O construtor civil da Amadora José Guilherme, também chamado 'Zé Grande' (dada a sua altura), ou 'Zé Construtor' (fez a Amadora e uma parte de Luanda) tornou-se mais conhecido por ser o homem que deu uma prenda de 14 milhões de euros a Ricardo Salgado.
Tem um apartamento na Amadora, onde vive desde sempre, na Avenida Elias Garcia. No Alentejo, é dono de uma herdade na Amareleja, de 2700 hectares, chamada de Arrochais.
Em dezembro de 2001, Luís Montez, genro do ex-Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, ficou ali ferido num acidente de caça, tendo sido atingido por chumbos de um tiro perdido. Quem não ficou muito chateado com os chumbos perdidos foram os dois bombeiros que socorreram o marido de Patrícia Cavaco Silva. "Quando chegámos ao centro de saúde de Moura, estava lá muita gente de volta dele, incluindo o sogro. Fomos em comitiva até Beja, até parecia um casamento com tantos carros atrás de nós", contou em julho de 2015 ao Expresso Hugo Dias, motorista da ambulância. Já junto ao hospital, José Guilherme demonstrou porque é 'grande' a dar prendas e gorjetas. "Deu-nos 250 euros em notas e disse-nos para irmos almoçar. Foi o que fizemos." Luís Montez explicou na altura que foi para o Hospital de Beja "apenas por precaução" e confirmou gostar de caçar "uma ou duas vezes por ano".
Os convidados VIP nos Arrochais
Entre os convidados VIP que eram visita mais ou menos recorrente nos Arrochais encontravam-se pessoas da família Espírito Santo, mas também políticos de todos os quadrantes políticos, como Dias Loureiro, Isaltino Morais ou empresários como Sousa Cintra. "Estive presente em algumas caçadas com o Zé Guilherme. Ele gosta de caçar tal como eu", assumiu também ao Expresso nesse verão de 2015 o ex-presidente do Sporting sem esconder o carinho que sente pelo construtor da Amadora: "O país precisava de ter outros empresários como ele para ir para a frente", disse Sousa Cintra.
"O Zé Guilherme sabia receber em grande. A caça é um pouco como o golfe. Um evento muito restrito em que alguns aproveitam para estabelecer e fortalecer contactos. Era o que se passava nos Arrochais", contou um político que lá ia. Pediu o anonimato, claro.
Ao Expresso, Dias Loureiro confirmou nessa altura que lá foi caçar "uma meia dúzia de vezes" entre 2001 e 2009, já depois de sair do Governo. "O José Guilherme organizava grandes caçadas nos feriados de 1 de novembro. Ia sempre lá muita gente. A quinta era uma boa zona de caça, principalmente de perdizes e lebre".
Na herdade, o construtor produz vinho galardoados, muitos deles exportados para Luanda.
De acordo com o “Jornal de Negócios”, José Guilherme entrou em Angola apadrinhado por Ricardo Salgado. Entre as amizades que foi conquistando contam-se a de Marta dos Santos, irmã do presidente da República angolano, José Eduardo dos Santos. Além da paixão pelo jogo de cartas da sueca e pelo Benfica, conhecem-se-lhe poucas extravagâncias. Gosta de almoçar no Porto de Santa Maria, um restaurante na zona do Guincho, onde há um prato especialmente confeccionado para ele: lagosta suada.
Na Amadora a cortar o cabelo
Os 14 milhões de euros que deu a Ricardo Salgado como presente pelos negócios em Angola, foram uma das razões pelas quais foi chamado à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão do BES e do GES. Em março de 2015 justificou a sua ausência no parlamento por motivos de doença, por ter residência oficial em Angola e por estar nessa altura a tratar de negócios naquele país. Mas entre 4 e 7 de março de 2015, o empresário da construção civil da Amadora esteve em Portugal.
Na manhã de sábado, dia 7, José Guilherme foi ao barbeiro onde há mais de 40 anos costuma cortar o cabelo.
Aurélio Robalo, o dono da antiga barbearia da Amadora, confirmou-o nessa altura ao Expresso. "Ele esteve aqui às dez da manhã e fez, como sempre, a marcação com antecedência", conta o dono do estabelecimento, que é "amigo de longa data" do homem que construiu grande parte dos bairros da Amadora nos anos 80.
O nome de José Guilherme constava no livro de marcações escrito à mão pelo barbeiro, que não poupa o construtor com elogios: "É uma pessoa cinco estrelas." Como quase sempre, o cliente então com 76 anos deixou gorjeta pelo corte, que custa 12 euros, com lavagem.
A presença do construtor em Portugal, entre 4 e 7 de março, causou polémica entre os deputados. Os partidos queriam ouvir o construtor civil da Amadora sobretudo para perceber a razão pela qual tinha oferecido 14 milhões de euros a Ricardo Salgado. No seu depoimento por escrito José Guilherme não esclareceu a CPI sobre o assunto, escudando-se no segredo de justiça. Dois meses depois a sua ausência da CPI acabou depois por ser desvalorizada pelo Ministério Público, com o argumento de que os deputados já tinham aceitado que o seu depoimento fosse por escrito. Acabou por não ser acusado pelo crime de desobediência.
O que respondeu ‘Zé Grande’ na CPI
O construtor que, alegadamente, pagou 14 milhões de euros a Ricardo Salgado por liberalidades e 1,5 milhões de euros a António Tomás Correia, ex-presidente do Montepio assumiu ter participações em mais de 20 sociedades, interesses em Luanda, de onde respondeu aos deputados.
Foi hábil nas respostas ao dizer que tanto quanto era do seu conhecimento "nenhuma das sociedades" em que participou tinha "créditos a decorrer junto do BES", uma vez que "todas as relações de crédito foram transferidas para o Novo Banco". Assumiu na altura ter sido financiado, em termos pessoais pelo então BES Angola, hoje Banco Económico, referindo que todos os "financiamentos foram regularmente cumpridos".
Também nessa altura, assumiu ter relações comerciais não só com o BES mas também com o BCP e a Caixa Económica Montepio Geral , hoje Banco Montepio.
Em Janeiro de 2016 ficou a saber-se que José Guilherme tinha dívidas ao BES, herdadas pelo Novo Banco e que dos mais de 200 milhões de euros que lhe emprestaram sem garantias, o Novo Banco acabou por lhe perdoar 121 milhões.