Vida na Terra

Investir na banca ética*

5 abril 2011 22:59

Alexandre Coutinho

5 abril 2011 22:59

Alexandre Coutinho

Desde há algum tempo que se detecta uma crescente influência do mundo financeiro sobre as políticas económicas e produtivas mundiais - e as consequências da queda do subprime nos Estados Unidos, em 2008, continuam a gerar repercussões na Europa, nomeadamente, em Portugal -, sobre as estratégias dos mercados a todos os níveis, sobre o desenvolvimento e sobre as relações entre os povos e as nações. Ou seja, as finanças condicionam cada vez mais e, a longo prazo, o próprio destino da humanidade: a paz ou a guerra, o progresso comum ou o delírio competitivo do mundo globalizado que, entre um Iraque em chamas e uma manifestação pela paz, procura com dificuldade percorrer um caminho que seja razoavelmente equilibrado.

Felizmente, nem todo o mundo financeiro é constituído por especuladores sem escrúpulos ou capitais que transitam sem parar de uma bolsa para outra, para acabar nos bolsos de investidores desonestos ou no mundo do crime organizado. Existe uma vertente do mercado, que acreditamos ser sólida e vigorosa, formada por operadores, homens e mulheres que dão ouvidos à sua consciência e que compreenderam que têm essa responsabilidade.

Entretanto, muitos investidores interrogavam-se sob forma como poderiam aplicar as suas poupanças, salvaguardando o seu valor - e, se possível, incrementando-o -, sem prejudicar o bem-estar colectivo e o progresso social. Estes cidadãos vêem os instrumentos de poupança e investimento tradicionais como o limite intrínseco de uma especulação bolsista que, não somente, como num jogo de soma zero, por cada ganhador gera um perdedor, mas também que alimentam uma concepção das finanças cada vez mais distante de utilizar o dinheiro em actividades produtivas, em prol de uma óptica de mero benefício económico.

Uma utilização conscientemente orientada para a ética e para os valores da poupança, dirigida a produções e atitudes socialmente responsáveis, é uma opção que une a consciência aos recursos das famílias.

As finanças éticas nasceram do desejo de satisfazer os investidores mais difíceis e para conquistar um nicho de mercado emergente? Nasceram da convicção de que criar valor económico e social não são objectivos divergentes? Se calhar não é possível dizê-lo e nunca saberemos o que sentia a primeira pessoa que pensou em razões de ética e de sustentabilidade das finanças, mas isso acaba por não ser muito importante. Em contrapartida, é fundamental pensar nas aplicações concretas de um princípio válido e da possibilidade de governar, inspirados nos princípios de um bem-estar colectivo para o motor central do desenvolvimento, o mercado financeiro.

Embora as finanças éticas já tenham uma longa história, só mais recentemente, se começou a avaliar a sua potencialidade como motor de mudança e transformação dos objectivos de gestão das empresas. Estas começaram a ganhar consciência de que a sua responsabilidade não é somente económica, mas também social e ambiental. E de que devem ter em conta, além dos interesses dos accionistas, também os dos grupos de interesse (stakeholders) que se relacionam directa ou indirectamente com elas.

São cada vez mais, os investidores que reclamam informação não financeira das empresas em que investem e assumem o seu papel de accionistas responsáveis, dialogando com elas e, inclusive, intervindo através do voto em decisões que podem comprometer o futuro da empresa se estas assumem riscos excessivos. As empresas que estão submetidas ao escrutínio dos investidores são, geralmente, grandes empresas cotadas nos mercados financeiros internacionais e em cujo capital participam investidores institucionais (fundos e sociedades de investimento) preocupados com a responsabilidade social das mesmas.

Na sua origem, as finanças éticas eram motivadas por questões de ordem moral, que obrigavam os investidores éticos (grupos religiosos, organizações ambientais ou sociais) a estabelecer filtros na hora de aplicar as suas poupanças. Actualmente, nos mercados financeiros, os grandes investidores vêem no comportamento socialmente responsável da empresa, um valor acrescido que se traduz por benefícios a longo prazo e numa maior capitalização bolsista.

Além do capital financeiro e dos activos tangíveis, as empresas contam com um capital social, humano e intelectual, ao qual se deve dar atenção para obter o retorno máximo dos recursos utilizados numa visão de longo prazo. Cada vez mais, os empregados, os accionistas e os clientes valorizam estes activos intangíveis, que constituem a reputação externa e a cultura interna da empresa.

Uma progressiva consciencialização da responsabilidade ética e social por parte do sector financeiro (instituições bancárias e fundos de investimento) acabará por empurrar a economia no seu conjunto para uma mesma e desejável direcção.

*Inspirado em "Ética y Mercado: Cómo Invertir", C.E.C.U., 2004