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Estado não paga a funcionários em campanha eleitoral

3 junho 2009 9:20

Filipe Santos Costa

Filipe Santos Costa

Jornalista da secção Política

Lei dita regras diferentes para trabalhadores do Estado e do privado que são candidatos às eleições. PS quer corrigir o erro.

3 junho 2009 9:20

Filipe Santos Costa

Filipe Santos Costa

Jornalista da secção Política

A lei eleitoral diz que, durante o período de campanha eleitoral, os candidatos estão dispensados das suas funções profissionais, mantendo todos os direitos, incluindo o ordenado na íntegra. Mas essa lei é contrariada por outra, aprovada no ano passado e em vigor desde 1 de Janeiro, segundo a qual essa regra não se aplica aos trabalhadores do Estado. Ou seja: os empresários cujos empregados sejam candidatos às eleições têm de lhes pagar a retribuição, mesmo nos dias em que estes estão em campanha, mas o Estado não tem essa obrigação em relação aos seus trabalhadores, que são prejudicados. No caso dos funcionários públicos, só recebem o ordenado correspondente a um terço do período de campanha.

É mais uma história de leis que contrariam outras leis, e neste caso o problema foi detectado por um deputado do PS. Luís Pita Ameixa chamou a atenção do seu grupo parlamentar para a necessidade de alterar a lei, sob pena de haver um tratamento discriminatório dos funcionários do Estado, e de se estar perante um potencial imbróglio jurídico.

O Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, publicado em Setembro passado e em vigor desde o início deste ano, contraria a lei eleitoral autárquica, que confere aos patrões privados obrigações de que o Estado se isenta. De acordo com a nova lei, as faltas dadas durante a campanha eleitoral (11 dias) pelos candidatos que sejam funcionários públicos são justificadas, mas só conferem direito à remuneração relativa a um terço do período dessa campanha (três dias e meio). Mais: esses funcionários têm de avisar que vão faltar com 48 horas de antecedência.

Diferente é o que se passa no sector privado. O Código de Trabalho, aprovado este ano, remete para a lei eleitoral, mas assegura que as faltas dadas por um candidato, durante a campanha, são justificadas e não afectam os direitos do trabalhador. E a lei eleitoral autárquica, na sua redacção de 2005, não podia ser mais clara: durante os 11 dias de período oficial de campanha, há dispensa de funções com retribuição na totalidade.

Para Luís Pita Ameixa, a conclusão é óbvia: "O Regime do Trabalho em Funções Públicas restringe gravosamente" o direito dos funcionários públicos a fazer campanha para os cargos a que são candidatos, o que cria uma dupla situação de desigualdade - entre os trabalhadores (com prejuízo para os do Estado) e entre os patrões ("Faz vigorar um regime, em suporte de custos empresariais, mais pesado para o sector privado do que para o sector público").

A lei eleitoral é uma lei orgânica, o que significa que tem peso reforçado e não pode ser revogada por uma lei ordinária. Ou seja, se um funcionário público se queixar desta situação aos tribunais, "certamente que os tribunais hão-de vir a entender, sem margem para dúvidas, pela inconstitucionalidade da disposição limitativa aplicável aos funcionários públicos", diz o deputado socialista, no que é secundado pelo líder parlamentar do PS, Alberto Martins.

"O que está legislado, além de ser inconstitucional, é repugnante no plano dos princípios democráticos, e gravoso e desamigável para o processo democrático. Vai, ainda, gerar, entre milhares de candidatos e milhares de empresas e serviços públicos, por todo o país, grande confusão e divergência", avisa Luís Pita Ameixa.

Assumido o problema, os socialistas querem evitar que esta questão se transforme num problema jurídico. Assim, Alberto Martins confirma que o PS está disposto a mudar a lei aprovada no ano passado, e já informou a sua bancada de que vai iniciar contactos com os outros partidos para avançar com essa alteração, que só será feita com unanimidade no Parlamento.

Texto publicado na edição do Expresso de 30 de Maio de 2009