Opinião sem cerimónia

Nem Lula tem almoços grátis

Nem Lula tem almoços grátis

Duarte Marques

Ex-deputado do PSD

O Brasil é um país soberano e através da sua diplomacia trata dos seus interesses, principalmente económicos. E Lula como Presidente nunca foi exceção

Aliás, se há algo que Lula nos ensinou é que é rápido e pragmático a adaptar-se aos resultados que é preciso obter. Apesar do temor inicial, nos primeiros mandatos de Lula foi rápido a vestir o “terno”, a compreender as leis de mercado e a conformar-se com as bases da modernização da economia brasileira, lançada por Fernando Henrique Cardoso. Lula é um romântico, idealista mas não é nenhum “menino de coro”. Os países têm interesses e apesar de toda a retórica o Presidente brasileiro comporta-se nos corredores do poder como um líder de um país capitalista.

Mas isso tem consequências. Lula precisa do financiamento da China e do novo banco para o desenvolvimento agora criado e “liderado” por Dilma, onde na verdade quem manda é o Partido Comunista chinês. Para isso, Lula teve de ir a Pequim fazer a genuflexão a que todos assistimos, mesmo que isso lhe custe qualquer espaço para discutir o sonho de integrar o lugar de membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Lula bem pode tentar dar ideia que a sua preocupação é a paz e a sua ambição é moderar uma solução para o conflito, mas na verdade Lula precisa de renminbis para financiar os seus projetos. Só isso explica ter sido mais incisivo que o próprio líder chinês em relação ao papel da UE neste conflito iniciado pela Rússia.

Pelo caminho, o Presidente brasileiro atacou a União Europeia e os Estados Unidos, responsabilizando-os, ou seja responsabilizando-nos a nós, pelo prolongamento da guerra na Ucrânia. Culpar a União Europeia é a mesma coisa que culpar Portugal, não só porque somos membros efetivos da UE mas sobretudo porque, apesar das hesitações iniciais de António Costa, subscrevemos na íntegra as posições da União relativamente ao conflito.

Neste capítulo há vários problemas graves provocados por Lula, em particular quando se aproxima a sua visita a Portugal por ocasião das celebrações do 25 de Abril. Daí ser oportuno esclarecer diversos pormenores da política externa do Brasil que colidem com a política externa portuguesa. Até aqui nada de surpreendente, não podemos é fazer de conta que o Brasil não pertence hoje ao “eixo do mal”. Aliás, a presença de Lavrov em Brasília é a clara confirmação que o novo governo brasileiro não se importa de servir de cabeceira aos mentirosos e criminosos do regime de Putin. Desilusão com Lula só quem andou demasiado distraído.

Acho muito bem que Lula venha a Portugal, tal como acharia bem que Bolsonaro tivesse vindo. Os brasileiros são soberanos nas suas escolhas tal como nós somos nas nossas.

Os laços entre Portugal e o Brasil são muito mais importantes que qualquer Presidente ou primeiro-ministro e na verdade, ao contrário de Bolsonaro, Lula sempre tratou bem Portugal. Outra coisa é fazermos orelhas surdas a posições do Presidente brasileiro que nos chocam ou que nos visam direta ou indiretamente.

É por esta razão que considero necessário perguntar a Lula:

Considera que Portugal e a União Europeia são responsáveis por ainda decorrer um conflito na Ucrânia?

Se para si é claro que a Ucrânia deve abdicar da Crimeia e do Donbass, está o Brasil disposto a ceder algum Estado brasileiro a Portugal?

Entende que é errado os países ocidentais darem equipamento aos ucranianos para estes se defenderem e protegerem dos ataques russos?

Considera que a Ucrânia é responsável pelo início da guerra e pela invasão russa?

Está o Brasil disposto a enviar equipamento de proteção ao povo ucraniano?

Está o Brasil disposto a apoiar a reconstrução da Ucrânia?

Mais do que faltar à cerimónia com o Presidente Lula no Parlamento, talvez seja mais oportuno estar presente, defender a nossa política externa de apoio à Ucrânia e à paz, condenar o comportamento russo e dos seus aliados e, se possível, ao lado do cravo vermelho colocar um símbolo da Ucrânia (se não existirem cravos azuis e amarelos).

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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