Cultura

Mário Viegas. Os poemas proscritos, 52 anos depois

3 abril 2021 12:01

Carlos Rico

O registo inédito de Mário Viegas surge 25 anos após a sua morte

d.r.

A pedido do médico Jorge Ginja, mobilizado para a Guerra do Ultramar, em 1969 Mário Viegas gravou 40 poemas e dois textos dramáticos de autores proscritos pelo regime de Salazar. 52 anos depois, a gravação — provavelmente, a primeira do ator — vai ser editada num audiolivro com introdução de Manuel Alegre

3 abril 2021 12:01

Carlos Rico

Esta é a história de uma amizade forjada nos bastidores do Teatro Universitário do Porto (TUP), que, na década de 60 do século passado, desenvolvia as suas atividades na Rua do Carmo, paredes-meias com as cavalariças do quartel da GNR. A proximidade da Guarda não impedia os estudantes de organizar recitais de poesia à porta fechada nem de ensaiar peças de teatro que fintavam as apertadas malhas da censura. O espírito rebelde de Mário Viegas encaixava como uma luva no ambiente conspirativo do TUP, que, em 1969, acolheu o jovem estudante de História, oferecendo-lhe o papel de Mengo, o tolo de “Fuenteovejuna”, clássico da dramaturgia espanhola que narra a revolta do povo contra a tirania do comendador Fernán Gómez de Guzmán. Na peça, a ex-jornalista e pivô da RTP Manuela de Melo interpretava o papel de Laurencia, a heroína da trama encenada por Correia Alves, com banda sonora original de Zeca Afonso. Aluna, à época, do curso de Biologia, Manuela de Melo recorda-se bem da chegada de Mário Viegas ao TUP: “Era um miúdo, parecia um catraio! E era um ator extraordinário! Naquele meio, onde éramos todos amadores, ele destacava-se nitidamente.”

O talento de Viegas chamou também a atenção de José Carlos Vasconcelos, que, na altura, fazia crítica de teatro para o “Diário de Lisboa”. “A ideia que tenho é de ter feito uma referência expressa àquele miúdo, que me impressionou muito, porque via-se que estava ali um grande ator”, recorda o diretor do “Jornal de Letras”, que anos mais tarde participaria, como declamador, em dezenas de recitais de poesia, ao lado, entre outros, do próprio Mário Viegas, Francisco Fanhais, Zeca Afonso e Carlos Paredes.