7 novembro 2009 10:58
A liberdade de expressão é um valor importante para a humanidade pensante; o problema surge quando a usamos para desumanizar o Outro
7 novembro 2009 10:58
No meu percurso académico a antropologia social de Claude Levi-Strauss foi a que mais marcou o meu olhar sobre a alteridade. Entre várias, defendeu a ideia da irracionalidade e do desconhecimento no pensamento sobre o Outro. Desmistificou-o. E explicou que não existe qualquer correlação entre diferença e exotismo ou selvajaria. Influenciou a enorme discussão que dura até hoje sobre o etnocentrismo, sobre a imposição das nossas representações estereotipadas sobre os outros; abriu caminho para o pós-orientalismo. Embora tenha contribuido para um novo paradigma do pensamento social e humano, a sua ciência ficou reduzida a uma pequena elite intelectual da modernidade. Infelizmente, continuamos a ver o Outro com medo, com exotismo, com sentimento de superioridade civilizacional. E o que é curioso, é que esse Outro não vive no outro lado do mundo! Ele está aí mesmo, no outro lado da rua, muitas vezes, no mesmo andar do nosso edificio. E essa é a sua casa.
Os meus comentaristas às vezes mandam-me "para casa". Isso é onde? Haverá uma terra para muçulmanos? Ou outra para cristãos, ou para outras confissões religiosas?! Ou ser-se muçulmana é apenas viver a vida, onde quer que se esteja, de acordo com princípios de uma ética da Salaam?
E como se faz a Paz? Simples: conhecendo-nos mais e melhor. Conhecendo sobretudo, que um muçulmano faz mais do que "islão" o dia inteiro; que está ocupada a fazer coisas parecidas com o resto da população. Principalmente, que deseja a qualidade de vida, como qualquer cristão, judeu, ateu ou agnóstico. Com uma diferença importante que deve ser apreciada: um muçulmano prostra-se perante a criação divina, e vê nos seres humanos, na natureza, na passagem pela vida, os sinais (ayats) de Deus. E quando diz que não separa a fé do mundo, quer dizer que é essa fé, e essa ética cosmopolita que transporta e projecta no seu quotidiano, nas suas actividades intelectuais ou profissionais. Não separar a fé do mundo significa que é a própria fé que o estimula para o mundo, e este fá-lo questionar e aprofundar questões importantes, através do pensamento, da reflexão, do conhecimento.
Um dos missionários milenares do islão shiita que converteu grande parte da Ásia Central foi o poeta-filósofo, e teólogo, Nasir Khusraw (séc XI) costumava dizer que "para se conhecer Deus, é preciso saber mais; muito mais". De outra forma, é dificil observar os ayats de Deus na humanidade.
*A Salaam significa paz