ARQUIVO Mineiros soterrados

Mineiros revelam verdades da clausura

17 outubro 2010 19:00

Paula Cosme Pinto (www.expresso.pt)

Os 33 mineiros resgatados fizeram um pacto de silêncio sobre os dias passados dentro da mina de San Jose. Contudo, alguns dos homens já começaram a levantar o véu sobre a clausura, falando sobre discussões, desespero e até mesmo canibalismo. Clique para visitar o dossiê Mineiros Soterrados

17 outubro 2010 19:00

Paula Cosme Pinto (www.expresso.pt)

"Espero que os meus companheiros cumpram o pacto de silêncio que fizemos lá dentro". Quem o diz é Juan Carlos Aguilar, um dos 33 mineiros que foram resgatados da mina de San Jose ao fim de dois meses soterrados. Em entrevista ao jornal espanhol "El País", o trabalhador chileno mantém a promessa e não avança grandes pormenores sobre os dias "amargos" passados no interior da mina: "Fizemos um pacto muito bonito e bem claro de não contar nada do que aconteceu desde 5 de agosto. Espero que todos o cumpram. Por agora só precisamos é de tempo para superar este trago amargo que todos trazemos".

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Contudo, as ofertas de dinheiro por parte dos jornalistas são tentação suficiente para que o pacto não venha a ser cumprido. De acordo com o jornal espanhol, um dos mineiros mais cotados é Florêncio Ávalos, o primeiro a ser retirado da mina. Quando abordada por jornalistas, a sua esposa foi peremptória: "Quanto dinheiro me oferece? Nada? Então não vou perder tempo consigo".

Afinal o herói da mina chama-se Mario Sepúlveda

Entre os 33 mineiros há já mesmo quem tenha começado a revelar alguns pormenores do terror vivido dentro da mina, a mais de 700 metros de profundidade. Em entrevista ao jornal chileno "El Mercurio", Yonni Barrios levantou o véu e contou que na realidade quem comandou os 33 homens dentro da mina não foi o chefe de turno Luis Urzúa - como até agora tinha sido divulgado - mas sim Mario Sepúlveda.

"Agora posso contar com toda a franqueza: Quem nos liderou desde o início foi Mario Sepúlveda. Foi ele quem fez tudo por nós, que organizou a equipa, que nos dava alento sempre que perdíamos a esperança", explicou Barrios. Contudo, todas as decisões eram tomadas democraticamente. "Tudo era votado entre os 33. Dezasseis, significava uma maioria".

Fome, sede e canibalismo

O sistema de votação é corroborado pelo colega Richard Villarroel, de 23 anos, que em entrevista ao jornal britânico "The Guardian" contou que durante a clausura os mineiros tentavam ocupar-se com o trabalho, o que muitas vezes se tornou difícil uma vez que a falta de comida os levou a emagrecer muito. No seu caso foram 12 quilos perdidos.

Durante os primeiros 17 dias, a alimentação entre os 33 homens foi equivalente a uma colher de atum ou salmão para cada um, uma vez em cada 24 horas. Desidratados, os mineiros chegaram meso a beber água das máquinas contaminada com combustível e a usar explosivos numa tentativa desesperada de alertar socorristas. "O meu corpo comia-se a ele próprio", conta Vilarroel. Quando questionado sobre a possibilidade de canibalismo, o jovem revela ao fim de um longo silêncio: "De início ninguém falava nisso, mas depois de nos encontrarem tornou-se tema de piadas entre nós".

União entre mineiros posta em causa

Embora a imagem de união entre os 33 mineiros tenha sido passada ao mundo durante a operação de resgate, os desentendimentos entre os homens quando estavam soterrados começam a ser revelados. Segundo o jornal britânico, um colega da equipa de mineiros afirma ter recebido uma carta em que são descritas discussões com confrontos físicos entre os homens.

A suposta desunião entre os mineiros também foi noticiada pelo "El País", aquando do primeiro vídeo realizado dentro da mina, onde são  visíveis apenas 28 homens. O jornal espanhol diz que os restantes cinco mineiros teriam formado um grupo à parte, que estaria a tentar uma estratégia alternativa para sair da mina.

Contudo, sobre a desunião todos os mineiros se recusam, para já, a falar: "Só nós sabemos o que se passou lá dentro. Quando terminarem as investigações, pode ser que o possamos contar", conclui Juan Carlos Aguilar.