31 dezembro 2019 12:20
tiago miranda
O último Orçamento do Estado da geringonça foi publicado esta segunda-feira em Diário da República, para entrar em vigor já a partir de dia 1 de janeiro. Deixamos-lhe um roteiro das principais alterações face a este ano
31 dezembro 2019 12:20
O Orçamento do Estado para 2019 foi esta segunda-feira publicado em Diário da República, para entrar em vigor já a partir amanhã. Trata-se do último orçamento da geringonça, onde o governo distribui um bocadinho por muita gente.
Deixamos-lhe o que de essencial muda no próximo ano.
IRS
NOVOS PRAZOS, AS MESMAS TAXAS
No próximo ano, taxas, escalões e deduções no IRS não mexem e, em circunstâncias iguais a generalidade dos contribuintes pagarão o mesmo que este ano.
As grandes novidades estão sobretudo reservadas ao nível do calendário, passando os contribuintes a ter três meses (entre 1 de abril e 30 de junho) para procederem à entrega do IRS, que continua a ser obrigatoriamente feita por internet.
Isto não quer dizer que não haja pequenos grupos de contribuintes a sentir ligeiros alívios, devido a medidas muito específicas. É o caso de quem estude nas zonas de baixa densidade (o chamado interior) ou nas ilhas ou a quem se mude para lá e arrende casa.
É também o caso de quem tenha muito baixos rendimentos, que fica dispensado de entregar declaração se ganharem até sensivelmente 654 euros por mês. E ainda o caso dos emigrantes que, tendo saído do país até 31 de dezembro de 2015, regressem em 2019 e 2020, através do programa Regressar.
CUSTO DE VIDA
ENERGIA, TRANSPORTES E ENSINO MAIS BARATOS...
2019 será um ano em que as famílias contarão com o alívio dos preços em alguns bens e serviços considerados essenciais, como os transportes e a educação. Nos transportes, desde logo por via da redução do preço dos passes sociais. De abril em diante, as famílias pagarão no máximo dois passes, que, em Lisboa e Porto, custarão no máximo 30 euros para circulação dentro da cidade e 40 entre concelhos. Perante as acusações de que estava apenas a privilegiar os grandes centros urbanos, o Governo garantiu que a medida é para generalizar ao resto do país e reforçou a transferência do Orçamento do Estado de 83 para 104 milhões de euros.
Ainda ao nível dos transportes, BE e PCP chumbaram o fim do adicional ao ISP (imposto sobre os combustíveis), mas, ainda assim, os automobilistas já estão a sentir um alívio de 3 cêntimos no preço da gasolina, decretado entretanto pelo Governo através de portaria.
Quem tem filhos a estudar no secundário (no ensino público ou em escolas com contratos de associação com o Estado) passará a ter direito a manuais escolares de graça a partir do próximo ano letivo (cerca de 1,2 milhões de alunos), e quem os tem no ensino superior verá a propina máxima baixar.
Já a energia é suposto baixar por duas vias: por um lado indiretamente através da redução do défice tarifário, e, por outro, pela baixa direta do IVA sobre a parte da potência contratada, assim que houver luz verde de Bruxelas. A descida por via da redução do défice tarifário é certa, e rondará os 3,5% em média, mas a redução do preço por causa do IVA é incerto ainda, porque nada obriga os operadores a refleti-la no preço final. Será preciso esperar para ver o que diz a Comissão Europeia, primeiro, e como reage o mercado, depois.
... E A CULTURA LOGO SE VÊ
Ao nível do IVA assistiremos em 2019 à descida do imposto num conjunto de bens e serviços, mas o seu impacto final no bolso de cada um é incerto. Os livros, jornais e revistas em suporte eletrónico têm uma redução de 23% para 6% no imposto (a partir de 1 de julho) e nos espetáculos culturais, touradas e concertos ao ar livre incluídos o imposto desce dos atuais 13% para os 6% (a partir de 1 de janeiro), mas, como nada obriga os comerciantes e prestadores de serviços a baixarem os preços finais aos consumidores, será preciso esperar para ver se os preços finais mexem ou se os comerciantes ficam com a diferença.
PROPRIEDADE
PEQUENOS AJUSTES NAS MAIS-VALIAS
Depois do “recuo nunca explicado do Governo” (segundo Catarina Martins) na chamada ‘taxa Robles’, o Orçamento é relativamente inócuo em matéria de impostos sobre o património. As regras da tributação das mais-valias em IRS alteram-se, mas para duas situações pontuais: para permitir que quem tem mais de 65 anos mantenha a isenção de IRS mesmo que não reinvista o dinheiro numa casa nova (e desde que o aplique em poupança); e para garantir que, quem reconstrói ou reabilita a sua casa com dinheiros públicos a conserva na sua posse durante pelo menos 10 anos (sob pena de perder essa mesma isenção).
IMI COM NOVOS PRAZOS
De resto, como o BE e o PCP pretendiam, criou-se um novo escalão no adicional ao IMI para patrimónios acima de €2 milhões (passa a pagar 1,5% sobre o remanescente). E, pela mão do PCP, corrigiu-se uma lacuna que permitia aos fundos de investimento imobiliário recuperar em tribunal o IMT pago. Pelo meio acabou-se com a isenção de IMT a prédios com utilidade turistica, e com a isenção de imposto de selo aos fundos de investimento.
