelos elétricos e híbridos, considera a OIT

As caraterísticas do sector automóvel português suscitam preocupações por estar num segmento da cadeia de baixo valor acrescentado, correndo risco de perder para localizações mais centrais com os modelos elétricos e híbridos, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Estas são conclusões do estudo “Indústria automóvel em Portugal, desafios para o futuro do trabalho”, realizado pela OIT, a pedido do Governo português, e que foi apresentado publicamente esta terça-feira.

“O sector automóvel português é caracterizado por um controle de custos através da supressão salarial, de baixo investimento na subida na cadeia, de um conteúdo relativamente elevado de elementos importados nas exportações” e por uma elevada dependência em tecnologias assentes em motores de combustão, o que podem considerar-se obstáculos a um crescimento maior e mais equitativo, indica a OIT, considerando que tais características “suscitam preocupações” de que possa estar preso num segmento da cadeia de baixo valor acrescentado.

Outro dos obstáculos a esse crescimento está na “elevada proporção de participação estrangeira nas empresas”, refere a OIT, defendendo que a forma de quebrar este ciclo e proteger o papel do setor como grande empregador (com cerca de 45 mil trabalhadores) passa por uma estratégia “coerente de políticas públicas” que apoiem o setor e “vontade, na indústria, de tornar Portugal um local atrativo para a produção de veículos descarbonizados”.

O documento lembra que Portugal beneficiou inicialmente de uma reestruturação da indústria automóvel que foi suportada pela externalização de atividades e “pela procura de oportunidades de poupança de custos na montagem e no fabrico de componentes” o que levou a um crescimento “particularmente forte” do setor desde os anos de 1990.

Na caracterização do sector é referido o controle de custos através de “supressão salarial”, o “baixo investimento na subida na cadeia de valor” e o conteúdo relativamente elevado de elementos importados nas exportações, o que “suscita preocupações” quanto ao facto de o “sector estar aprisionado” num segmento da cadeia de abastecimento de baixo valor acrescentado.

Em paralelo, a crescente flexibilidade exigida pelos regimes de produção otimizada “tem o seu corolário na segmentação da força de trabalho da indústria automóvel”, lê-se no estudo, apontando, que “a tendência de aumentar a dependência de trabalhadores temporários para responder aos picos de procura no ciclo económico é prevalecente entre algumas profissões em Portugal”.

“No contexto europeu, a posição periférica de Portugal tem sido sustentada por uma desvalorização salarial cumulativa e por baixas taxas de investimento, em contraste com os seus concorrentes da ECL [Europa Central e de leste]”, refere o documento, salientando que “a integração de Portugal na rede global de produção automóvel tem sido impulsionada pelo IDE [Investimento Direto Estrangeiro], atraído pelos baixos custos e pela disponibilidade de mão-de-obra qualificada”.

Desta forma, sustenta o documento, o futuro do sector automóvel português é frequentemente traçado de acordo com a sua capacidade de manter e atrair IDE, sendo que “ a tecnologia e a eletrificação poderão fazer com que a produção e os empregos do setor voltem a situar-se em localizações centrais, bem como aumentar a importância relativa das atividades de pré e pós-produção concentradas nestas regiões centrais”.

Assim, com a eletrificação em ascensão, “a dependência portuguesa da supressão de custos está condenada a tornar-se menos relevante, uma vez que o fabrico de veículos elétricos é menos intensivo em mão-de-obra do que o de veículos movidos a tecnologia de motores de combustão interna”, o que “suscita preocupações quanto à forma como as mudanças por parte dos OEM [Fabricantes de Equipamento de Origem] irão afetar o sector em Portugal”, avisa a OIT.

Perante o contexto de incerteza em que o sector opera – incerteza tecnológica, mudanças nos incentivos e na regulamentação ambiental, disrupções nas cadeias de abastecimento a nível global, entre outros fatores -, o estudo tipificou quatro cenários potenciais de evolução futura que visam servir de base à reflexão em torno das estratégias que melhor poderão apoiar o setor a navegar este contexto de mudança e a alcançar melhores resultados ao nível do emprego.

A condução do sector na direção do cenário mais favorável deverá, defende a OIT, ter em conta políticas que promovam um crescimento económico intensivo em emprego, apoio às empresas para que estas consigam navegar a dupla transição, proteção dos trabalhadores tanto na facilitação de transições no mercado de trabalho como através da proteção social e promoção do diálogo social.

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