8 setembro 2009 19:00
Phillip Garrido e a mulher, Nancy, mantiveram Jaycee em cativeiro durante quase duas décadas
O tormento de Jaycee durou 18 anos e só por acaso chegou ao fim. Para sobreviver, ajustou-se a um destino que nunca aceitou.
8 setembro 2009 19:00
Só agora Angel, de 15 anos, e Starlet, de 11, começam a conhecer a verdade sobre o pai, o homem que raptou a mãe delas, quando esta tinha a idade de Starlet, e a manteve em cativeiro durante 18 anos, violando-a repetidamente. Mas a detenção de Phillip Garrido, na semana passada, veio revelar outros factos e as meninas ficaram a saber que a mulher que pensavam ser sua irmã, Jaycee Lee Dugard, é afinal mãe delas.
O segredo foi mantido durante quase duas décadas, tempo durante o qual Jaycee viveu em barracões, no quintal da casa de Garrido, em Antioch, Califórnia. Também as filhas de ambos viveram em tendas desde o nascimento. Dezoito anos antes, Dugard esperava pelo autocarro escolar, em South Lake Tahoe, onde morava (a 320 quilómetros de Antioch), quando um automóvel se aproximou e um dos ocupantes a puxou para dentro. O padrasto de Jaycee, Carl Probyn, assistiu a tudo e ainda tentou persegui-los de bicicleta, mas em vão. Jaycee voltou no passado dia 22, agora uma mulher de 29 anos. É precisamente Probyn (sobre quem chegaram a recair suspeitas de ligação ao rapto) o porta-voz da família. Contou esta semana que as filhas de Dugard e Garrido reagiram mal à detenção do pai. "Elas choraram quando ele foi preso. Jaycee teve que explicar que tinha sido sequestrada", disse, numa entrevista à BBC. Probyn referiu ainda que Dugard se sente mal por ter desenvolvido laços afectivos com Garrido. "Jaycee tem sentimentos fortes em relação a este homem. Ela sente realmente que tem quase um casamento", afirmou, numa outra entrevista, à CBS.
Depois de ter consumido drogas durante anos a fio e ter sido condenado por uma violação, Garrido diz ter encontrado Deus. E foi na sequência desse 'encontro' que a polícia o deteve há pouco mais de uma semana. Phillip chamou a atenção das autoridades quando tentava distribuir panfletos religiosos na Universidade de Berkeley, acompanhado das filhas. A mulher de Garrido, Nancy, também foi presa, suspeita de participar no rapto de Jaycee.
Os vizinhos dos Garrido contradizem-se. Enquanto uns afirmam que as crianças - que não frequentavam a escola e nunca tinham ido a médico - viviam normalmente e até iam a festas de aniversário, outros relatam situações suspeitas, como festas com homens, durante a noite. Jaycee chegou a trabalhar na tipografia de Phillip, que funcionava no quintal, e embora tivesse acesso ao telefone e contactasse com clientes, nunca denunciou a situação.
Dugard não foi, contudo, a primeira vítima de Garrido. Katie Callaway Hall relatou terça-feira à CNN o drama que viveu há mais de 30 anos, quando aceitou uma boleia. Em 1976, Garrido levou-a para um depósito em Reno, Nevada, onde a violou. A mulher, que tinha 25 anos na altura, afirmou que começou a tremer e a gritar "Oh, meu Deus! É ele!", quando soube que Garrido fora preso pelo rapto de Jaycee. Emocionada, contou como conseguiu fugir, após oito horas de terror. Por estes crimes, Garrido foi condenado a 50 anos de prisão, mas saiu em liberdade depois de cumprir 11.
Esta semana, Phillip e Nancy (que casaram quando ele estava preso pela violação de Hall) declararam-se inocentes no caso Dugard. A polícia já reconheceu que poderia ter resgatado Jaycee em 2006, quando um vizinho alertou para a possibilidade de haver pessoas a viver em tendas no quintal dos Garrido, mas o jardim não foi inspeccionado. As autoridades dizem ainda suspeitar do envolvimento de Phillip na morte de várias prostitutas, na década de 90.
Ocupação Josef Fritzl, 73 anos, era engenheiro electricista. Já reformado, dizia à mulher que trabalhava na cave mas proibia a família de descer à sua oficina, onde passava noites inteiras. Phillip Garrido, 58 anos, era proprietário da tipografia Desejo Divino, onde Jaycee Lee Dugard chegou a trabalhar como secretária. Ao mesmo tempo, desenvolvia um sistema áudio para tentar reproduzir as vozes que dizia ouvir na cabeça.
Família Fritzl defendeu-se durante o julgamento ao dizer que teve uma infância infeliz, que o pai esteve ausente e a mãe o rejeitava. Casou com Rosemarie, em 1956, quando ela tinha 17 anos. Os dois tiveram quatro filhos, além de Elizabeth, que terá sido abusada pelo pai aos 11 anos. Já Garrido conheceu Nancy quando cumpria uma pena de 50 anos por rapto e violação. Os dois casaram na prisão e foram viver juntos assim que Garrido saiu em liberdade condicional, 11 anos depois de ter sido julgado. O pai de Phillip, ao jornal "LA Times", admitiu que o filho tem perturbações mentais e um longo histórico de problemas com drogas.
Como justificam acções O austríaco disse, em tribunal, que "tinha de criar um espaço seguro para proteger a filha, Elisabeth, do mundo exterior". No dia a seguir a ser detido, reconheceu os factos e confessou ter incinerado o corpo de um dos bebés que nasceram da relação incestuosa. Numa curta entrevista, Garrido classificou a sua relação com a refém de "terna" e explicou que dormia todas as noites na mesma cama com a sequestrada e as duas filhas. "Vão descobrir uma história de amor. É melhor esperarem".
Textos publicados na edição do Expresso de 5 de Setembro de 2009