
Em 1964, um cantor popular testou em direto os limites da censura televisiva, mas foi vergado e esquecido no seu próprio país
Em 1964, um cantor popular testou em direto os limites da censura televisiva, mas foi vergado e esquecido no seu próprio país
Gonçalo Pereira Rosa
Parecia uma noite como qualquer outra na Rádio Televisão Portuguesa. A emissão abrira às 19h30, patrioticamente, com o hino nacional. O “Telejornal” transmitira depois as notícias filtradas por um sistema quase infalível de controlo da informação. Seguiram-se as rubricas próprias de terça-feira — o “Programa Feminino” e a “Crónica do Progresso”. Às 20h45, a única estação televisiva portuguesa dedicara uma hora à tourada, com a voz ensonada e os textos gongóricos de Leopoldo Nunes. Repetiu-se o “Telejornal”, o “Boletim Meteorológico” e um enlatado ficcional comprado nos Estados Unidos. Por fim, às 23h15, a estação abriu espaço para a música ligeira. O programa “TV Clube” convidara o cantor Francisco José, recém-regressado do Brasil, para uma atuação em direto, acompanhado pela orquestra do maestro Alves Coelho.
Francisco José, cantor de sucesso nos derradeiros quatro anos no Brasil, voltava a casa. Cantou algumas das suas obras mais conhecidas e terminou com ‘Chão Estrelado’, dedicando o tema aos pais. Depois, de microfone na mão, concluiu a prestação de forma inesquecível. Durante pouco mais de três minutos, disse ao público português que a RTP discriminava os artistas portugueses face aos congéneres estrangeiros. Em frente das câmaras, sem se deter, lembrou que alguns cantores estrangeiros recebiam 50 ou 100 contos por uma prestação na televisão, mas os artistas portugueses recebiam dois mil escudos na melhor das hipóteses. “O público não compreende uma palavra do que esses artistas cantam. Não importa. Pagam-lhes bem.”
Este é um artigo do semanário Expresso. Clique AQUI para continuar a ler.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt