Moçambique

São outras as prioridades

25 abril 2008 1:00

Paola Rolleta, correspondente em Maputo

25 abril 2008 1:00

Paola Rolleta, correspondente em Maputo

Moçambique assinou o Acordo Ortográfico de Língua Portuguesa desde 1990, mas não assume nenhuma data para a ratificação do documento.

São outras as prioridades e com tão urgentes e grandes desafios pela frente, como a luta contra a pobreza e contra a SIDA, a Educação para Todos até 2015 e a introdução do ensino bilingue nas zonas rurais à escala nacional, o Acordo pode desviar atenções e recursos humanos e financeiros que nos são preciosos naqueles combates, disse ao EXPRESSO a professora de português Fátima Ribeiro.

Se a nível oficial, o Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, disse que "Moçambique está a analisar o acordo ortográfico e irá assiná-lo", a nível oficioso são muitos os problemas levantados, como afirmou ao Expresso, Lourenço do Rosário, reitor da Universidade privada "A Politécnica" e presidente do Fundo Bibliográfico da Língua Portuguesa.

"O Governo moçambicano está a seguir um caminho de prudência, porque até agora ninguém enfrentou o Acordo do ponto de vista da planificação. Não faz sentido pôr pressão sem se discutir o impacto financeiro e económico que o Acordo acarreta. É imperioso saber quem é que vai pagar factura disso. Não faz sentido essa pressão toda sobre nós, sem sabermos antes quem vai pagar, estando nós em evidente desigualdade de circunstâncias", declarou.

O reitor afirmou ainda que "não há uma posição oficial por parte do Governo e não se pode pretender uma tomada de decisão só por pressão exterior. Antes, é preciso que as autoridades de educação locais e os meios académicos moçambicanos tomem posição e produzam a documentação a levar à Assembleia da República. Até agora isso não foi feito. É preciso analisar o impacto que o Acordo vai ter para Moçambique a nível de toda a problemática da educação."

Fátima Ribeiro considera o Acordo Ortográfico, nas actuais circunstâncias de Moçambique, extremamente problemático. "Sendo tão débil a formação da esmagadora maioria dos professores e outros profissionais, e não tendo nós grandes possibilidades de alterar a situação nos próximos anos, o Acordo poderá tornar-se uma agravante na qualidade do português escrito".

Moçambique quer mais tempo, como deixa a entender também o professor de Sociologia da Educação e Educação Comparada, Mouzinho Mário: "presumo que os 'estrategas' do Acordo Ortográfico tenham pensado exclusivamente nas vantagens competitivas que os dois países mais industrializados (Portugal e Brasil) deste grupo poderão usufruir em termos de produção e distribuição de livros, materiais impressos e informáticos. Mas não se terão preocupado com a problemática da educação e da formação da identidade politica e cultural dos restantes povos que, por razões históricas, estão 'condenados' a partilhar a mesma língua".

E, já agora, conclui Fátima Ribeiro, que fazer, por exemplo, em palavras como Ribáuè, Marínguè, Chókwè e outros topónimos do género, assim escritas há décadas, desafiando as regras de acentuação do português? Este aspecto, entre outros que nos são específicos, não está contemplado no Acordo.