Economia

Portugal tem de “atrair mais e qualificar mais”

18 novembro 2019 17:18

inês duque

Projetos Expresso. Escassez de recursos humanos, sazonalidade e aeroporto de Lisboa são as grandes questões para o futuro do turismo

18 novembro 2019 17:18

Se estiver num espaço público, decerto já não achará estranho se ouvir alguém falar em estrangeiro. Até mesmo em sua casa, diga-se, se estiver a receber uma pessoa em alojamento local. Ou Portugal não estivesse há uns anos a esta parte a bater recordes históricos no que toca a visitas turísticas. Só que, atingida a parte do crescimento, chega agora a parte complicada. Manter e dar bases de sustentabilidade para que os números (e visitantes, já agora) não se evaporem e continuem a dar um contributo para a economia que, em 2018, representou 19,1% da riqueza produzida, segundo dados do World Travel & Tourism Council.

Dados que apontam Portugal como o quinto país onde é mais forte a contribuição do turismo para o PIB, neste caso 8,2%. “Continuamos na mente das pessoas”, atira Cristina Siza Vieira. “Atingimos a posição de destino de primeira linha” e, agora, manter esse lugar “exige um acompanhamento constante”, garante a diretora executiva da Associação da Hotelaria de Portugal. A responsável fez parte dos comités técnicos de avaliação do Prémio Nacional de Turismo, a distinção que junta Expresso e BPI para reconhecer os melhores exemplos nacionais do sector — cujos finalistas em cada uma das áreas pode conhecer na caixa do lado direito —, e acredita que estamos a viver as dores de crescimento habituais. O passo seguinte é perceber como capitalizar melhor as 66 milhões de dormidas que se registaram em 2018, segundo a 14ª Edição do Atlas da Hotelaria da Deloitte. Os próximos dois anos, “a começar já”, vão ser de “abrandamento mais acentuado”, e os desafios estão identificados.

“Temos de perceber que não vamos continuar a crescer nos dois dígitos”, avança Luís Araújo, num sentimento ecoado pelos principais atores do sector relativamente ao abrandamento do crescimento. Para o presidente do Turismo de Portugal, entre as grandes questões que podem fazer a diferença entre definir o sector como uma história de sucesso sustentado ou uma estrela cadente, a gestão de recursos humanos surge como uma luta fulcral pelo talento disponível. “Temos de atrair mais e qualificar mais” para melhorar a qualidade dos serviços, com a meta de “aumentar os salários”. E uma certeza: “Isto é uma maratona” para fazer “com que o turismo seja a primeira opção e não a segunda.”

Estrangulamento
Já o presidente do Grupo de Sector dos Restaurantes da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal, Antero Jacinto, não tem dúvidas de que “o principal desafio é a crescente dificuldade em encontrar recursos humanos qualificados para as suas necessidades”. No caso da restauração, por exemplo, “os horários são difíceis, e os jovens, e não só, querem ter tempo para si e para os seus”, e por isso é necessário “levar a cabo uma campanha de dignificação e atração” para estas profissões. A hotelaria e o alojamento local também não estão imunes — numa fase em que já entraram em vigor as zonas de contenção ao alojamento local em Lisboa —, e Eduardo Miranda, presidente da Associação de Alojamento Local em Portugal, defende que estamos num momento que “devemos aproveitar para aumentar o nível qualitativo.” Sem esquecer a necessidade de fomentar políticas “que promovam a imigração”, como já está a ser feito “com países dos PALOP”, e ajudem a suprir estas necessidades.

A sazonalidade é outra das questões levantadas pelos responsáveis do sector. E se é certo que o crescimento turístico tem trazido mais regiões para os roteiros, também é certo que o trabalho ainda está em progresso. Um desses casos é os Açores, e a diretora regional do Turismo, Marlene Damião, revela que “o combate à sazonalidade e a consequente distribuição de fluxos turísticos por todas as ilhas ao longo de todo o ano” é uma das grandes prioridades do Executivo. O aumento de 10,9% no número de empresas de animação turística, entre janeiro e agosto de 2019, é visto como um bom indicador, sem deixar cair a “sustentabilidade ambiental”, que é “obviamente fundamental” e uma preocupação constante.

Pelo seu lado, o presidente do Turismo do Porto e Norte de Portugal, Luís Pedro Martins, destaca o “marketing digital” como forma de atrair mais visitantes ao longo do ano e pede um maior “trabalho em rede entre as diferentes entidades do ecossistema”. Ainda há “espaço para que as empresas de animação turística cresçam mais”, considera, principalmente “em áreas menos exploradas”.

A tudo isto ainda há a acrescentar o principal porto de entrada do país, o aeroporto de Lisboa. A palavra “estrangulamento” é mencionada mais do que uma vez nas conversas feitas para este artigo, e os operadores falam da importância de construir uma nova estrutura. “Para crescer, precisamos de um novo aeroporto”, defende Luís Araújo, porque desse aumento de capacidade também depende muito a abertura de mais destinos e a redução da dependência de alguns países. É um passo para “continuarmos a acrescentar valor”.

O turismo em números

3
mil milhões de euros é o valor das receitas turísticas em Portugal até agosto deste ano, de acordo com o Banco de Portugal. O resultado representa uma subida de 5,9%, mais precisamente €166,2 milhões face ao mesmo período em 2018

40
mil empregos é quanto a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal estima que faltem preencher no sector para garantir a qualidade do serviço, apesar de terem sido criados mais de 69 mil empregos entre 2015 e 2018

800
mil é o número aproximado de camas que se encontram no alojamento local, três vezes mais do que as 200 mil que se encontram na oferta hoteleira tradicional

33,5
por cento é a taxa de sazonalidade que o Turismo de Portugal espera que seja atingida em 2027, de acordo com as metas estabelecidas. Em 2018, o valor fixou-se nos 36,4% e o objetivo é alargar a atividade turística a todo o ano

Quatro categorias, 20 finalistas

ALOJAMENTO
Pine Cliffs, a Luxury Collection Resort
São Lourenço do Barrocal
Torre de Palma Wine Hotel
H2otel — Congress & Medical Spa
Areias do Seixo Empreendimentos Hoteleiros, Lda.

ALOJAMENTO LOCAL
Palácio Belmonte
The Passenger Hostel
Aldeia da Cuada
Farmhouse of the Palms
Resort Natureza Villa Rio

RESTAURAÇÃO
Alma, Henrique Sá Pessoa
Restaurante A Cozinha by António Loureiro, Lda.
Feitoria Restaurante & Wine Bar
Theatro
Pesca

SERVIÇOS TURÍSTICOS
Time Out Market Lisboa
The Presidential Train
Parques de Sintra — Monte da Lua, S. A.
Vertigem Azul
PátioTurismo Sociedade Unipessoal, Lda.

Gala no Estoril

É no dia 28 de novembro, quinta-feira, que são conhecidos os grandes vencedores do Prémio Nacional do Turismo em cada uma das quatro categorias. O evento vai decorrer na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril e vai incluir uma prova realizada pelos alunos em que serão reinterpretados os sabores que simbolizam cada uma das sete regiões de turismo nacionais.

Textos originalmente publicados no Expresso de 16 de novembro de 2019