Expresso 50 anos

Breve guia de Portalegre, a crónica de Rui Cardoso Martins

5 março 2023 16:07

Rui Cardoso Martins

A vida é o que a gente faz dela, com o que pode. E a Terra é redonda e nunca acaba. Lá no meio, com o perfil de uma chave, Portalegre

5 março 2023 16:07

Rui Cardoso Martins

Sou de uma cidade antiga. Esta verdade precisa de outras: sou de uma cidade velha [também o começo a ser, nasci cinco anos antes do Expresso], desertificada, decadente. Enfim, interessante. Creio que tudo isto é o que a pode salvar.

Dei voltas à cabeça e lembrei-me de uma gravura pregada na parede da sala dos meus pais, em Portalegre. Não se percebe nada a um metro, só um borrão de tinta preta com cavalinhos, carroças e fumos. Mais perto, no entanto, é um quadro de guerra e, pelas legendas em castelhano antigo, vemos que é a celebração do 8 de Junho de 1704, quando os espanhóis, com o rei deles lá na frente, de penacho e rocim de patas no ar, cercaram e conquistaram a cidade. Falamos muito de 1640, mas a Restauração foi bem mais demorada e sangrenta. À lupa, vê-se um friso de homenzinhos pendurados pelo pescoço numa arrepiante forca. Soldados vigiam, de fuzil apontado para quem os tentar vir salvar, vindo de fora do cadafalso. São, na legenda, “algunos de los Enemigos ajusticiados por atrocidades cometidas”. Portanto, os atrozes desta guerra seriam os patriotas portalegrenses, os tetravós alentejanos que lutavam pela independência contra os invasores. Como é fácil ver tudo de pernas para o ar nas guerras, esta lição é eterna.