Como tinha sido proposto pelo Governo, no próximo ano o IMI chega-nos em prestações mais suaves: quem tiver uma conta entre 100 e €500 vai poder pagá-la em duas prestações, em maio e novembro. Se a conta for superior a €500, mantêm-se as três prestações, em maio, agosto e setembro. Até €100 o imposto passa a ser pago em maio.
SEGURANÇA SOCIAL
AUMENTOS NS PENSÕES EM PAGAMENTO...
Em 2019 repete-se a receita dos últimos dois anos e garante-se que quem tem pensões até sensivelmente €654 terá pelo menos um aumento de €10, a começar já em janeiro. A medida já constava da proposta original apresentada pelo ministro Vieira da Silva, onde também já estavam previstos os alívios nas penalizações para quem queira reformar-se antecipadamente.
... E MENOS PENALIZAÇÕES PARA ANTECIPAÇÕES
De janeiro de 2019 em diante, quem tiver pelo menos 63 anos de idade e 43 de descontos pode reformar-se antes da idade legal, sem ser penalizado pelo chamado fator de sustentabilidade (que representa um corte superior a 14%). Em outubro, o alívio estende-se a quem, aos 60 anos de idade, tenha pelo menos 40 de descontos (em ambos os casos, só fica o corte por antecipação, de 6% por cada ano que falte até chegar à idade legal). Quem não cumpra estas condições continua a poder reformar-se antes do tempo, mas enfrentando o duplo corte. As regras estão previstas para quem descontou para a Segurança Social, mas o Governo compromete-se, ao longo de 2019, a estendê-las à Função Pública.
Ainda na área da Segurança Social, alarga-se o abono de família e reforça-se o complemento atribuído aos estudantes abrangidos pela ação social que não têm lugar nas residências.
IRC
UM PRÉMIO A QUEM TEM PREJUÍZOS
Estabilidade fiscal pelo segundo ano consecutivo, o fim do mal-afamado pagamento especial por conta (PEC), o reforço nos incentivos fiscais ao investimento e a promessa de um desagravamento do IRC no interior são, em traços gerais, as medidas que o Governo reservou para as empresas em 2019.
Na passagem da proposta de OE pelo Parlamento caiu uma das medidas que tinham sido mais contestadas pelos empresários — o agravamento das tributações autónomas sobre as despesas de carros ligeiros de passageiros que as empresas atribuem aos seus trabalhadores e gestores (com os votos de todos, à exceção do PS).
Esquerda e direita também isolaram o PS no que respeita ao PEC: o Governo queria que as empresas tivessem de pedir expressamente escusa da sua entrega mas, por proposta do PCP, a isenção passa a ser automática, sem necessidade de submissão de qualquer pedido. A medida é especialmente relevante para aquelas empresas que sistematicamente dão prejuízos, que deixarão de ser obrigadas a entregar qualquer imposto ao Estado.
O agravamento da derrama estadual para as sociedades mais lucrativas, proposto pelo PCP e pelo BE, não avançou.
FUNÇÃO PÚBLICA
AUMENTOS SÓ NO SALÁRIO MÍNIMO
Apesar de terem feito muito barulho com os aumentos salariais da Função Pública, PCP e Bloco deixaram que o Governo fechasse o Orçamento sem definir como vão acontecer. Na negociação direta com os sindicatos, já com o Orçamento fechado, o Governo propos apenas aumentar o salário mínimo no Estado, para os 635 euros mensais. Todos os restantes funcionários ficam sem atualização direta dos salários (poderão contudo tê-las por via das progressões).
FRAUDE E EVASÃO FISCAL
FISCO COM ACESSO AOS PERDÕES FISCAIS
A informação sobre os três perdões fiscais, que até agora estava trancada a sete chaves no Banco de Portugal e nas instituições financeiras vai passar para as mãos da Autoridade Tributária. O objetivo é que o Fisco consiga despistar se os contribuintes que aderiram aos RERT (regime especial de regularização tributária) têm efetivamente todos os impostos pagos ou se usam a declaração de regularização como um salvo-conduto para toda a qualquer dívida que apareça.
BANCO DE PORTUGAL OBRIGADO A PARTILHAR OFFSHORES
O Banco de Portugal terá de partilhar com a Autoridade Tributária (AT) a informação que recebe das instituições financeiras sobre transferências para offshores. O objetivo é o de permitir que o Fisco faça o cruzamento de informação com os dados que tem e despiste eventuais inconsistências. Ainda nesta esfera, os bancos que falhem o envio anual ao Fisco da informação relativa às transferências para offshores vão enfrentar multas que podem escalar aos 165 mil euros. Trata-se de um agravamento substancial das penalizações e que pretende evitar futuros “apagões” ou atrasos na comunicação destas informações.
SAÚDE
MAIS INVESTIMENTO, MAIS VACINAS
A Saúde vai receber mais €500 milhões para investimentos no próximo ano, o que, segundo o Governo, permitirá concluir obras em 113 centros de saúde ou extensões, lançar 20 novas unidades de saúde familiares e dar início à construção de 5 novos hospitais (Lisboa Oriental, Évora, Sintra, Seixal e Funchal), embora não seja certo quando. Já as polémicas obras na ala pediátrica do Hospital São João vão ter via verde para avançar, dispensando-se o visto prévio do Tribunal de Contas.
Em 2019 as vacinas contra a meningite B, o Rotavírus e o alargamento da vacina contra o Vírus do Papiloma Humano (HPV) a rapazes poderão passar a fazer parte do Plano Nacional de Vacinação.