A Associação de Empresas de Trabalho Portuário de Lisboa (A-ETPL), dedicada à cedência de mão-de-obra às sete empresas de estiva do Porto de Lisboa, vai pedir a insolvência devido à situação financeira em que se encontra. O anúncio surge em cima de uma greve de três semanas dos estivadores em protesto contra salários em atraso e incumprimentos de acordos celebrados e vai traduzir-se em novas formas de luta, garante ao Expresso fonte sindical.
"A A-ETPL, reunida em assembleia geral, decidiu pedir a insolvência da associação, face à situação financeira em que esta se encontra e face à impossibilidade de encontrar soluções para a sua viabilização com o sindicato representante dos trabalhadores", refere um comunicado divulgado quinta-feira pela empresa que em janeiro já tinha desafiado o Seal a aceitar uma redução salarial de 15% e a eliminar as progressões de carreira automática.
A fundamentar esta proposta, a A-ETPL que tem sete empresas de estiva associadas, seis das quais afetas aos dois maiores grupos económicos do Porto de Lisboa - Yilport (3) e ETE (3) - alegava a situação difícil da empresa, “à beira da falência técnica”, depois de fechar 2019 com um prejuízo de meio milhão de euros, adiantou, então, Diogo Marecos, do grupo Yilport, ao Expresso.
Mas a versão do sindicato é diferente e refere a aposta, desde o início, no facto de a A-ETPL procurar “uma situação de pré-insolvência”. Falando de “incumprimento dos acordos assinados, o não pagamento atempado dos salários, a apresentação de propostas inaceitáveis aos trabalhadores e os sucessivos desvios de cargas para outras portos nacionais”, o SEAL, Sindicato dos Estivadores e Atividade Logística, fala mesmo de “desvio de cargas em território nacional, por razões que, provavelmente, visam apenas a destruição da organização do trabalho tal como existe e aumentar ainda mais os níveis de precariedade nos portos nacionais, como hoje nos foi proposto, com a passagem de 34 trabalhadores efetivos a contratos precários”.
E deixa uma nova hipótese de leitura do que se passa em Lisboa e na A-ETPL no ar. “Considerando que os acionistas turcos da Yilport até anunciaram a disponibilidade para investir 122 milhões de euros no Porto de Lisboa e que estão em negociações para prorrogação do prazo de concessão do terminal de Lisboa, estarão a utilizar o conflito com os trabalhadores para exigir ao Governo taxas mais baixas, alegando que há muitas greves e poucas cargas no porto de Lisboa?”, questiona.
Aliás, no início de fevereiro, o SEAL, como noticiou o Expresso, disse não ter dúvidas de que “A A-ETPL tem sido objeto de uma gestão ao longo dos anos (…) subsumível no conceito de “gestão danosa”, sendo agora claro que o trabalho prestado pelos trabalhadores da AETPL, que há 17 meses têm salários em atraso, tem servido para as empresas tirarem benefícios financeiros diretos, sem que estas suportem os custos reais de tal trabalho”.
Assim, o SEAL mandatou o seu departamento jurídico para acionar as empresas por valores em dívida aos trabalhadores que, só no Porto de Lisboa, atingem vários milhões de euros, e vai estudar a possibilidade de accionar, civil e criminalmente, os membros da direção da AETPL e os sócios/únicos clientes. Porquê? “Pelo facto de terem permitido que esta os beneficiasse enquanto obteve lucros e que agora não estão na disposição de repor o equilíbrio financeiro através do pagamento dos custos reais do trabalho que lhes é prestado pelos trabalhadores da A-ETPL"
Nos termos da greve convocada para Lisboa, de 19 a 28 de fevereiro, os estivadores só trabalham para a Liscont, Sotagus e Multiterminal (do grupo Yilport) e a TMB (Terminal Multiusos do Beato) no segundo turno, e de 29 de fevereiro a 9 de março não haverá qualquer prestação de trabalho para essas empresas. Estrategicamente, o SEAL deixou automaticamente de fora o grupo ETE, uma vez que o seu representante não subscreveu a carta da A-ETPL, o que interpreta como sinal de "futura boa fé negocial".
Agora, os estivadores garantem estar decididos a discutir novas formas de luta em defesa dos seus direitos e postos de trabalho e já estão a preparar o seu plano de ação para o futuro.
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