25 fevereiro 2014 10:41

25 fevereiro 2014 10:41
A noite no refúgio Nuevos Horizontes foi simplesmente infernal. A rarefação de oxigénio conjugada com a deficiente ventilação fez com que mal pregássemos olho. Fomos sofrendo sequencialmente de falta de ar, palpitações cardíacas, nariz tapado, cãibras, frio e dores de cabeça e depois de falta de ar, palpitações cardíacas, nariz tapado, cãibras, frio e dores de cabeça. O dramático foi que cada um foi sofrendo solitariamente, convencido de que era o único a padecer de tais debilidades, e ninguém teve o bom senso de começar a gritar a meio da noite: "tirem-me daqui!". Considerando que nos deitámos às 9h da noite, nunca a obrigação de levantar às 5h da manhã foi recebida com tanto alívio.
Tocada a alvorada, passámos meia hora a tentar vestir-nos sentados na borda dos beliches, a dar violentamente com a cabeça no beliche cima de cada vez que nos levantávamos e a cair para trás KO durante alguns segundos, a reganhar consciência e a recomeçar o exercício. Os guias olhavam-nos com um misto de comiseração e incredulidade.
Às 6 da manhã lá saímos aos tropeções do refúgio, objetivo: o Illiniza Norte, a 5.116m. A rajada de ar gelado que nos atinge mal pomos o nariz fora do refúgio dá-nos uma descarga de energia e é com gosto que inspiramos a goles largos o ar que nos foi faltando durante a noite.
Os Illinizas são dois cumes (o Norte e o Sul) e estão integrados numa reserva ecológica de 150.000 hectares que vai dos 800m aos 5.200 m de altitude. As encostas do Illiniza Norte estão repletas de rochas de todos os tamanhos e feitios que resvalam permanentemente. Não é por acaso que hoje somos obrigados a levar capacete. Ao princípio julgámos que era só por causa das rochas mas rapidamente percebemos que o risco de queda é real. Hoje é o dia das acrobacias montanhesas e o significado da palavra "escalada" torna-se finalmente claro. Escalamos metro a metro dependurados nas rochas e olhar para baixo torna-se proibitivo.
Chegamos finalmente ao local de que havíamos tomado conhecimento a partir de um mapa no refúgio e que todos receávamos, apesar do seu nome tranquilizador: Paso de la Muerte. Mentalmente recrimino a minha mãe por nunca me ter ligado os pés como se fazia antigamente às geishas de forma a calçar 32 para o resto da vida: o espaço para colocar os pés é ridiculamente pequeno. O precipício é ridiculamente profundo, nós somos ridiculamente mortais e mais uma vez não há ninguém com bom senso que comece a gritar: "tirem-me daqui!". Tristemente começa a entranhar-se a convicção de que o grupo é totalmente destituído de bom senso... Com mais ou menos grito passamos todos e aqui vamos nós!
Ofegantes, chegamos ao cume pelas 9.30h. O tempo está descoberto e a vista aos 5.116 metros é gloriosa. Para onde quer que olhemos vemos cumes de vulcões a despontar acima das nuvens: Cayambe, Antisana, Altar, Cotopaxi, Sangay. Parece que foram convocados para um congresso de vulcões e que o local da reunião é acima das nuvens. Não só nos sentimos como estamos nas nuvens. Chévere*!
(* Fixe!)