Luz e lata

Não há pai para um espermatozóide!

30 abril 2014 10:01

Fátima Pinheiro

30 abril 2014 10:01

Fátima Pinheiro

Um espermatozóide não é um pai, mas pode vir a ser um pai. Eu tenho três filhos e o espermatozoide responsável, em parte, pelo que hoje eles são, "deu" num bom pai. Na natureza nada se perde. A presença do pai: verdade existencial essa, para eles vital, quotidiana. Não são o que seriam sem ele. Mais: o pai já não vive comigo, está longe, mas muito "perto", sendo determinante na liberdade de cada pessoa que cada um deles é. Venho com esta conversa, porquê? Estão na mesa de novo as "barrigas de aluguer". Como há pouco esteve a co-adopção. Não confundo os temas. No entanto - e como ando de roda do livro que reúne estas crónicas, não me sobra muito tempo para escrever - reponho o que aqui escrevi depois de um debate do Prós e Contras sobre co-adopção. 

Dizia então que não confundia temas ao falar de co-adopção. "Não estamos a falar de casamento mas da criança adoptada por uma pessoa que entretanto vive com outra, à qual se pretende agora, com esta lei, conferir direito a proteger os direitos daquela criança, em caso de a mãe ou pai adoptivo faltar.

Trata-se de proteger a criança. E quer dum lado, quer do outro, ontem afirmou-se a torto e a direito que era o ponto. Estranho porém ter que repetir este dogma tanta vez! E como é habitual neste tipo de programas, na mesa estiveram números, leis de países considerados mais avançados, estudos de psicologia que mostram que a presença masculino/feminino é fundamental, outros estudos, o contrário. Também no fogo cruzado esteve a mãe ONU, e a mãe do IAC, Manuela Eanes, várias vezes invocada como defensora da lei e com carta enviada (por não poder estar ali ontem). E os argumentos pró e contra a mãe natureza. Ela sim, mas ela não. A natureza é também, defenderam alguns, quando um homem quer. 'Um dia' o laboratório fará o que hoje ainda não se faz, não foi assim que a ciência foi avançando? Não sei é como de um envelope vazio (não é avó?) se retiram 20 euros. Do nada, nada sai.

Também houve ontem gritaria, aplausos, testemunhos. O tema é fracturante, o que ficou mais patente. Muitas perguntas não foram respondidas. A que me ficou foi esta, e veio de um Marinho Pinto que eu desconhecia: 'uma criança tem direito a um pai e a uma mãe?'

Um dia farão espermatozoides em laboratório, dir-me-ão. Preciso de saber como é que se poderá vir a fazer, a partir de que material biológico. Também quando se discutiu a clonagem me explicaram que qualquer célula serviria, que poderia, por exemplo, ser retirada de uma perna. O que quer dizer que tenho, neste caso, como 'pai', uma perna. Aqui ironizo, obvio. Ser pai é muito mais que ser o pai biológico, o que vale para a mãe, e não só para a clonagem, mas para o assunto de hoje. Mas em que ficamos do que ontem foi repetido: que a criança tem direito a um equilíbrio afetivo; que muitos casais não o dão, outros sim; que muitas instituições não o dão, outras dão. Que o que preferem os filhos de uns, não preferem os de outros: uns acham que é uma estupidez a criança viver com dois pais e com duas mães; outros filhos acham que pode ser, que é melhor uma criança, que 'perdeu' os pais, viver com alguém que lhe dê amor, do que viver numa instituição sem rosto humano. O que me leva ao ponto: as leis servem para quê?

Fartos de saber a sociedade em que vivemos: casais, instituições, política, que deixam muito a desejar. Não são o ideal, não promovem o bem comum, que não o é se não for o bem de cada pessoa. Não se fazem leis em cima do joelho. E se me provarem que um criança tem direito a viver com um pai e uma mãe, então esta lei, agora e ainda em fase de discussão, será injusta.

O Estado tem que se mexer. A política não devia ser a atividade mais nobre? Digo o que penso: uma criança precisa de um pai e de uma mãe. E não é só a criança, mas o adulto que sou também. Parece mais razoável que assim seja, não para convencer ninguém mas é o que se passa comigo, e desconfio que qualquer criança prefere ser agarrada por pai e mãe. 'Há isso é o ideal', dizem-me. 'Pois é', digo. E acrescento: 'mas não é disso que estamos a falar?'.  Ou deve o Estado por baixa a fasquia? Pôr-se de cócoras e 'avançar' para uma lei injusta? O Estado, as leis (agora falo como a MINHA avó....que já morreu mais sei quem é...) deviam era acabar com as corrupções, não é só futebol, é tratar de quem precisa. 'No meu tempo ainda hei-de ver muita coisinha que nunca pensei vir a ver'. Agora eu: para onde vamos? Vamos, sim, tratar destas crianças. Há muitos que já o fazem no terreno e não apenas em nome dos direitos dos homossexuais - a quem não quero tirar nada. Vamos fazer leis que sustentem? Leis que dêem aos "nossos" filhos o que realmente precisam: não só afeto. Não só roupa, saúde, educação. Mas sim a família. Deixemo-nos de leizinhas, de poderes e de corrupções que só nos diminuem a humanidade. Nasci para ser feliz: não porque o mereça, mas porque me encontrei a querer sê-lo. E quero o meu pai e a minha mãe, que Deus tem. 'Um espermatozoide não é um pai'. " E não há pai para ele...