9 maio 2009 9:00
Aquele que é considerado o melhor ciclista português de todos os tempos, morreu há 25 anos após uma queda fatal, num acidente provocado por um cão.
9 maio 2009 9:00
O melhor amigo do Homem foi o arqui-inimigo letal do super-herói do ciclismo português, Joaquim Agostinho, provocando a enésima mas fatal queda ao "Quim Cambalhotas", faz amanhã (10 de Maio) 25 anos, em Quarteira,
A poucos minutos das 11 horas de 30 de Abril de 1984, dois cães surpreenderam Agostinho e o resto do pelotão que lançava os "sprinters" na Avenida Infante de Sagres, a 300 metros da meta da quinta etapa da 10 Volta ao Algarve.
Com a camisola amarela, conquistada no "crono" da véspera, o corredor natural de Brejenjas, Torres Vedras, não evitou um dos animais e o grave acidente.
Alves Barbosa, vencedor da Volta a Portugal em 1951, 1956 e 1958 e recordista de triunfos em etapas da prova (34), classificou os cães como "o maior perigo" para os corredores, que ficam "tensos e preocupados em evitá-los", ao contrário de outro tipo de quedas em que "o corpo é protegido por reflexos instintivos - por exemplo, os braços cobrem a cabeça".
"Ao tentar não bater nos cães, os ciclistas perdem milésimos de segundo preciosos para o corpo se enrolar. Naquele caso, a cabeça foi como um mangual (arma medieval, com esfera metálica pontiaguda, presa por uma corrente a um cabo) e bateu com todo o peso no alcatrão", descreveu à Agência Lusa o antigo seleccionador nacional.

Joaquim Agostinho e Fernando Mendes (à direita), um dos seus maiores adversários, durante a Volta a Portugal em Bicicleta de 1972
arquivo gesco
O presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, Artur Lopes, médico de profissão e então seccionista do Sporting, destacou a série de acasos e o triste fim do "melhor corredor português de todos os tempos", além dos "dramáticos" 10 dias em estado de coma.
"Primeiro, foi a teimosia dele, a dizer que não era nada. Depois, a falta de condições nos hospitais da região e a longa viagem para Lisboa. Aqueles dias no hospital foram dramáticos, com toda a espécie de padres e bruxos a tentar uma visita para o curarem", contou Lopes.
Após a queda, Agostinho cruzou a linha de meta, amparado por dois colegas, e insistiu em retirar-se para a pensão da equipa. Só mais tarde acedeu a uma ida ao hospital de Loulé, mas a indisponibilidade da máquina de radiografias levou a comitiva a Faro, onde chegou por volta das 13 horas.
Identificada a fractura, com afundamento, do osso parietal direito, não havia serviço de neurocirurgia e, analisadas as opções, a viagem para Lisboa foi feita de ambulância porque a burocracia necessária retardaria o helicóptero.
Na capital, foi o próprio Artur Lopes, depois de saber quem estava de serviço no Hospital de Santa Maria, quem convocou o especialista João Lobo Antunes e alertou o Hospital da CUF para a urgência de uma operação para debelar o coágulo no cérebro do corredor, "do tamanho de um limão", mas Agostinho não recuperou.
"Naquele dia, Portugal não mereceu um atleta daqueles", continuou Alves Barbosa, referindo-se à falta de condições de assistência a "um homem que fez o que ninguém tinha feito e que mais ninguém fez", graças a "um físico nascido da Terra".
Manuel Graça, antigo treinador do Sporting, também classificou a queda como "muito estranha porque foi para trás, dado o grande porte do cão", num dia em que se lembra de ter visto muitos daqueles animais de estimação entre o público.

Funeral de Joaquim Agostinho
arquivo gesco
"Se houvesse uma intervenção de imediato, se calhar, nada disto tinha acontecido, mas não sabemos", questionou Artur Lopes, lembrando a notícia da morte do atleta que compara em popularidade a "Eusébio, Amália ou, agora, Cristiano Ronaldo", recebida às 9:37 horas de 10 de Maio de 1984.
O funeral, entre a Basílica da Estrela, onde o corpo esteve em câmara-ardente, e o cemitério da Silveira (Torres Vedras), contou com milhares de pessoas ao longo do percurso, que incluiu uma volta de honra no antigo Estádio José de Alvalade, expressando a consternação pela morte e as circunstâncias que a envolveram.
"Teve mais gente que a Sra. D. Amália. Já tinha chegado a Torres e a fila de carros ainda estava na Calçada de Carriche", lembrou Manuel Graça, citando a fadista, que descrevera Agostinho da seguinte forma: "tinha a cara que eu gosto que as pessoas tenham".