25 agosto 2010 17:00
Mário de Carvalho, o "cameraman" português da CBS, diz que "nunca viu nada assim". Clique para aceder ao índice do dossiê Katrina 2005/2010
25 agosto 2010 17:00
O furacão "Katrina", que assolou a costa sul dos Estados Unidos, está a provocar estragos maiores do que a Administração americana previa, e terá certamente muitas consequências políticas. "Isto é devastador para a América", conta Mário de Carvalho, o "cameraman" português da CBS que está na cidade de Nova Orleães. Pior do que o furacão foi a desorganização dos meios de socorro e a falta de previsão de que a zona poderia ser inundada pela quebra dos diques.
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Como repórter, este é o 31.º furacão que Mário de Carvalho cobre, mas diz que "nunca assisti a nada assim". Viu bebés prematuros a serem transportados em carrinhos de supermercado, gente sem água, ao relento, em viadutos das auto-estradas, a morrer de fome. "Vi o cadáver de um homem cuja vizinha me disse que se tinha atirado da ponte onde estava refugiado, no desespero". Um "doente numa cama de hospital, com os tubos enfiados nas veias, a boiar". A equipa da CBS levou-o para um hospital que se recusou a recebê-lo, porque "não podia fazer nada por ele", não tinha meios. "Coisas que só esperamos ver em países de terceiro mundo, não aqui", diz o "cameraman".
Embora o Presidente George W. Bush tenha admitido que era "inaceitável" a forma como o salvamento não funcionou, é o planeamento que está a ser mais questionado. Nomeadamente o facto de o governo estadual e federal e a edilidade não terem fornecido camionetas para retirar as populações dos bairros mais pobres da cidade - os mais afectados porque são de casas baixas de madeira. "As pessoas não tinham carro para fugir, o que podiam fazer?"
Depois do furacão, à noite, Mário de Carvalho estava no "French Quarter", a zona histórica da cidade, onde já havia "várias pessoas a beber pensando que o pior tinha passado". De repente, a água começou a subir com a quebra dos diques. Desde aí, tem sido o caos. Mário relata como o episódio mais dramático uma viagem de barco que fez, na zona leste da cidade. "Quando parávamos o motor ouvíamos pedidos de socorro de pessoas que não víamos. Deviam estar nos sótãos das casa, impedidas pela água de sair".
Um senador estadual já falou em mais de 10 mil mortes. Mário assistiu à morte de um homem que ele tinha acabado de retirar do telhado de uma casa, com a mulher, de 73 anos, no barco. Passou pelo lugar onde os tinha colocado, no dia seguinte, e o cadáver ainda estava lá, porque as morgues estão submersas.
A insegurança é um dos problemas mais graves. "Os bandos andam armados de catanas, de 'kalashnikovs' pela cidade a roubar tudo: camas de hotéis, mesas, bicicletas, ténis".
Ontem chegou a Nova Orleães uma coluna de ajuda alimentar e o Presidente já declarou o estado de calamidade. Portugal manifestou as suas condolências aos EUA, através de uma mensagem de Jorge Sampaio. Por enquanto não há notícia de portugueses atingidos pela tragédia, embora haja cerca de mil a residir no estado do Louisina.
Texto publicado na edição do Expresso de 3 de setembro de 2005
