20 fevereiro 2010 12:20

Kate Hudson e Casey Affleck em The Killer Inside Me
"The Killer Inside Me", adaptação da extraordinária novela de Jim Thompson, é o filme mais convincente de Michael Winterbottom. E o último da competição. Berlim anuncia o Urso de Ouro esta noite.
20 fevereiro 2010 12:20
Winterbottom é um cineasta mutante. Habitué de Berlim (é a quarta vez que visita o festival alemão), o tarefeiro britânico muda de género como quem muda de camisa. Todos os anos tem um novo filme. Para já, deixou as insuportáveis crónicas humanistas de "Neste Mundo", que venceu aqui um Urso de Ouro, em 2003. Deixou as denúncias políticas de "A Caminho de Guantánamo", que lhe valeu um Urso de Prata de Melhor Realizador, em 2006.
E atirou-se de cabeça para um filme difícil, o mais exigente da sua carreira, pois não é fácil adaptar a história do protagonista inventado por Jim Thompson na sua novela pulp de 1952, "The Killer Inside Me." Estreado em Sundance, o filme de Winterbottom foi o último a apresentar-se na corrida pelo Urso de Ouro.
Xerife e assassino
No centro da história está Lou Ford (Casey Affleck, notável), um jovem xerife de uma pequena cidade do Texas. Estamos nos anos 1950. Lou tem uma namorada, Amy Stanton (Kate Hudson). É um bom profissional, exemplo respeitado por todos, mas os seus traumas da adolescência, a sua misoginia mostruosa, não tardam a vir à tona: atrás daquela fachada, esconde-se um psicopata. Um assassino cínico e calculista.
Quando o filme (e o livro) começa, Lou já tem cadáveres atrás de si. Envolve-se depois numa relação sado-masoquista com uma prostituta (Joyce Lakeland/Jessica Alba). A relação leva-o a uma velha história de chantagem. E a chantagem acaba em duplo homicídio.
Uma das coisas que mais nos intrigava no filme era a representação da violência e a repugnância desse primeiro crime, porque Lou, que julga ter morto a prostituta (a presença desta é fulcral para o desfecho da história), ataca-a à pancada. Soco atrás de soco. Jim Thompson era implacável a descrever o acto de selvajaria. E o filme cumpre a representação à risca.
Mas este Lou, que é o melhor do filme, jamais aterrroriza como no livro de Thompson. Os flash-backs eram desnecessários. Jessica Alba é demasiado doce para o seu papel. A personagem de Amy está melhor mas é pouco desenvolvida. Pontos negativos que, porém, não impedem que "The Killer Inside Me" seja um thriller acima da média, um filme a defender. O melhor de sempre de Winterbottom.
Em nome do pai

A Family, de Pernille Fischer Christensen
Na mesma freitag, Berlim exibiu "A Family", da realizadora dinamarquesa Pernille Fischer Christensen. É a história dos Rheinwald, uma família de padeiros de Copenhaga. O patriarca da família (papel de Jesper Christensen) deu seguimento à herança do pai e do avô e construiu um pequeno império com o negócio.
A sua filha, Dritte, não quer segui-lo: é uma galerista de sucesso e pensa em mudar-se para Nova Iorque. Tem relação complicada, está grávida e decide abortar para ir à conquista da América. Mas quando o patriarca descobre que tem câncro terminal, o mundo dos Rheinwald começa a ruir.
Dramalhão
Dos complexos de culpa, "A Family" passa para a lenta, longa e insuportável agonia do protagonista doente, até à sua morte, levando o espectador para um espectáculo de crueldade sentimentalista difícil de seguir. A realizadora poderá sempre dizer: "é assim, a vida, tal como a morte." Mas a exploração deste último reduto de intimidade, o facto de se assistir gradualmente ao espectáculo de ver morrer alguém (a interpretação de Jesper Christensen é uma pavorosa imitação de sofrimento) é muito mais repulsivo e indigno do que comovente.
Prémios desta noite
Se estivessemos no júri, daríamos o Urso de Ouro a "Caterpillar", de Wakamatsu, o grande filme deste festival. Não esqueceríamos "The Ghost Writer", de Polanski. Nem "The Hunter", de Rafi Pitts. Nem "The Robber", de Benjamin Heisenberg. Nas categorias de interpretação gostamos do actor deste último, Andreas Lust, e da actriz Greta Gerwig, de "Greenberg."
Berlim 2010 divulga os seus prémios esta noite. E com Werner Herzog no júri, pode haver surpresas de última hora.
The Killer Inside Me (Reino Unido/EUA) de Michael Winterbottom (Selecção Oficial - Competição)
A Family (Dinamarca) de Pernille Fischer Christensen (Selecção Oficial - Competição)
Mais informações no site oficial do Festival de Cinema de Berlim 2010.