Chamem-me o que quiserem

Um ano tranquilo (uma autocrítica)

31 dezembro 2014 8:00

Henrique Monteiro

Henrique Monteiro

Ex-Diretor; Colaborador

31 dezembro 2014 8:00

Henrique Monteiro

Henrique Monteiro

Ex-Diretor; Colaborador

Há mais de um ano apostei que em Portugal iriam existir graves confrontos sociais, eventualmente com violência nas ruas. A aposta foi feita com o então diretor do "Jornal de Negócios" Pedro Santos Guerreiro (estávamos longe de saber que ele viria para o Expresso), que insistia sermos um país "de brandos costumes".

Eu, com mais 20 anos do que ele, insistia que isso era propaganda do salazarismo e puxava da história do séc. XIX, da guerra civil liberal, da patuleia, com pistolas apontadas às costas do passante, da formiga-branca do Afonso Costa, da leva da morte, da noite sangrenta de uma série de episódios que não nos deixavam atrás de espanhóis, gregos ou italianos.

Passado um ano é óbvio que perdi a aposta. O ano foi tranquilo apesar da crise, do desemprego brutal, da carência alimentar e, sobretudo, do desespero que alguns agentes políticos têm mostrado. Foi um ano difícil, mas em que o respeito pelo sistema democrático falou sempre mais alto do que a desordem e o banzé.

Espero que 2014 seja assim. Não por entender que somos um povo de especiais "brandos costumes", mas por começar a convencer-me de que temos um povo bastante sensato (as eleições sucessivas têm-no demonstrado, gostemos mais ou menos das soluções encontradas).

Eu pensei que aos primeiros sinais de desespero, às primeiras proclamações demagógicas que alguns têm feito haveria campo para a desordem. Não houve. E para que não haja é preciso que o Governo não pense que não tem limites e que a oposição, em especial do PS e os sindicatos que têm sido enquadrados pela CGTP, não pensem que não têm responsabilidades.

Por muito românticas e heroicas que sejam as barricadas, nunca delas saíram grandes soluções (se pensam na revolução francesa, pensem que das barricadas resultou o terror, do terror o consulado, do consulado o Império, do Império a restauração monárquica e só depois a República). Edmond Burke, um dos mais acérrimos defensores da soberania do povo (no século XVIII) desiludiu-se com a revolução francesa por não passar de uma "balbúrdia sanguinolenta" e escreveu duas frases que a todos nos deve fazer pensar. Uma é esta: "Para o triunfo do mal basta que os homens bons não façam nada". A outra também é oportuna: "Aqueles que não conhecem a História estão fadados a repeti-la".

Agora, que o jornal "The Economist" colocou Portugal num "alto risco de agitação social", sou eu a dizer que não vão ter razão. As eleições europeias vão ser um escape e em Portugal ainda há muita gente boa e muita gente que conhece a História. E que, ao contrário do que eu previa, sabem distinguir o protesto do distúrbio.

Um Bom Ano de 2014 (ou o melhor que conseguirem fazer dele). Eu volto no dia 3

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