23 setembro 2006 0:01
Não é preciso invocar o Empire State Building para se perceber que as torres previstas para Lisboa ficam muito abaixo do que se vai fazendo pelo mundo, mesmo na mais comedida Europa.
23 setembro 2006 0:01
Na cidade das sete colinas, os miradouros ainda proporcionam as melhores vistas. A concorrência, porém, está a chegar: vêm aí as torres altas para Lisboa, mas modestas para os padrões europeus e os seus terraços trarão novos panoramas.
O hotel Sheraton, no alto dos seus 100 metros, orgulhava-se de ostentar o título de edifício mais alto de Lisboa. Com a abertura da Expo-98, perdeu a designação para a Torre Vasco da Gama, com mais de 140 metros até ao topo. Encerrada desde Outubro de 2004, um dos «ex-líbris» da Exposição Mundial de Lisboa tem um novo destino traçado. Em Junho deste ano, a Câmara Municipal de Lisboa (CML) aprovou a construção de um hotel de 21 andares acoplado à estrutura da torre. Da autoria do arquitecto Nuno Leónidas, o plano prima pelo arrojo, mas se comparado com os três novos edifícios que vão nascer na capital, é tímido em altura. Os projectos, todos em processos de aprovação, rondam os 100 metros e posicionam-se no segmento de luxo. A Gabriela Seara, vereadora do Urbanismo da CML, e engenheira de formação, interessa-lhe sobretudo que renovem a cidade. Não faz sentido compactar o solo com edifícios baixos, diz.
Com torres de 30 pisos, Lisboa dá ares de modernidade, mas continuará fora do «ranking» das 25 cidades europeias com edifícios mais altos. A metros de distância de Moscovo (a primeira da lista) e do seu Triumph-Palace, de 264 metros.
José Paulo Fernandes, promotor do projecto do arquitecto Norman Foster para o Aterro da Boavista, reconhece que o seu edifício não tem as medidas internacionais. No «skyline» português, somos uma torre. Lá fora, não.
Qualquer que seja o termo certo, com o parecer favorável da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR), o edifício está mais perto de se tornar no primeiro projecto a ir tão longe em altura, como assume a vereadora. A ousadia serve de mote a uma discussão pública, agendada para Novembro. E que coincide com a vinda de Norman Foster a Lisboa, pela quarta vez. Fizemos sempre questão de mostrar os planos publicamente, reconhece José Paulo Fernandes.
A parceria com o arquitecto britânico nasceu de um encontro casual em 2003, em Serralves. O tempo encarregou-se de afinar o projecto. Na actual proposta, a torre ganhou o estatuto de ícone, assegura o promotor.
Concluída a discussão pública, o processo é submetido à aprovação da Assembleia Municipal. Como o Plano Director Municipal de Lisboa só permite a construção de edifícios até 25 metros (oito andares), um Plano de Pormenor que altere essa cércea tem ser submetido a ratificação do Conselho de Ministros.
Com tudo acertado, a promotora arranca com a obra em menos de 6 meses. Dentro de dois anos, a torre esguia (e todo o quarteirão) estará de pé.
Não é preciso esperar pelo período de debate público para ouvir vozes contra a construção em altura. Entre os arquitectos, Gonçalo Ribeiro Telles, revela-se o mais desanimado. O toque de modernidade não o convence. Apenas escondem a falta de política de desenvolvimento urbanístico, acusa.
Mário Sua Kay, o arquitecto escolhido para o lugar de Siza Vieira no Alcântara XXI (para o qual estavam previstas três torres de 105 metros) não vê razões para não se erguerem arranha-céus. Com o 11 de Setembro, julgou-se que ia ser o fim das torres. Puro engano, assegura Sua Kay, a quem lhe falta realizar um sonho: construir um edifício de 40 pisos numa planície alentejana. Ia parecer que estávamos a flutuar num balão.
