Henrique Raposo

O barão sindical

5 maio 2008 8:00

5 maio 2008 8:00

O código laboral costuma ser abordado através de uma perspectiva económica. Mas esta lei do trabalho é, acima de tudo, uma questão moral. É que os chamados 'direitos adquiridos' (i.e., emprego para a vida garantido por lei) são um factor de injustiça social. Repito: os 'direitos adquiridos' provocam injustiça social. Os privilégios dos barões sindicais criam a servidão dos servos. Quem são os servos? Fácil: os jovens adultos que só conhecem a condição de 'falsos recibos verdes'. Para que fique assente: os adversários dos jovens trabalhadores não são os patrões forretas. Os adversários dos 'falsos recibos verdes' são, isso sim, os colegas de trabalho mais velhos ungidos pela água benta dos 'direitos adquiridos'. Enquanto não for possível despedir os maus trabalhadores 'efectivos', o problema dos 'falsos recibos verdes' não será resolvido.

Imagine-se este cenário: na instituição X, a funcionária Y não faz nada porque está sempre de... mau humor. Para executar o trabalho que a mal-humorada recusa fazer, a instituição contrata um 'falso recibo verde'. Se o código laboral fosse justo, permitiria o despedimento da baronesa insolente e a contratação do jovem. Mas os 'direitos adquiridos' (i.e., o respeitinho pelos mais velhos) são injustos da cabeça aos pés: a mal-humorada permanece no emprego vitalício e o jovem continuará a ser um remendo. Caro leitor, qualquer semelhança entre este episódio e a realidade não é coincidência. A incompetência é um dos 'direitos adquiridos'.

Enquanto não existir coragem para romper com a narrativa dos 'direitos adquiridos', qualquer reforma do código laboral será insuficiente. Enquanto não existir coragem para dizer que o trabalho é um dever individual (e não um direito colectivo), a nossa lei do trabalho continuará a ser ineficiente na economia e, acima de tudo, imoral nas relações humanas. O contrato entre gerações jaz no chão.

A beleza é concisa

Acabei de reler o primeiro romance de Eduardo Pitta: 'Cidade Proibida' (Ed. Quidnovi). A impressão inicial mantém-se: do ponto de vista formal, este livro é uma raridade em Portugal. Pitta sabe contar uma história (neste caso, a relação atribulada entre Rupert e Martim). A fluidez narrativa - dominante em 'Cidade Proibida' - é a técnica literária mais difícil de encontrar na prosa portuguesa, ainda e sempre marcada por obscuras divagações metafísicas. Pitta tem outra característica invulgar entre nós: as suas frases são enxutas e limadas até ao limite.

Pitta é um grande poeta, mas é na prosa que poderá marcar a diferença. 'Cidade Proibida' é um bom romance de alguém que revela potencial para escrever grandes romances.

Henrique Raposo