O Tribunal de Justiça da União Europeia anulou a decisão de Bruxelas sobre a ajuda do Estado português à TAP. Mas o efeito do acórdão da sentença foi suspenso por, pelo menos, dois meses, e por isso a TAP não é obrigada a devolver já os 1,2 mil milhões de euros.
A Comissão Europeia terá agora de adotar uma nova decisão, corrigindo a fundamentação que sustenta a autorização do apoio. A decisão do Tribunal de Justiça cria alguma perturbação, admitiu ao Expresso fonte conhecedora das regras da Concorrência Europeia, admitindo porém que a Comissão Europeia encontrará uma forma de responder e corrigir a situação, respondendo às questões levantadas pelo Tribunal.
"A decisão da Comissão que declara o auxílio de Portugal a favor da companhia aérea TAP compatível com o mercado interno é anulada por não estar suficientemente fundamentada”, informa o Tribunal Geral (primeira instância) em comunicado de imprensa, citado pela Lusa.
Apesar da decisão “os efeitos da anulação - entre os quais a recuperação do auxílio - são suspensos enquanto se aguarda uma nova decisão”, diz o Tribunal. Se não houvesse este efeito suspensivo, a TAP ver-se-ia obrigada a devolver de imediato os 1,2 mil milhões de euros, o que levaria à insolvência da companhia.
A decisão do Tribunal da Justiça decorre do recurso feito em julho de 2020 pela transportadora aérea de baixo custo Ryanair contra a ajuda estatal à TAP, com a argumentação de que o apoio do Estado português viola o tratado europeu e as regras concorrenciais. A Ryanair fez queixa contra várias companhias aéreas europeias.
Aliás esta quarta-feira o Tribunal de Justiça avançou com uma sentença idêntica em relação à holandesa KLM, que teve uma ajuda estatal de 3,4 mil milhões aprovada por Bruxelas. O Tribunal também determinou a anulação do aval por “insuficiência de fundamentação”.
A Ryanair contesta o apoio estatal de 1,2 mil milhões de euros, já injetado na companhia em 2020. Considera que se trata de um apoio ilegal, que desrespeita a regras da concorrência europeia. Michael O´Leary, presidente executivo da Ryanair, tem criticado duramente a ajuda do Estado à TAP.
Tratando-se de uma decisão de primeira instância, as partes ainda podem recorrer para o Tribunal de Justiça da UE.
O Tribunal de Justiça dá dois meses para o efeito suspensivo da devolução, com possibilidade de alargamento do prazo. "A suspensão dos efeitos da anulação não pode exceder dois meses a contar da data da prolação do acórdão. Se, pelo contrário, a Comissão decidir dar início ao procedimento formal de exame, a suspensão manter-se-á durante um período suplementar razoável", lê-se no comunicado de imprensa do Tribunal de Justiça.
Falhas de fundamentação da Comissão
"Como fundamento do seu recurso de anulação, a Ryanair invocava, nomeadamente, uma violação do dever de fundamentação por parte da Comissão, na medida em que não expôs as razões que a levavam a considerar a medida notificada compatível com o mercado interno", refere o comunicado. E o Tribunal deu-lhe razão, considerando que a Comissão falhou na fundamentação da decisão.
O Tribunal salienta que há três requisitos cumulativos que permitem autorizar o apoio a empresas em dificuldade compatível com as regras do mercado interno. A Comissão tem, diz o Tribunal, de examinar, "em primeiro lugar, se o beneficiário do auxílio faz parte de um grupo em dificuldades; em segundo lugar, se as dificuldades com que o beneficiário [a TAP] se depara lhe são específicas e não resultam de uma afetação arbitrária dos custos no âmbito do grupo e, em terceiro lugar, se essas dificuldades são demasiado graves para serem resolvidas pelo próprio grupo".
Estes requisitos, explica, o Tribunal, "destinam-se a impedir que um grupo de empresas faça o Estado suportar o custo de uma operação de emergência de uma das empresas que o compõem, quando essa empresa esteja em dificuldade e o próprio grupo esteja na origem dessas dificuldades ou tenha os meios para as enfrentar por si próprio".
À luz destes esclarecimentos, o Tribunal Geral salienta que, na decisão impugnada, a Comissão não examinou, não fundamentou, nem respondeu adequadamente a estas questões. Por exemplo, não especificou se "as dificuldades do beneficiário [TAP] lhe eram específicas e não resultavam de uma afetação arbitrária dos custos em benefício dos seus acionistas ou de outras filiais".
A Comissão, salienta o Tribunal, "limitou-se a prestar esclarecimentos sobre a situação financeira do beneficiário e sobre as dificuldades causadas pela pandemia de Covid-19".