No centro de Lisboa, para o quarteirão da Av. Fontes Pereira de Melo, o arquitecto Ricardo Bofill, autor do Atrium Saldanha, ali ao lado, projectou uma torre de 105 metros. Provisoriamente, leva o nome de Compave, pelo facto do terreno ter sido adquirido, em 1989, à empresa do banco BPA. Quando concluída, deverá optar por Torre da Cidade.
No 11.º andar do Atrium Saldanha, Armando Martins fixa o olhar na maquete. A espera desespera-o. Fazer a obra é fácil. Difícil é ter a autorização, lamenta-se o promotor, inconformado por viver num país pequeno.
Para a torre Compave, estão a ser elaborados os termos de referência do Plano de Pormenor. A proposta será discutida em Outubro, segundo a vereadora. Armando Martins poderá, então passar à acção. E nem a apreensão manifestada pelo vizinho José Alberto Ribeiro, director da contígua Casa-Museu Anastásio Gonçalves, inconformado com o impacto daquele imóvel, o vai atrasar.
Envolto em segredo está o edifício da autoria de Manuel Salgado, no Parque das Nações. A torre Turifenus resulta de um acordo entre a CML e o proprietário do terreno, assumido em 1996, quando foi necessário alargar a Av. de Berlim para se chegar ao recinto da Expo-98. Desde então, esta solução é a que permite libertar mais terreno e, sobretudo, não obstruir as vistas sobre a Gare do Oriente, assume o arquitecto. O facto de vir a ser edificada próximo dos gigantes S. Gabriel e S. Rafael, acima dos 100 metros, obriga a vereadora a seguir o projecto de perto. Para a torre a meio não parecer um galheteiro, diz. Por estar em afinação, Manuel Salgado optou por não ceder imagens. Da CML veio a informação de que há três anos era neste ponto que estava o aterro da Boavista.
SEGURANÇA REFORÇADA Com mais de 28 metros, todos os edifícios são obrigados por lei a dispor de infra-estruturas para se defenderem de um sismo ou incêndio. A medida não dá folga ao coronel António Antunes, comandante do Regimento de Sapadores Bombeiros de Lisboa (RGS) já que é fundamental os planos de emergência serem exequíveis. Quando está previsto erguerem-se edifícios com 100 metros, mais de 30 pisos, só o rigor atenua o risco. Restaurantes de luxo no último andar, e a funcionar com exaustores (onde se acumulam gorduras), ou piscinas com vista panorâmica sobre a cidade, podem dar dores de cabeça a quem salva vidas como profissão. Sabe lá as conversas que tenho com ateliês de arquitectos de gabarito a insistirem para mudarmos o ponto de vista, revela. O comandante do RSB é que não vai em conversas. Com auto-escadas que só chegam aos 43 metros, ou no limite a 50 não verticalmente, já que funcionam com uma ligeira inclinação o combate às chamas em edifícios dessa dimensão só pode ser feito na cara do fogo (dentro do edifício e frente às chamas). O trânsito e o estacionamento são uma fonte de preocupação quando é preciso chegar depressa, mas as acessibilidades dentro de um prédio fazem toda a diferença. Apesar dos bombeiros serem ouvidos na fase de apreciação técnica, com o projecto ainda em papel, e fazer pré-vistorias à obra, é na manutenção que há falhas. As torres são equipamentos especiais que deviam ter uma vistoria criteriosa, acrescenta o chefe Lourenço Nunes. Uma vez por ano, ou até semestralmente. Os custos elevados tendem a protelar o dever. Só o Serviço Nacional dos Bombeiros e Protecção Civil tem o poder para alterar a situação. Nestes casos, devia ter uma acção mais coerciva, reconhece António Antunes. Apesar do discurso apreensivo, o chefe Lourenço Nunes dá como bom exemplo o comportamento dos proprietários e arrendatários das Twin Towers, em Lisboa. Um dos edifícios mais altos da capital, tem tido uma conduta exemplar no que toca à manutenção. Fazemos vários testes, assegura o Lourenço Nunes, preocupado com os novos desafios dos bombeiros. |