4 outubro 2007 23:00
Diz que voltou para ajudar o PSD a refundar-se e a criar novos heróis. Não antevê facilidades para Menezes em 99. É Ângelo Correia, em entrevista ao Expresso.
4 outubro 2007 23:00
Doze anos depois de deixar a política, o que é que o fez voltar? A revolta pela forma eticamente reprovável e politicamente insustentável como os chamados notáveis do PSD preparavam a morte em "banho Maria", do dr. Marques Mendes, para depois renascerem. Não gostei disso, que violava a vontade popular. Mas tive uma segunda razão: há 20 anos que o PSD parou de pensar e eu estou aqui para ajudar a refundar o partido. Disse-o quando apoiei Durão Barroso, mas ele não tinha capacidade nem desejo, de o fazer. Menezes tem que ser o grande promotor da refundação.
Há quem veja mais nesta liderança o regresso ao santanismo. O santanismo não existiu, é uma espuma, uma exibição mediática, uma ideia sem substância. Um dia, quando Santana Lopes era secretário de Estado da Cultura, eu disse-lhe uma coisa muito simples: tu serás líder, mas terás que olhar para Ronald Reagan, que só é um grande líder porque tem uma grande equipa. Pedro nunca a fez.
Então Santana não pode ser líder parlamentar? Quem dirige e comanda é o dr. Menezes, eu sou apenas um discreto oficial do Estado Maior. Proponho-lhe duas opções: um líder parlamentar que lute com intensidade e calor e aí pode ser Santana. Ou um líder com um carácter de unificação e que protagonize o Grupo Parlamentar como emblema do que tem que se replicar em todo o partido, e aí seria Mota Amaral.
Santana ofusca Menezes? Santana ofuscar o líder significaria utilizar o lugar para a seguir derrubar Menezes, coisa que ele não irá fazer, porque já percebeu as suas debilidades.
E o dr. Menezes, tem equipa? Tem e vai apresentá-la. No Congresso aparecerá uma equipa política, mas haverá uma equipa técnica preparada.
Um Governo sombra? Mais do que um Governo sombra - um Governo e enormes equipas técnicas preparadas para que, daqui a três, quatro meses, tenhamos em todas as áreas da governação pessoas avalizadas para prepararem o nosso programa de Governo e também o contraponto a tudo o que o Governo do PS faça.
Está a ser fácil mobilizar pessoas? E de que maneira! A começar pelos que lá estavam. Vamos ter surpresas quando virmos na Comissão Política do dr. Menezes pessoas que apoiaram o dr. Mendes. Será o primeiro sinal da abertura e da unidade.
Também vão convidar os que já sabem que não aceitam? Os convites serão feitos, e um dia a história dirá que, num momento decisivo, não quiseram participar.
Que PSD vai resultar desta refundação? Não sei, mas vai ter que pensar duas coisas: a social-democracia e o providencialismo.
Mas isso até o PS tem vindo a repensar. Estão dispostos a assumir uma deriva mais liberal? Estamos dispostos a precisar e isso exige uma grande reflexão. A primeira prioridade que qualquer Governo tem que ter nos próximos tempos é a economia. Nas políticas sociais temos que ter um mínimo ético.
Defende um Estado mínimo? Não, um Estado mínimo é um Estado indigente e o Estado Social é um património da Europa. Temos é que fazer duas coisas que José Sócrates não está a fazer: dinamizar a economia e o investimento público e privado. E levar a sério a reforma das despesas públicas.
Despedindo funcionários? Isso tem que ser feito. É preciso assumir a redução dos funcionários e dizer às câmaras que não podem ter empresas falidas.
Parece que Gaia não é um bom exemplo. As pessoas só leram metade do livro. A realidade são onze milhões acima da dívida permitida, com 13 milhões que o Estado lhe deve e não paga. Agora, a primeira coisa que eu estou à espera que aconteça - tão certo como eu me chamar Ângelo - é o IGGAT inspeccionar Gaia.
Menezes começou por acusar o PS de estar a meter a social-democracia na gaveta. Agora, vai defender o corte drástico dos funcionários públicos? Para suportar os encargos sociais, o Estado vai ter que reafectar os seus recursos. E Luís Filipe Menezes vai ter que dizer como é que o faz e com que dinheiro o paga. E vai fazê-lo.
E vai ganhar as eleições? Não sei, depende de duas coisas: dele e das fraquezas de Sócrates. Fundamental é ter um programa e uma equipa credíveis e mostrar antes das eleições com quem se vai governar.
Menezes ter ganho contra os barões não o fragiliza? Hoje em dia não há barões no PSD.
E isso é bom? É péssimo. Os barões são fundamentais, mas foram destruídos durante o cavaquismo. Menezes quer recriar as referências do partido mas temos que criar outros heróis.
Ferreira Leite foi decisiva na vitória de Menezes? Não, mesmo que ela tivesse dito, dois dias antes, que ía votar Mendes, já era indiferente.
Para Pacheco Pereira, a vitória de Menezes deixa o PSD de pernas para o ar. Não quero ouvir nada do que Pacheco Pereira diz. O que ele queria era ser expulso para ser mártir, mas não faremos isso.
Isaltino Morais e Valentim Loureiro devem voltar ao PSD? Devem estar como estão.
E há notáveis a merecer uma travessia do deserto ? A travessia do deserto pode ser feita de camelo ou de jipe.
Comecemos pelo professor Marcelo.. Marcelo no deserto acabava. Ele só vive na exposição pública permanente. A suprema punição era mandá-lo para monge da Cartucha. Mas atenção: a renovação não é a perda dos melhores. Marcelo pode ser um grande presidente do Congresso.
E não pode ser um grande candidato presidencial? Não sei como é que os portugueses o olham.
Menezes apoiará a reeleição de Cavaco Silva? Não tenho dúvidas.
O que é que é vital para Menezes? Ganhar em 2009 ou apenas retirar a maioria absoluta a Sócrates? O cenário DE 2009 não é favorável. Menezes vai enfrentar a mais fantástica máquina de propaganda que eu vi em Portugal nos últimos tempos.
Ou seja, retirar-lhe a maioria absoluta será a meta? A meta é a vitória, mas se se registar o pior cenário possível, que é Sócrates ganhar sem maioria, será o PS a derrubá-lo em menos de dois anos. Iremos para eleições antecipadas.
Diga uma área em que o PSD irá fazer forte oposição ao Governo? Na Justiça. Nâo gosto do pacto que aí está e não se admirem que o PSD se oponha a algumas restrições que estão a querer impôr aos magistrados.
O que é que Menezes precisa de limar? Ele vai ter que pronunciar-se menos vezes sobre tudo. Vai ter que meditar profundamente e só emitir opinião quando tiver certezas.
E a relação com Cavaco vai ser fácil? Vai. Pela natureza dos dois - nenhum deles fala muito.
Versão integral da entrevista publicada na edição do Expresso de 5 de Outubro de 2007, 1.º Caderno, página 3.